Monumento a Olavo Bilac, São Paulo, Brasil
São Paulo - SP
N. 106
Fotografia - Cartão Postal
Quando se fala que o Brasil é um país que despreza sua história
e o culto a memória de seus antepassados ilustres, pode parecer um certo
exagero.
Entretanto, isso é a constatação de como lidamos com a
cultura em nosso país.
Vamos tomar como exemplo o caso do jornalista e
poeta brasileiro Olavo Bilac.
Um dos grandes nomes da cultura brasileira entre
o final do século 19 e início do século 20, Olavo Bilac foi conhecido
por suas poesias, pelos contos e crônicas, além da literatura infantil.
Divulgador e propagador do civismo no Brasil, foi o criador da letra do "Hino à Bandeira", além de defensor do serviço militar obrigatório.
Seu trabalho
com poesia rendeu, em 1907, o título de “Príncipe dos poetas brasileiros”, atribuído
pela extinta revista Fon-Fon. Além de autor de alguns dos mais conhecidos poemas nacionais, Bilac é considerado nosso mais importante poeta
parnasiano.
Ao falecer em 1918, Olavo Bilac deixou um sentimento de grande
tristeza no Brasil.
Por todo o país surgiram iniciativas de homenagens ao
finado poeta e, em São Paulo, foi debatida a ideia de erigir um monumento.
A iniciativa de um monumento em homenagem a Olavo Bilac surgiu em 1919 através da "Liga
Nacionalista", composta principalmente por estudantes e professores da Faculdade
de Direito, além de integrantes da Faculdade de Medicina e Escola Politécnica.
Para tanto, foi escolhido o escultor William Zadig, sueco de origem, que naquele mesmo ano apresentou sua maquete do projeto.
Para começar a construir o monumento eram necessárias duas
coisas: decidir o local de instalação e obter recursos para os custos de William Zadig, que
decidiu produzir o monumento no exterior, pela facilidade de obter matéria prima e
preços melhores.
Assim que, igual aconteceria mais tarde com o "Monumento a Duque
de Caxias", houve grande mobilização pela arrecadação de fundos. Em pouco mais
de um ano, com a organização de bailes e peças teatrais pela cidade, espetáculos
no Theatro Municipal, além de tômbolas pelas igrejas paulistanas, o dinheiro
necessário para o início dos trabalhos foi arrecadado.
Ultrapassada essa fase,
em abril de 1920, lançou-se a pedra fundamental no início da Avenida Paulista,
onde ela encontrava-se com a Rua Minas Gerais (hoje a área é parte do
complexo viário da Avenida Dr. Arnaldo).
Após o lançamento da pedra
fundamental, William Zadig embarcou para Copenhague, Dinamarca, onde iria
fundir o bronze e esculpir o monumento, na fundição Aug & Jensen. Durante
sua estadia de pouco mais de um ano na Europa, Zadig enviava fotografias de seu trabalho em andamento.
Ao regressar ao Brasil
em meados de 1922, foi preciso uma autorização especial da então Presidência do
Estado para que o conjunto escultórico fosse liberado na alfândega sem demora
ou restrições. Uma vez liberada a saída do Porto de Santos, as esculturas
subiram para a capital.
Em Agosto a montagem do conjunto iniciou-se e o local
foi cercado por tapumes, para deixar o artista trabalhar com privacidade e manter o público
curioso.
A data escolhida para a inauguração foi o 7 de setembro de 1922, data
que celebrava um século da Independência do Brasil, e que foi palco de várias
inaugurações e festejos pela cidade. Alguns dias antes desta data, os
tapumes foram removidos e o monumento ficou coberto por um grande pano branco.
Às 11 horas daquele dia, Lúcio Cintra do Prado, presidente do Centro
Acadêmico XI de Agosto, juntamente com o prefeito municipal e o
presidente do Estado, inaugurou o monumento cujo evento contou com grande multidão e festividades.
O monumento era composto de cinco partes
espalhadas pela estrutura onde foi instalada. William Zadig fez representar
na obra alguns dos principais trabalhos de Olavo Bilac.
No alto do monumento, a
figura do poeta. À esquerda, o bandeirante Fernão Paes Leme de "O
Caçador de Esmeraldas", ao centro duas obras, primeiro o pensador representando
o poema "Tarde", em seguida, "Pátria e Família", representado por uma família
junto a um militar brasileiro e a bandeira nacional. Na direita, talvez mais
conhecida parte do monumento, "Idílio ou Beijo Eterno", representado por um europeu e uma índia se beijando, ambos nus.
A foto principal do post, dos anos 20, é uma das raras imagens que mostram o monumento em sua construção original, com todas as esculturas juntas
Uma vez inaugurada, a obra não teve vida
fácil. Tão logo passaram as comemorações do 7 de Setembro, surgiram as
primeiras reclamações contra ela, com críticas a nudez de "Idílio ou Beijo Eterno", e ao
local escolhido para o monumento, que segundo os reclamantes, causava problemas
no trânsito (isso nos anos 1920 e 1930!).
As reclamações persistiram e
foram ganhando cada vez mais corpo, até que em 1936, devido a obras
viárias, o monumento foi desmontado e enviado para um depósito da
prefeitura.
Anos mais tarde, aos poucos, as obras foram reaparecendo, de forma separada, em outros logradouros da cidade de São Paulo.
O busto de Olavo Bilac foi para a Faculdade de Direito da USP, Fernão Paes Leme foi para o bairro de Pinheiros, enquanto as demais partes
permaneceram guardadas no depósito até 1956, quando o então prefeito Jânio Quadros "redescobre" as esculturas e manda reinstalar.
