Cozinha Caipira (Cozinha Caipira) - José Ferraz de Almeida Júnior
Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo, Brasil
OST - 63x87 - 1895
A composição "Cozinha Caipira", obra do artista brasileiro Almeida Júnior, além de sua
beleza, leva o observador através do tempo, quando no meio rural, num único
cômodo, a família dispunha de quase todos os objetos necessários à vida
doméstica. Hoje, com a velocidade da tecnologia, dificilmente encontraremos uma
cozinha como a mostrada pelo artista.
Vejamos o que contém esta cozinha do final do século XIX,
feita de paredes de pau a pique, em tons terrosos:
1. no canto inferior, à esquerda, encontra-se um forno de
barro, já enegrecido pelo uso, fundamental para assar pães, bolos e biscoitos;
2. um grande tacho redondo de ferro ou cobre, encostado na parede da lateral esquerda, próximo a um banco de tora, traz a boca de frente para o observador, sendo usado normalmente para a confecção de doces, rapaduras, grandes quantidades de alimento, etc;
3. um pilão de madeira, às costas da mulher, peça usada para moer café, descascar arroz, quebrar milho, etc;
4. um imenso fogão de barro, encostado à parede frontal da casa, com chaminé que dirige a fumaça para o lado externo da cozinha. Sobre a trempe é possível observar um caldeirão e outras peças. Das achas, na boca do fogão, vê-se uma labareda;
5. pela porta, que leva ao exterior, uma galinha penetra com os seus pintainhos;
6. do telhado desce um varão, normalmente usado para pendurar milho, carne, casca de frutas, etc.
7. uma única figura humana, humildemente vestida e com a roupa a cobrir-lhe todo o corpo, encontra-se no ambiente, de cócoras, debruçada sobre uma peneira, de onde retira os grãos estragados, colocando-os à sua direita, e à frente vê-se um banquinho de madeira;
8. uma abertura na parede, ao fundo, conduz a outro cômodo, que é provavelmente uma dispensa.
2. um grande tacho redondo de ferro ou cobre, encostado na parede da lateral esquerda, próximo a um banco de tora, traz a boca de frente para o observador, sendo usado normalmente para a confecção de doces, rapaduras, grandes quantidades de alimento, etc;
3. um pilão de madeira, às costas da mulher, peça usada para moer café, descascar arroz, quebrar milho, etc;
4. um imenso fogão de barro, encostado à parede frontal da casa, com chaminé que dirige a fumaça para o lado externo da cozinha. Sobre a trempe é possível observar um caldeirão e outras peças. Das achas, na boca do fogão, vê-se uma labareda;
5. pela porta, que leva ao exterior, uma galinha penetra com os seus pintainhos;
6. do telhado desce um varão, normalmente usado para pendurar milho, carne, casca de frutas, etc.
7. uma única figura humana, humildemente vestida e com a roupa a cobrir-lhe todo o corpo, encontra-se no ambiente, de cócoras, debruçada sobre uma peneira, de onde retira os grãos estragados, colocando-os à sua direita, e à frente vê-se um banquinho de madeira;
8. uma abertura na parede, ao fundo, conduz a outro cômodo, que é provavelmente uma dispensa.
Todo paulista deveria ir, ao menos uma vez na vida, à
Pinacoteca do Estado. Indo à Pinacoteca, deveria estacionar diante do quadro de
Almeida Júnior, "Cozinha Caipira" (1895).
Diante do quadro, vasculhar os componentes da cozinha e
demorar-se na solidão da mulher de cócoras, catando feijão na peneira
-iluminada pela luz estreita que atravessa a porta, a mostrar a posição herdada
dos índios.
Diante da sua solidão, meditar sobre o verso de João
Cabral de Melo Neto: "Catar feijão se limita com escrever".
O quadro de Almeida Júnior expressa uma ideia profunda
sobre o caipira: o abandono na pobreza. Tudo é tosco, caindo aos pedaços (como
as paredes), sem que qualquer elemento tenha grandeza e dignidade.
O forno romano (que hoje chamamos "forno de
pizza"), à esquerda em primeiro plano, tem uma história maravilhosa de
Roma a nossos dias, passando pela Catalunha medieval, de onde se difundiu. Mas
está lá, desmilinguido, incorporado ao quadro como ruína de antiga civilização.
O banquinho indígena, em primeiro plano, à direita, evoca
outra ruína civilizatória, como a perguntar: o que fizemos com os índios?
No segundo plano, à esquerda, um grande pote vazio,
ladeando um pilão talhado em tronco de árvore. Ao fundo, o fogão a lenha, sobre
o qual se vê no fumeiro uns embutidos e um pedaço de toucinho de porco; à
direita do fogão, a porta que tem por sentinela uma galinha e o seu minúsculo
pintinho. E, ao fundo, no quintal, um verde milharal.
Milho, galinha, toucinho, feijão catado -coisas que,
combinadas com simplicidade, hoje achamos iguarias, mas que expressam
justamente a pobreza do Jeca que Monteiro Lobato descreveria algumas décadas
depois.
Da representação da pobreza em "Cozinha
Caipira" à materialização do requinte de hoje, a culinária parece ser esse
terreno onde deslizamos do presente ao passado sem tropeçar no fato de que
encarna uma história que preferimos apagada pelo tempo.
Relações sociais dramáticas, de uma civilização de
frangalhos, plasmadas hoje como coisas saborosas.
Massacramos os índios e nos vimos como heróis,
bandeirantes. Recobrimos tudo com pizza e molho de tomate; além dos sushis e
quibes, é claro. São Paulo não tem história digna desse nome porque ela é feia,
muito feia.
Sangue e pobreza. Importamos a história culinária dos
imigrantes junto aos sabores que competem com a cozinha caipira. Mas Almeida
Júnior está na Pinacoteca justamente para nos lembrar dessa outra história. A
história de cócoras.
E quando comemos feijão com toucinho ou linguiça, ou
quirerinha de milho com frango ou suã de porco, somos um pouco como os índios
ianomâmi. Seus mortos, feitos em cinzas e misturados a outras coisas, eles
comem em silêncio para que sejam esquecidos e, assim, ultrapassem os umbrais do
Paraíso.
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