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segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Um Pouco da História de Francisco Matarazzo e suas Indústrias, Brasil


Um Pouco da História de Francisco Matarazzo e suas Indústrias, Brasil
Artigo


O conde Francesco Matarazzo é costumeiramente lembrado como um dos maiores empresários da história no Brasil, ao lado de outros empreendedores igualmente importantes no início do século 20. Chega às livrarias agora em novembro uma obra definitiva a respeito do conde que ajusta essa percepção. O livro é Matarazzo, do escritor Ronaldo Costa Couto, editado pela Planeta e composto de dois volumes: Travessia e Colosso Brasileiro (360 páginas cada um. Separados, custam 49,90 reais. Juntos, 90 reais). EXAME teve acesso aos volumes, ponto de partida desta reportagem. O material reunido por Costa Couto autoriza a seguinte conclusão: o conde Francesco Matarazzo não foi apenas um dos maiores empresários da história brasileira. Matarazzo foi o maior empreendedor do país em todos os tempos e ainda um dos nomes de destaque do capitalismo mundial. Matarazzo não ergueu dez, 20 ou 50 fábricas. Foram 200. Isso mesmo: 200 fábricas. Ao lado delas, Matarazzo deixou também hidrelétricas e ferrovias — assim mesmo, no plural –, empresa de navegação, banco, fazendas, milhares de terrenos urbanos e prédios, além de filiais na Argentina, nos Estados Unidos e na Europa. No auge, chegou a empregar 30 000 pessoas. Para efeito de comparação, o Banco do Brasil tinha, na virada do século, 133 funcionários. Atualmente, a Gerdau tem 14 000 empregados. Ao morrer, em 1937, Matarazzo possuía um patrimônio estimado em 20 bilhões de dólares corrigidos aos dias de hoje pela inflação americana. Em terras brasileiras, nenhum capitalista voou tão alto.
Na virada do século 19 para o século 20, o Brasil era assim. Dois terços da população viviam no campo, 65% dos adultos não sabiam ler ou escrever e o produto interno bruto per capita equivalia, em valores de hoje, a pouco mais de 700 reais. Nas cidades, doenças como tifo, sífilis, sarampo e varíola faziam vítimas sem escolher classe social. Em 1900, a esperança de vida ao nascer era de apenas 34 anos. Foi nesse Brasil socialmente adverso que o italiano Francesco Matarazzo desembarcou, em 1881, aos 27 anos de idade, em companhia da mulher, Filomena, e de dois filhos pequenos. No bolso — há controvérsias — carregava de 30 000 a 50 000 dólares, em valores de hoje. Um volume até expressivo quando se pensa na imagem clássica do imigrante chegando ao Brasil com uma mão na frente e outra atrás.
Matarazzo começou a vida como mascate e dono de uma venda em Sorocaba, no interior de São Paulo, para onde se dirigiu por indicação de um amigo que ali residia. Passou a negociar farinha de trigo e banha de porco, usada na fritura de alimentos. Em seguida, montou um armazém e uma pequena fábrica na qual resolveu produzir latas para acondicionar a banha a ser comercializada. A embalagem prolongaria a validade de um produto altamente perecível. Foi seu primeiro grande salto. Deixava para trás a função de mero comerciante, transformando-se em industrial. Já em São Paulo, tomou um empréstimo para abrir um moinho. Seguiram-se uma fábrica de óleo de caroço de algodão, uma tecelagem, uma fiação, uma estamparia. Em pouco tempo Matarazzo já integrava o time dos 11 proprietários de fábricas paulistas que operavam com mais de 100 trabalhadores. Interessante é que cada novo centro de abastecimento de matéria-prima resultava em novos produtos comercializados — um movimento de integração vertical e diversificação.
Os dois volumes da biografia são resultado de seis anos de pesquisas conduzidas por Costa Couto, um economista que gosta de política e chegou a ser ministro de José Sarney. Ao sair do governo, empregou-se no Tribunal de Contas do Distrito Federal e passou a investir seu tempo em pesquisa. Fez doutorado em história na Sorbonne e escreveu quatro livros. Para preparar a biografia de Matarazzo, Couto entrevistou mais de 150 pessoas no Brasil e na Itália. Por opção, dedicou-se a escrever sobre o espetacular enriquecimento dos Matarazzo, desprezando as razões que levaram à pulverização do grupo. Para as pessoas que gostam de negócios, o livro consegue responder à questão mais importante de todas, que é sobre o talento e a sorte de Matarazzo. Costa Couto deixa claro que o empresário possuía as principais características de um vencedor e que a sorte foi um empurrão natural na trajetória de quem caminhava na direção certa. Para ter uma idéia do seu grau de excelência comercial, Costa Couto lista na biografia um único fracasso, registrado em 1924. Tratava-se de um projeto de industrialização e comercialização de pele e gordura de jacaré e capivara. A idéia era tão ruim que Matarazzo a descartou antes que provocasse maiores prejuízos.
