Porto, Serviço de Navegação Fluvial da Companhia Paulista, Porto Ferreira, São Paulo, Brasil
Porto Ferreira - SP
Fotografia
Texto 1:
A navegação fluvial na Cia Paulista (CP) sempre foi vista em meio a muito mistério e falta de informações concisas. Muito se especula a respeito, mas poucos são os estudos definitivos deste modal empregado em São Paulo no fim do século XIX. Tentaremos demonstrar neste pequeno resumo o que foi e o que representou para a CP sua navegação.Sempre foi de praxe no Brasil, país com grandes extensões de rios, a utilização dessas vias fluviais para o deslocamento, vide o bandeirantismo e a descoberta do ouro no interior do país, sempre seguindo o caminho dos rios. Nosso potencial fluvial é imenso, sendo largamente utilizado ao norte do país. No entanto, a navegabilidade dos rios paulistas também é uma máxima, o que levou a CP entrar neste modal a partir de 1881.
Temos que entender qual era o cenário da ferrovia naquela época. Estava a CP terminando sua linha entre Cordeiros e Descalvado, com seu ramal entre Cordeiros e Rio Claro. Nesta época, uma delicada situação despontou em uma verdadeira briga com a Cia Mogiana (CM) que não pode extender suas linhas para a região de Ribeirão Preto, e com os planos do Governo pelo famoso traçado Pimenta Bueno, que praticamente obrigaram a CP a entregar sua concessão de além Rio Claro. A situação manteve a jovem CP encurralada por entre a Rio Clarence (RC) e a CM. Para o norte não poderia passar e atingir os sonhados cafezais de São Simão, para oeste, a mesma situação para atingir a rica região de Araraquara. O que fazer, então, com todo o investimento desta longa linha tronco intitulada “linha do mogy-guassú”, mesmo que ainda assim as mesmas ferrovias vilãs fossem suas tributárias? Entre tantas alternativas, apresentaremos uma das encontradas fora a famosa Navegação Fluvial. Se por um lado não poderia a CP atingir por via férrea a região das margens do rio para além de Descalvado, por outro, em força de contrato celebrado na construção da linha do Mogi Guaçu, poderia ela utilizar-se de meios e de outros caminhos que a esta linha convergissem.
“Não esta, pois, remoto o dia em que serão as aguas do Mogy-guassú sulcadas pelo barco a vapor, assignalando então a historia da Provincia de S. Paulo mais uma epoca memoravel pela realisação de um grande melhoramento propulsor de seu progresso, e devido á iniciativa sempre brilhante da Companhia Paulista. (Relatório CP 30/05/1884, pág. 5)”
As deliberações a respeito da navegação na companhia começam em 1881, (que mesmo com o início das obras e abertura de tráfego fluvial, somente em 6 de maio de 1887 fora gerado o decreto nº 9753 com autorização e privilégio de 10 anos de exploração da navegação fluvial dos rios Mogy-gussú, Pardo e Grande dado pelo Governo Imperial). Em 24 de outubro de 1883 envia para uma longa jornada na Europa e EUA o engenheiro Walter J. Hammond. Após conhecer diversos sistemas diferentes e tipos de vapores, Hammond chega a Pittsburgh, nos EUA, nos rios Allegheny e Monongahela (formadores do rio Ohio), com formação muito parecida a do mogy-guassú. Ficou satisfeito em encontrar diversos vapores com roda de popa e baixo calado, de fácil manobrabilidade nas fortes correntezas, iguais às encontradas no mogy, porém, em cascos de madeira, não aprovados por ele para nossa situação. De volta a Europa, Hammond se depara com vários vapores utilizando-se de sistema de grossas correntes de ferro deitadas sobre o leito do rio, ajudando a vencer as corredeiras através de mecanismos fixados aos barcos. Tudo isso lhe rende experiência para propor a CP seu projeto de navegação. De volta de sua viagem, ficou resolvido por Hammond 3 situações, apresentadas em seu relatório para a diretoria da CP no começo de 1884: “1º que o systema a vapor deve ser de roda de pôpa; 2º que éra possível construir vapores d’esse systema com callado muito pequeno; 3º deve ser collocada uma corrente de ferro no canal para poder o vapor subir, sendo ajudado por um machinismo especial para este fim (Relatório CP 28/09/1884, pag 5 e 6)”.
Foram enviadas varias propostas de fornecimento dos vapores, vencida pela inglesa “Yarrow & Co.”, fornecendo vapores de 100 pés de comprimento com casco galvanizado e rebitagem dupla ao preço de 2900 libras. Ficaram também a cargo da mesma empresa o fornecimento das lanchas, com mesma qualidade construtiva, de 60 pés de comprimento ao preço de 490 libras cada. Em maio de 1884 começava Hammond a construção do dique em Porto Ferreira, na extensão de 640 metros, e as primeiras obras para o início da navegação em fins de setembro do mesmo ano para atingir a primeira grande corredeira, escaramuça, distante 35 quilômetros de Porto Ferreira.