Assim, "Pátria e Família" foi para a Avenida
Celso Garcia, ao lado de uma unidade fabril da Santista, e o "Idílio ou Beijo Eterno" foi para
o Largo do Cambuci, um dos redutos eleitorais do prefeito.
Porém, a escultura "Idílio ou Beijo Eterno" não
foi bem recebida pelos moradores locais, e acabou sendo removida.
A obra de William Zadig ficou mais alguns anos no depósito da Prefeitura, até 1966, quando o então prefeito Faria Lima manda reinstalá-la na
entrada do Túnel Nove de Julho (lado do centro).
Novamente, a escultura ficou no
centro de uma polêmica por conta da nudez, sendo alvo de alguns vereadores
paulistanos, que acusavam o monumento de "obra do demônio, um verdadeiro
escândalo", pedindo sua retirada da entrada do túnel, em nome da "moral e bons costumes".
Temendo que a
obra mais uma vez fosse parar no depósito, estudantes do Centro Acadêmico XI
de Agosto, que no passado haviam se mobilizado pela criação da obra, resolveram "sequestrá-la" e levá-la para a frente da Faculdade de Direito.
E assim, instalada por eles no Largo de São Francisco, se encontra até os dias de hoje, longe dos olhos e da sanha dos hipócritas de sempre (eram tempos diferentes, quando os estudantes possuiam um sentimento de civismo, não o "ativismo lacrador" dos dias atuais).
Concluindo, tanto tempo depois, fica a pergunta: estaria hoje Olavo Bilac satisfeito com esta homenagem? É desconhecido outro caso de obra de arte pública fragmentada em tantas partes e espalhada por vários logradouros da cidade. Pela sua contribuição à literatura brasileira e a nossa pátria como um todo, Bilac merecia mais respeito.
De qualquer forma, ainda que separados, vermos os monumentos conservados é um alento, levando-se em conta o péssimo estado da maioria das obras artísticas da cidade. Mas seria interessante que em cada uma dessas obras houvesse ao menos uma explicação, dizendo ser aquela um fragmento de uma obra inicialmente única.


Abaixo um resumo de onde estão e qual o estado de conservação das partes do monumento original (na verdade, quase todas).
O "quase" se deve a duas partes da obra original que não são citadas e nem encontradas em lugar algum (as duas mostradas na primeira imagem abaixo).
É possível que estas duas partes estejam na reserva técnica do Departamento de Patrimônio Histórico de São Paulo (DPH), como também é possível que não existam mais, tendo sido descartadas. Também é possível estarem nas mãos de colecionadores particulares anônimos.
A primeira (1) é a imagem de um garoto escalando o monumento em direção a Olavo Bilac com uma coroa de louros em uma das mãos. Já a segunda (2) parece ser parte da obra “Pátria e Família”, que acabou não sendo colocada na nova instalação. Devido a distância da imagem e da inexistência de outras imagens mais aproximadas, é impossível identificar do que se trata. Apenas parece ser a figura de um homem de chapéu.

* Monumento a Olavo Bilac:
O que era uma homenagem monumental, tornou-se um mero busto. Embora bem conservada, a escultura de Olavo Bilac hoje é observada por poucas pessoas, uma vez que está instalada em uma área cercada de grades e arames farpados pertencente ao Comando Militar do Sudeste, na Avenida Sargento Mário Kozel Filho, no Ibirapuera.
"Idílio" ou Beijo Eterno":
Sobre essa escultura em específico, o texto principal do post (vide acima) já fez referência. Encontra-se em bom estado de conservação.
"O Escoteiro":
O fragmento do monumento original que esteve por mais tempo guardado no depósito da Prefeitura de São Paulo, novamente deu o ar da graça. Depois do longo "exílio" ao qual foi submetido, agora está (esperamos que de forma definitiva) exposto no Centro Esportivo Tietê (antigo Clube Tietê).
"O Caçador de Esmeraldas":
Pouco conhecida pelos paulistanos, a escultura “Caçador de Esmeraldas”, que representa Fernão Dias Paes Leme, está instalada nos jardins de uma escola cujo nome é também uma homenagem ao bandeirante. A Escola Estadual Fernão Dias Paes Leme fica no número 420 da Avenida Pedroso de Morais e pode ser fotografada.
Um dos motivos da instalação da obra por lá, é que o local teria sido no passado o "Sítio Capão", que pertenceu ao bandeirante.
"Pátria e Família":
Quem passa pela Avenida Celso Garcia não imagina que esta escultura já teve outro endereço nessa mesma avenida. Ela, inicialmente, estava instalada na esquina com a Avenida Salim Farah Maluf, bem ao lado de uma antiga fábrica, onde hoje encontra-se um hipermercado.
Quando a fábrica foi demolida, em 1999, o monumento foi transferido para a Praça José Moreno, altura do número 4200 da mesma Celso Garcia, bem ao lado da Biblioteca Cassiano Ricardo. A escultura está limpa e bem conservada.
"Tarde":
A mais bem cuidada escultura do conjunto original do Monumento a Olavo Bilac, é também a menos conhecida delas. Desde 1988 instalada no Parque da Independência, a estátua fica escondida em uma das alamedas laterais do parque.
Para encontrá-la é preciso subir a escadaria que fica no mesmo lado da Casa do Grito (porém nas proximidades do Museu Paulista). É um excelente lugar para ler um livro ou relaxar, mas essa estátua merecia um lugar melhor, com mais destaque, em outro ponto do parque ou do próprio bairro do Ipiranga.
Chamada por muitos de “Pensador”, a figura do homem está, na verdade, melancólico após apreciar o livro "Tarde", obra póstuma de Olavo Bilac, com poemas que apresentam um clima de declínio da vida e crepúsculo. O livro encontra-se esculpido no topo de uma pilha de outros livros, bem ao lado do homem nu.