Matarazzo mudou-se para o Brasil pela mesma razão que levou outros 3,8 mi lhões de estrangeiros a aportar aqui entre 1887 e 1930. A vida em seus países de origem ia muito mal. Os italianos formavam o grupo mais numeroso, seguidos de portugueses e espanhóis. No seu caso específico, Matarazzo foi empurrado pela crise econômica que em 1881 devastava o sul da Itália — o que aviltava o rendimento de suas terras e enfraquecia o comércio legado pelo pai, um médico de Castellabate, que morrera oito anos antes. Francesco, que sonhava com uma carreira militar, abandonara os estudos em Salerno para gerir os negócios da família. De certa forma, eis aí uma primeira explicação para o sucesso que fez no Brasil. Matarazzo já tocava negócios na Itália, tinha um pai com curso superior e havia estudado. Para facilitar, aportou num país onde menos de 2% da população de 17,4 milhões de brasileiros podia ser classificada como escolarizada. A competição direta com o empreendedor local de certa forma o beneficiava. Mas há mais do que isso para explicar seu sucesso. “Circunstâncias históricas favoreceram a formação do império Matarazzo”, diz Costa Couto. “Tudo o que implantava tinha caráter pioneiro, preenchia uma lacuna no mercado.” Se tivesse desembarcado nos Estados Unidos, por exemplo, Matarazzo se confrontaria com um ambiente comercial muito mais competitivo, pois àquela altura os produtos básicos que fabricava já não eram novidade. Teria de ser mais sofisticado e talvez seu capital não fosse suficiente.
O Brasil era um país a ser construído industrialmente. Importava-se de tudo: vidro, máquinas, ferro, cimento, batata, manteiga, toalha, cerveja, tinta, prego, papel. Até foice vinha do exterior. Aço e cimento só começariam a ser fabricados aqui na década de 20. A grande preocupação do governo federal na virada do século era reforçar a exportação agrícola, principalmente de café, açúcar, borracha e cacau, o ganha-pão da elite. Os imigrantes cumpriram um papel fundamental no processo de industrialização, tanto como operários quanto como empresários. Em 1900, nove de cada dez trabalhadores na indústria eram europeus, especificamente italianos. De acordo com dados da Fundação Getulio Vargas, em 1920, 64% das indústrias paulistas eram controladas por imigrantes, quase todos europeus, muitos italianos. Quando estourou a Primeira Guerra, importação e exportação ficaram mais difíceis, bem como a entrada de capital estrangeiro. O país conheceu então uma virada. A pujante elite agrícola, dependente das vendas ao exterior, passou a viver dias mais difíceis. E a nascente indústria nacional deu um salto coletivo. Calcula-se que o PIB industrial tenha crescido quase 10% ao ano durante a guerra.
A história registra grandes casos de sucesso empresarial naquele período, como a família Ermírio de Moraes, dona do grupo Votorantim. Ou as famílias Klabin e Lafer, que começaram em 1899, importando artigos de escritório e tipografia. Quatro anos depois, já produziam papel, segmento no qual até hoje se destacam. Todos se beneficiaram da Primeira Guerra. De acordo com o livro de Costa Couto, Francesco Matarazzo costumava brincar que a guerra não deveria acabar nunca. A diferença entre Matarazzo e esses grupos é que ele foi mais longe (bem mais longe), numa velocidade maior (muito maior).