Diversos foram os trabalhos realizados naquele ano após o retorno de Hammond, concertando e melhorando as inúmeras corredeiras existentes para atingirem-se os mais de 200 quilômetros de via fluvial previstos até Pontal, na confluência do Mogi com o Pardo. Era necessária a remoção complicadíssima de toneladas de pedras em canais criados dentro das próprias correntezas, a fim de aumentar a profundidade do rio nestes pontos, para que os barcos, mesmo em época de seca do rio, pudessem transpor sem maiores problemas. Eram as principais corredeiras as seguintes: Patos, Gaviãozinho, Ponte Amaral, Pântano e Escaramuça.
Em 25 de março de 1884, com as obras ainda por acabar, mas já prontas a navegar, percorre pela primeira vez o vapor Conde D’Eu em águas do Mogi, partindo de Porto Ferreira até Porto Pontal, percorrendo os 205 quilômetros que separam estas localidades em 14 horas. Com a conclusão das obras de canalização das corredeiras, o valor dispendido era de 259.193$417 (aproximadamente duzentos e sessenta contos de réis). Era notável o desempenho do vapor e do uso do guincho e correntes para auxilio nas corredeiras, satisfazendo às expectativas da diretoria da CP. A abertura da navegação dobrava a extensão de sua malha “No presente relatorio que tenho a honra de dirigir a V. S. já posso, entretanto, fallar da navegação supramencionada como de um facto real: ja um barco a vapor sulcou as aguas do rio entre Porto Ferreira e Pontal, n’uma extensão de 205 kilometros -a saber- em extensão equivalente a da ferro-via que parte de Jundiahy até o ponto inicial da navegação! (relatório CP 05/04/1885, anexo 5º pag 1)”. Ficava redefinido, desta data em diante, o nome da companhia em “Companhia Paulista de Vias Férreas e Fluviaes”.
As três primeiras estações/portos foram abertas ao tráfego na mesma data, em locais escolhidos por fazendeiros e moradores para melhor escoamento dos produtos. Eram elas Porto Prainha, Porto Amaral e Porto Pulador. No entanto, apenas em Prainha e Pulador haviam construções começadas para servirem de estações e armazéns. Neste primeiro momento eram utilizados ranchos de encerados para armazenamento da carga.
A CP apenas investiria nestas novas localidades assim que as obras dos acessos aos portos ficassem prontas, situação esperada pelos engenheiros até o final do ano de 1884. Em média, estas edificações e todo o complexo portuário ocupavam 5 alqueires, que eram comprados dos próprios fazendeiros a preços médios de 200$000 (duzentos mil réis). Era também esperada a chegada dos novos materiais flutuantes vindos da Europa. Teve a CP, na finalização dos seus portos, 11 portos/estações oficiais ao longo do Mogi. Eram: Prainha; Amaral; Pulador; Cunha Bueno; Jatahy; Cedro; Martinho Prado; Pinheiros; Jaboticabal; Pitangueiras e Pontal, que movimentavam cerca de 390 mil quilos de café em seus primeiro ano de operação.
Para a manutenção dos vapores e lanchas, fora construída uma oficina com trilhos velhos, fechada de chapas galvanizadas e cobertas de telhas francesas, próximo à estação de Porto Ferreira. As embarcações, para ali chegarem, passavam por uma via de 3 metros de bitola assentada entre a oficina e o dique, distância essa para facilitar aos trabalhadores e para que o edifício não sofresse com as enchentes.
A partir de 1891, nesta oficina também começaram a serem executados os serviços de manutenção do material rodante do recém-adquirido ramal de Santa Rita do Passa Quatro. Havia na frota flutuante, 11 vapores, 40 lanchas e 5 balsas. Seguiam com nomes os vapores:
Conde D’Eu - Comprado novo em 1884 da empresa londrina Yarrow & Co, o maior e mais possante de todos com roda de popa, podia rebocar até 3 lanchas em sua capacidade máxima, tinha 32 metros de comprimento por 3,8 metros de largura, calado de 40 cm e uma maquina a vapor com força de 35 cavalos;
Rio Bonito - De rodas laterais, o menor de todos, comprado de segunda mão de João M. Rudge em maio de 1885, com nome anterior “Piratininga”;
Conselheiro Antônio Prado - Também de fabricação da londrina Yarrow & Co, lançado à água em 8 de fevereiro de 1885. Possuía 23,5 metros de comprimento por 5,5 metros de largura e calado de 37 cm, com casco de aço galvanizado. Foi lançado a água em meio de 1885
Doutor Nicoláu de Queiroz - Fabricado por Yarrow & Co, possuía 18,3 metros de comprimento por 5,5 metros de largura e calado de 42 cm, com casco de aço galvanizado. Foi lançado a água em 6 de abril de 1885.