Outra diferença é que os grupos Votorantim e Klabin continuam por aí, fortes. E o grupo Matarazzo é apenas um registro histórico. A forma como o império se desfez impressiona. Após a morte de Francesco Matarazzo, feito conde por ordem do rei da Itália, seu filho Francisco Matarazzo Júnior, também conde, assumiu o comando dos negócios. Por influência paterna, o conde Chiquinho, como era conhecido, manteve o processo de diversificação dos negócios. Trabalhava segundo a mesma lógica expansionista que tanto sucesso havia feito na gestão de seu pai. Montou uma fábrica de celofane, uma salina, comprou o controle de uma empresa de cimento, abriu uma fábrica de conservas e um banco. O grupo chegou a ter shopping center, supermercado e frigorífico. Acontece que o modelo já não se adequava mais aos novos tempos. No início do século, a expansão fazia todo o sentido, pois Matarazzo era um pioneiro. Mas o cenário mudou. Surgiram grupos empresariais fortes, nacionais e estrangeiros. E as Indústrias Reunidas Francesco Matarazzo (IRFM) passaram a brigar por espaço. Para complicar, a história registra diversos equívocos administrativos que conduziram o grupo ao balanço no vermelho já no final da década de 60. Em 1977, com a morte do conde Chiquinho, o comando do império, já altamente endividado, passou às mãos de sua filha, Maria Pia, que pouco pôde fazer. Os debates sobre crescimento precisaram dar lugar a discussões sobre saneamento e reestruturação financeira. Em 1983, uma dezena de companhias do grupo entrou em concordata. Algumas das empresas ainda existem, mas nenhuma delas tem peso relevante na economia nacional.
Alguns historiadores costumam comparar o peso de Matarazzo na República ao de Irineu Evangelista de Souza, o barão de Mauá, no tempo do Império. Fundador da indústria naval brasileira, Mauá também construiu ferrovias, rede de serviços públicos de iluminação e tornou-se banqueiro. Mas a comparação entre Mauá e Matarazzo deve parar por aí. A obra de Matarazzo está fundada em outro gênero de negócios, centrado na produção de bens rotineiros para os consumidores, em vez de envolver relações com o Estado. Sem saber, é claro, Matarazzo estava construindo o que mais tarde seria conhecida como a economia de mercado. “A imagem do industrial moderno surgiu em São Paulo com Matarazzo”, afirma o pesquisador Jacques Marcovitch, professor da Universidade de São Paulo e autor do livro Pioneiros & Empreendedores.
Matarazzo chegou a ser a quinta maior fortuna do mundo e o italiano mais rico fora da Itália. Seus 20 bilhões de dólares em valores de hoje seriam suficientes para garantir a sexta posição na relação de milionários da revista Forbes. A revista American Heritage contabilizou a riqueza de empresários de todos os tempos e converteu em dólares da atualidade. Concluiu que o homem mais rico de todos os tempos foi John Rockefeller, fundador da Standard Oil, que acumulou 190 bilhões de dólares com petróleo. Rockefeller e Matarazzo morreram no mesmo ano. O segundo homem mais rico de todos os tempos foi Andrew Carnegie, com 101 bilhões auferidos com ferrovias e siderúrgicas. No tempo em que Matarazzo e seus contemporâneos bilionários de todo o mundo viveram, a influência que eles tinham transcendia o campo dos negócios. Apesar de possuir 60 bilhões de dólares, o maior bilionário da atualidade, Bill Gates, não exerce nenhuma influência sobre os rumos da política nem da Califórnia, onde vive. Naquele tempo, era diferente. Para ficar num exemplo, acreditava-se que a fortuna do banqueiro americano John Pierpont Morgan, no início do século, poderia financiar por quatro meses todos os investimentos econômicos dos Estados Unidos. Quando Nova York esteve à beira da falência, em 1907, ele foi convocado para salvar a cidade. Na década de 30, o jornalista Assis Chateaubriand definiu o império do conde como o “Estado Matarazzo”, por se equiparar em receita ao segundo “estado” brasileiro, que por pouco não empatou com São Paulo.
Matarazzo é um daqueles homens que conquistam um lugar na história ainda em vida. Até hoje, décadas depois que seu império saiu do mercado e seus produtos já não freqüentam as prateleiras, o sobrenome sobrevive no imaginário dos mais velhos como sinônimo de riqueza. Mas não é apenas de negócios que tratam os livros de Costa Couto. Há ali pedaço para histórias mais pessoais, digamos assim. De alcova mesmo. O escritor relembra que, em relação às mulheres, Matarazzo tinha a libido acesa. São vários os relatos de aventuras extraconjugais identificados na biografia. “Houve um caso marcante, dizem que com muitas juras de amor e pencas e mais pencas de flores”, registra o biógrafo Couto. “Até de fruto falam. Um menino que ele teria mandado estudar na Itália.” Um capítulo amargo da vida de Matarazzo foi a perda do filho Ermelino, em 1920, num acidente automobilístico em Turim. Era seu braço direito, escolhido como o sucessor. Mandara estudar na Suíça, dos 7 aos 18 anos. Em seguida, foi encaminhado para fazer estágio na França, na Alemanha e na Inglaterra. “Primeiro filho brasileiro, significava a certeza de uma sucessão natural, tranqüila, sem questionamentos familiares”, diz Couto.
Como gestor, embora os resultados financeiros do grupo sejam impressionantes, não se pode dizer que Matarazzo tenha sido inovador. Atuava como os demais empresários de seu tempo. Empregava parentes e apaniguados, com preferência à contratação de italianos do sul, com quem a família mantinha laços e que cultivavam a gratidão. Mais da metade dos funcionários da organização provinha da região. No dia-a-dia, cumpria um ritual próprio de quem mantinha na cabeça a mesma cultura dos tempos da venda do interior, segundo a qual nada avança longe das vistas do dono. Matarazzo costumava dizer que só não chegava mais cedo à empresa porque a legislação não permitia. Era ainda o último a deixar o escritório, à noite. Nas manhãs de domingo, se reunia com diretores e gerentes. Jamais abandonou o hábito de visitar fábricas. Certa vez, numa das incer tas na linha de produção, observou um operário reclamar da falta de uma peça de reposição. Apontou para um armário. Lá estava ela. Gabava-se da memória que, descrita como “prodigiosa”, considerava um trunfo, além da habilidade de fazer contas sem ajuda do lápis. Raramente ditava cartas ou recorria ao telefone. Memorandos internos nas fábricas eram escassos e minimalistas. No escritório, era do tipo que colhia opiniões dos subordinados, mas no final decidia tudo sozinho, de forma centralizadora. As compras de matéria-prima de cada fábrica eram feitas pessoalmente por Matarazzo ou com seu conhecimento de preços e quantidades. Para ele, comprar era até mais importante do que vender pelos melhores preços. O estilo personalista e simples de conduzir os negócios era uma marca comum do emergente capitalismo industrial da virada do século passado. Atualmente, parece incrível, mas essas habilidades naturais e até intuitivas dos grandes pioneiros são estudadas como descobertas de guru. Os desbravadores do capitalismo não tinham modelo algum para seguir, nem consultores. Tocavam o negócio de ouvido. Como qualquer de seus pares, Matarazzo tinha de contar com a própria intuição e se virar para se manter atualizado. Seu posto de escuta predileto era uma confeitaria no centro de São Paulo, onde se reuniam empresários, advogados, funcionários públicos e fazendeiros. Ali ficava a par dos últimos mexericos da política e obtinha informações a respeito de oscilações de moedas. Estudioso dos titãs dos negócios, Richard Tedlow, professor na Harvard Business School, comparou trajetórias e chegou a um denominador comum das principais características de empreendedores, gente como Henry Ford, John Rockefeller, Andrew Carnegie e Sam Walton, entre outros. Ao lado de traços como dedicação radical à empresa, não olhar para trás e fazer mais do que o prometido, eles conseguiram intuir potencial de mercado e tiveram a coragem de apostar na sua visão de empresa. Eis um traço que não faltou a Matarazzo, um homem que foi capaz de apostar seu patrimônio no sonho do crescimento.

quinta-feira, 30 de maio de 2019

Casa das Caldeiras, Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, Barra Funda, São Paulo, Brasil



Casa das Caldeiras, Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, Barra Funda, São Paulo, Brasil
São Paulo - SP
Fotografia


Vamos recordar sobre como a cidade de São Paulo se desenvolveu a partir do ciclo do café, com a chegada dos barões do café, com a construção da estrada de ferro - que levava a produção ao porto de Santos e através da Sorocabana, distribuía produtos vindos da Europa pelo interior do Estado. Este contexto foi essencial para promover seu crescimento e o início da industrialização: recursos financeiros disponíveis na cidade e mão-de-obra preparada e técnica com a imigração italiana.
Com a imigração italiana chegou Francesco Matarazzo em 1881, aos 27 anos. Francesco se estabeleceu em Sorocaba, onde se dedicou ao comércio de banha de porco. Em 1890, muda-se para São Paulo onde cria a Matarazzo e Irmãos na Rua 25 de Março, com seus irmãos Giuseppe, Luigi e Andrea para comercializar banha, trigo da Europa e até mesmo arroz da China. Com os negócios prosperando, constituiu-se a Companhia Matarazzo S.A. com 43 acionistas. Entre 1899-1900, com o financiamento do London Bank (hum mil e quinhentos réis) e com os equipamentos e máquinas da Henri Simon & Co de Manchester, Francesco constrói e monta a sua primeira fábrica, no bairro do Brás, próxima a linha de trem São Paulo Railway - o Moinho Matarazzo.
Com a participação do empresário Francesco Matarazzo alguns bairros se desenvolveram:
O bairro do Brás recebeu a Fiação e Tecelagem Mariangela em 1904 e a Fábrica de óleo Sol Levante em 1907.
Entre 1900 e 1911, Francesco Matarazzo investiu em atividades bancárias/financeiras, para então em 1911 cessá-las para constituir as IRFM (sociedade anônima).
Em 1913 as IRFM se expande para o bairro do Belenzinho com a Tecelagem Belenzinho.
Em 1915, Francesco se firma como líder da colônia italiana ao doar um pavilhão ao Hospital
Humberto I.
O bairro da Moóca recebeu as fábricas de fósforo, o moinho de sal e a refinação de açúcar.
Como o forte do grupo Matarazzo sempre foi a produção de produtos de consumo básicos e essenciais, isto garantiu a sua prosperidade mesmo com a chegada da Primeira Guerra Mundial. Para a Tecelagem a matéria-prima era nacional, e no caso do trigo que vinha da Europa, Matarazzo passou a importar da Argentina. Matarazzo também montou em 1919 a Sociedade Paulista de Navegação Matarazzo Ltda com uma frota de 5 navios entre 6500 e 4500 toneladas e iates de 280 toneladas para conquistar autonomia para distribuir seus produtos pelo país.
Com o crescimento do parque industrial paulista, substituição das importações (consequência da Guerra na Europa), concentração da população urbana e pesadas condições de trabalho, Matarazzo enfrentou movimentos sociais reivindicatórios dos operários que culminaram com a grande greve geral de 1917. E logo depois houve a revolução de 1924, que causou danos às instalações na Moóca com incêndios provocados pelo fogo cruzado.
Em 1917, Francesco Matarazzo recebe do rei da Itália o título de conde.
Os primeiros a ocuparem o bairro foram os italianos, logo após seu loteamento, com serrarias e oficinas mecânicas que atendiam a população do bairro vizinho e de elite, o bairro dos Campos Elísios.
Em 1902, o primeiro bonde elétrico da cidade ligou a Barra Funda ao Largo São Bento.
Em 1918 foi inaugurado o Teatro São Pedro na Barra Funda e em 1921 o Palestra Itália de São Paulo comprou um terreno aonde construiu o Estádio Palestra Itália, que em 1942 passou a se chamar Sociedade Esportiva Palmeiras. A Barra Funda viveu uma época de grandes manifestações culturais na década de 1920, o escritor Mario de Andrade viveu no bairro.
O bairro da Água Branca era inicialmente uma área rural dos arredores da cidade que recebeu este nome por causa de um córrego de águas límpidas. A Água Branca foi mudando e se desenvolvendo com a construção da ferrovia que ligava Jundiaí a Santos (São Paulo Railway em 1892) e com a inauguração da Estação de Trem Barra Funda e da Estrada de Ferro Sorocabana (1875).
A partir de 1920, o ambiente urbano torna-se mais complexo e parcialmente independente da cultura agrária. Surgem movimentos políticos e artísticos novos, afirmando a transformação da sociedade urbana.
O bairro Água Branca se industrializou com a vinda das instalações do primeiro Parque Industrial IRFM (Industrias Reunidas Francisco Matarazzo) em 1920, transformando a paisa- gem rural em um ambiente fabril e operário. O parque industrial trazia consigo a verticaliza- ção da produção, reunindo diversas fábricas. A presença de um ramal ferroviário colado ao terreno foi determinante para a escolha do terreno.
Ainda na Água Branca, criou-se o Parque Dr. Fernando Costa ou Parque Água Branca (1929) para servir de local para exposições e provas zootécnicas.
O ano de 1929 foi um ano de crise, onde muitas indústrias tiveram que fechar. O Bairro da Barra Funda viu a elite se deslocar e seus casarões se transformarem em cortiço. Restou basicamente a indústria artesanal, de pequeno porte.
[Em suas andanças pela Cidade de São Paulo, o Conde Matarazzo descobriu um espaço que lhe pareceu ideal: o terreno onde funcionava uma antiga fabrica de licores da companhia Antártica de Bebidas, compreendendo 101.000 m2, próximo ao córrego Água Branca e ladeado pelos trilhos de duas estradas de ferro: a Sorocabana e a Inglesa...”
... A ocupação foi feita sem demora. Já em 1920 foi transferido o conjunto de São Caetano, constituído pelas fábricas de sabão, velas, estearina, oleína, glicerina e pregos. Logo em seguida transferiu-se a refinação de açúcar da Moóca e a fábrica de óleo de caroço de algodão...
...o advento do núcleo da Água Branca marcou o auge da expansão das IRFM em concentração vertical. Pouco tempo depois, foram instaladas ali a serraria, a caixotaria, a carpintaria, a marcenaria, a fábrica de carrocerias e a sessão de transportes, compondo a infra-estrutura necessária ao funcionamento do conjunto industrial.
Rapidamente, novas unidades foram acrescidas, formando, em pouco mais de dois anos, o que começava a ser chamado popularmente o “Parque Industrial Água Branca”. Nesse mesmo período inicial foram ainda implantadas as fábricas de giz, soda cáustica e graxa, e a destilaria de álcool.
A localização do conjunto da Água Branca, ao lado dos trilhos de duas ferrovias, não foi, evidentemente, apenas providencial, pois, na escolha do terreno, esse fator foi determinante. O Oeste paulista, de ocupação relativamente recente, já não era um sertão apenas povoado. As frentes pioneiras do café haviam criado um sem-número de núcleos urbanos que se desenvolviam a olhos vistos. O abastecimento desse novíssimo mercado dependia irrestritamente do transporte ferroviário. A operacionalização perfeita da distribuição do volumoso fluxo de mercadorias produzidas na Água Branca completou-se com a instalação da ferrovia interna das IRFM. Em 1923 foram compradas as duas primeiras locomotivas que, manobrando nos trilhos inter- nos, permitiam que os vagões fossem carregados diretamente nos pátios das fábricas.] - Matarazzo 100 anos
A concentração vertical das fábricas e da produção reunindo e ampliando os setores para o aproveitamento racional dos subprodutos. Porém, Matarazzo não se limitou a isso e avançou geograficamente para além do Estado de São Paulo.
No imaginário popular, Matarazzo podia quase tudo - Para Luigi Luzatti, economista italiano, Francesco agia dominado pela febre industrial, fazendo a cada ano surgir uma indústria diferente. Gostava de criar, não simplesmente de acumular riquezas, e sim gerar recursos para aprimorar suas indústrias, competir, gostava de empreender, do jogo, do risco calcula- do.
Em 1922, Matarazzo cria a sessão de cinema nas IRFM e passa a distribuir filmes norte-americanos pelo país até 1932.
A sessão de transporte também na Água Branca constituiu o elo importante na cadeia de fabricação, juntamente com a fábrica de carroceria e caixotaria.
As IRFM empregaram boa parte da população da região e até mesmo dos demais bairros da cidade. Nos anos 1950, as IRFM contavam com 30 mil empregados em quase 100 empresas nos setores metalúrgico, químico, têxtil, de alimentos, limpeza, embalagens, materiais da construção.
Num terreno de 113.721 m2 com uma área construída que passava de 96.000 m2 o parque industrial produziu sabonetes (seção de perfumaria) e sacarias, óleos industriais para seu próprio uso, possuía mecânica e fundição, tudo isso sob a filosofia de aproveitar ao máximo a infraestrutura existente e alcançar autonomia.
O “Império Matarazzo” cresceu, se expandiu pelo país, para então nos últimos anos enfraquecer e se extinguir em meados da década de 1980. Matarazzo morreu em 1937 com 82 anos e, seu sucessor e filho, Francisco Matarazzo Jr. assume a missão de dar continuidade ao seu legado, implantando uma reforma administrativa com um novo sistema de gestão de negócios.
Em 1986, o CONDEPHAAT decidiu tombar as edificações remanescentes por seu valor simbólico, como marco referencial do que foi o complexo IRFM, uma vez que todos os outros edifícios tinham sido demolidos.
Poucos anos antes, diz-se que no final da década de 1970, os proprietários ordenaram a demolição de quase todas as construções existentes, no intuito de dar um novo rumo ao terreno, para que recebesse outras atividades. Os planos não tiveram êxito e a falência das IRFM foi declarada.
A solidez do grupo Matarazzo chegou a ser comparada a do Império Britânico. No auge de sua riqueza, a Enciclopédia Britânica catalogou o império dos Matarazzo como um dos cinco principais conglomerados familiares do mundo. Seu patrimônio só perdia para o PIB da União e do Estado de São Paulo.
A Casa das Caldeiras e a Casa do Eletricista, como são hoje reconhecidas, faziam parte desta história, como construções remanescentes de um tempo.
A Casa das Caldeiras faz parte da memória coletiva da Cidade de São Paulo, preserva em seu conjunto arquitetônico, a história de um período áureo, entre as décadas de 1920 e 1950. Uma cidade que crescia em ritmo acelerado, influenciada pela a industrialização e pelo tecnicismo Europeu, que refletiram os padrões urbanos e arquitetônicos da cidade e têm ligação direta com a vida econômica, social e cultural.
Exemplar típico da arquitetura fabril de caráter utilitário recebeu grandes janelas, pé-direito altíssimo, três chaminés monumentais que parecem ganhar os céus, túneis-galerias que remetem a passagens subterrâneas, fornalhas que eram alimentadas por carvão.
O edifício das Caldeiras é formado por um conjunto de três caldeiras abrigadas numa grande nave, distribuindo em dois pavimentos a circulação, as dependências para atividades subsidiárias, além dos túneis e as comportas associados ao sistema de circulação de ar.
A caldeira é constituída pela caldeira propriamente dita - estrutura metálica preenchida de alvenaria de tijolos, com várias câmaras por onde passa os sistemas de serpentinas, o reservatório, a fornalha - e por um sistema de túneis e dispositivos de controle de ventilação interligados a chaminé.
Observam-se três fases importantes de construção e ampliação durante o levantamento histórico da Casa das Caldeiras:
A primeira fase chega ao nosso conhecimento através da planta encaminhada em 1923 à Prefeitura Municipal, onde se desenhava um bloco único de alvenaria de tijolos. Possivelmente já se tratava de ampliação: uma provável construção anterior teria sido prolongada e seu alinhamento alterado. Desta fase persiste a estrutura principal, portante de alvenaria, embora desfigurada pela abertura de novos vãos e outros fechamentos.
Em 1936, uma nova planta foi encaminhada para aprovação com ampliações e reformas, sem mudanças significativas na estrutura primitiva, tendo sido construídos novos fornos e caldeira, que exigiam uma outra chaminé edificada na extremidade oposta daquela já existente.
A ampliação de maior envergadura é executada em 1953, conforme plantas submetidas a aprovação da Prefeitura Municipal. Foi construído um corpo anexo para servir como reservatório de água para as caldeiras e, em continuidade, uma plataforma coberta por laje de concreto armado permitiu o aproveitamento do pavimento superior como depósito de resíduos. Novas caldeiras foram instaladas, substituindo as antigas, e por se tratarem de caldeiras de maiores dimensões a cobertura foi alteada, elementos vazados preencheram a diferença de altura nas paredes.
Uma nova cobertura de telhas de fibrocimento foi instalada sobre estrutura metálica formada por tesouras. O lanternim e os elementos vazados foram recursos para proporcionar maior iluminação e exaustão do calor. Uma nova escadaria de acesso ao piso principal foi construí- da. Ainda nesta fase, o sistema de exaustão das chaminés precisou ser refeito, com a construção de uma galeria interligada de estrutura independente a laje e a alvenaria portante.
As sucessivas transformações pelas quais o edifício passou apontam para a dinâmica peculiar deste tipo de construção: uma plataforma de produção de energia para o parque industrial. Após sua desativação no final da década de 70, o espaço foi entregue ao abandono e esquecimento até que em 1998 participa da exposição “A Cidade e suas Histórias”, projeto concebido pelo Arte-Cidade, que questionava a relação da cidade com seus espaços urbanos degradados e abandonados.
[Enquanto a área das antigas Indústrias Matarazzo é um campo repleto de indícios de história... As chaminés são outro emblema de Arte-Cidade. A chaminé é uma catedral do mundo fabril: comunica o céu com a terra. por ela os raios de sol penetram como através de vitrais. Na antiga instalação industrial, caldeiras e fornalhas são máquinas de transformar materiais...
... Os artistas contemporâneos, conscientes da dinâmica da devastação industrial, também são movidos pela convicção de que o passado é remoto e que imperativo redimí-lo para o presente...
...A arquitetura do conjunto retrata os padrões da arquitetura industrial inglesa, profundamente marcada pela fachada de alvenaria aparente de tijolos de barro e as esquadrias metálicas de pouca largura e altas, que tinham a função de iluminar o ambiente sem permitir a visão do exterior para a rua.]
- Intervenções Urbanas Arte- Cidade de Nelson Brisac – Arte Cidade.
Em 1985 o CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico Arqueológico Arquitetônico e Turístico do Estado de São Paulo) pediu o tombamento desse imóvel, na época já desativado, visando preservá-lo como documento arquitetônico da história da industrialização paulistana. No fim desse processo _ 1986, com revisões datadas de 1993 _ decidiu-se preservar um dos galpões da fábrica, a casa do Eletricista, o prédio de caldeiras e as três chaminés de alvenaria refratária, cujas alturas variam de 46 a 54 m e os diâmetros externos de 2,60 a 4,40 m, que complementavam a central de vapor.
A partir da compra do terreno, pela empresa Ricci e Associados, em 1992, iniciou-se o planejamento de revitalização de todo o terreno (aproximadamente 100.000 m2) e o estudo de viabilidade. O projeto de desenvolvimento urbano do terreno contou com a intervenção da Operação Urbana conseguindo agregar uma série de melhorias e valores para a área, concretizando o projeto de reciclagem e restauro dos imóveis tombados Casa das Caldeiras e Casa do Eletricista através dos arquitetos Marcos Carrilho e Victor Hugo Mori.
Em 1998, após receber e apoiar a terceira edição do projeto ARTE-CIDADE, a Casa das Caldeiras recebeu obras emergenciais onde o telhado foi refeito, as janelas restauradas e vidros colocados, as chaminés foram lavadas, cintadas e suas bocas foram completadas. Em 1999, as obras de restauro e reciclagem do espaço que possibilitaram dar ao edifício um novo uso, foram concluídas. As características do edifício foram mantidas e as obras mais profundas de restauração limitaram-se, na maior parte dos casos, à recomposição de elementos alterados.
As sucessivas sobreposições e acréscimos sofridos pelo edifício foram conservados. A intervenção proposta buscou em síntese preservar a historicidade do objeto, os aspectos fundamentais foram mantidos como documento do processo evolutivo da atividade industrial.
Sob o aspecto simbólico, as chaminés são os elementos mais expressivos. A sua presença é a marca simbólica da presença da fábrica e atua como referência evocativa da intensa atividade fabril do lugar.
Das três caldeiras remanescentes, apenas uma apresentava-se com todos os seus componentes. O critério de restauração adotado foi o de conservar uma das caldeiras, a que se encontrava mais integra, em seu estado original, com os reparos pertinentes, e uma outra caldeira seria mantida à mostra com todo o sistema de circulação de fluidos revelados, possibilitando assim o entendimento de seu funcionamento. A última caldeira apenas foi mantida e reparada com os poucos elementos estruturais restantes.
Com a eletrificação da Sorocabana em 1940 e sua finalização no após guerra, percebendo o ônus do serviço de manobras executados pela EFS e SJ e que suas duas locomotivas a vapor compradas da Henschell em 1923 já estavam no limite de sua capacidade.
As IRFM se beneficiou de sua facilidade de crédito para adquirir, entre os anos de 1945 e 1949, mais de 12 locomotivas da marca DAVENPORT com motor Caterpillar - diesel mecânicas do tipo 30TDM6 e 5T DM4 com transmissão mecânica de bitolas diferentes. Pelo menos 4 delas foram usadas na cidade de São Paulo, e uma se encontra junto a Casa das Caldeiras restaurada e pintada, seguido o padrão verde escuro com faixa branca e recebeu o nome de Filomena. Em homenagem a esposa do conde Matarazzo.
Maria Pia Matarazzo, neta do Conde Francisco Matarazzo assim escreve no livro que preparou para comemoração dos 100 anos das IRFM: [...Nos 100 anos que ficam registrados neste livro está a memória de nosso passado, que estimamos importante para a toda a sociedade a cujo desenvolvimento estivemos sempre inteiramente ligados.
O pioneirismo não tem apenas vantagens, causa também ônus. Foi em decorrência dele que Matarazzo se tornou um nome ligado a quase todas as áreas de produção, comercialização e serviços. Mas novos são os tempos e é chegada a hora de mudar...]