Doutor Elias Chaves - Possuía 25,9 metros de comprimento por 5,5 metros de largura e calado de 33 cm, com casco de aço galvanizado. Foi lançado a água em fins de 1885.
Eram os outros vapores, com menores informações disponíveis: Eduardo Prates; José de Queiros; Elias Fausto; Barão de Jaguara; Fidencio Prates; Antônio Paes e Antônio Lacerda.
Não era o principal objetivo da CP o transporte de passageiros em vias fluviais, devido à lenta marcha dos vapores e a complicada viagem que deveriam enfrentar nas corredeiras. No entanto, alguns aventureiros dispunham-se a fazer tal viagem: “A experiencia tem provado que a Companhia em nada póde lucrar com passageiros, pois há poucos moradores á beira do rio. Ficou marcado segunda-feira como unico dia fixo em que o vapor desceria o rio. As outras viagens estão reguladas pela quantidade de carga nas estações. Creio que esse systema deve ser sempre adoptado, porque ainda que houvessem 8 ou 10 passageiros em cada viagem, isso não pagaria as despezas. A navegação do rio Mogy-Guassú deve ser considerada sómente para o transporte de cargas, ao mesmo tempo permitindo passageiros dispostos a sujeitarem-se a incommodos de um rebocador de cargas. (Relatório CP 10/10/1886, anexo 10, pag 78).”
Toda a obra no Mogi é concluída 1890, apenas dois anos antes da CP comprar a RC e começar os seus tão sonhados investimentos nas linhas da região oeste do Estado em direção à região de Araraquara, levando suas linhas paralelamente a sua navegação, até Rincão. Com a chegada da linha em Jaboticabal, tornava-se inviável manter os vapores até Pontal, fazendo a CP no ano de 1900 suspender a navegação entre Pontal e o Porto Amaral, mantendo apenas os 35 km que separavam Porto Ferreira deste último. A inauguração do prolongamento da via férrea até Pontal a 25/03/1903 decreta o fechamento total dos serviços de navegação, sendo extintos em primeiro de maio de 1904.
Muitas cidades tiveram forte impulso em seu desenvolvimento ajudado pela navegação no Mogi pela CP, caso de Guatapará, Barrinha, Pontal e, sem duvida a mais importante delas, Porto Ferreira. Esta última dependia quase que exclusivamente da navegação para a sobrevivência, teve um grande baque em 1904 com o fechamento destes serviços, levando mais de 30 anos para se reestabelecer.
Contudo, a navegação para a CP cumpriu o seu papel de drenagem de cargas de suas concorrentes, e foi, como citado no começo do artigo, um dos principais pilares de sua existência em fins do século XIX.
Bem é verdade isso, que em 1912, na época que a CP estendia o ramal de Santa Rita, uma das cláusulas do acordo com a CM era justamente de que a CP nunca mais retomaria a navegação fluvial comercialmente no rio Mogi.
Embora tenha se acabado o serviço, os vapores e lanchas foram mantidos por muitos anos, utilizados em manutenções e construções de pontes, e mesmo sofrendo arrendamentos esporádicos por particulares.
O mais imponente e querido vapor da CP, Conde D’Eu teve, infelizmente, um triste fim em 29/07/1908, sucumbindo a um incêndio acometido por fogo no mato próximo onde ele estava, fora d’água, já bastante estragado pelos anos em desuso.
Não há, entretanto, uma data específica e nem destinação dos outros vapores. Há quem diga que alguns deles foram vendidos para uso na navegação do rio São Francisco e Amazonas, mas nada confirmado. O dique em Porto Ferreira permaneceu abandonado por vários anos. As últimas lanchas foram retiradas dele, assoreado, na década de 1960.
Este dique foi reformado e enchido d’água novamente, servindo de monumento à época de ouro da navegação na cidade de Porto Ferreira. As estações e portos foram demolidos, com parte do material utilizado na construção de novos logradouros, como por exemplo, da estação de Tombadouro do ramal de Santa Rita, que utilizou telhas e tijolos do porto de Cedro e Amaral.
Terminava desta forma digna, a grande epopeia da navegação fluvial na CP. Texto de Leandro Guidini.
Texto 2:
No final de 1881, começaram as explorações nos rios Mogi e Pardo para a sua navegação. Concluiu-se então que alguns melhoramentos teriam de ser feitos para se atingir tal intento. Em 223 km, percorridos a partir de Porto Ferreira, escolhida para ser o ponto inicial de embarque da navegação, foram achadas uma série de corredeiras: Joaquim do Porto, Prainha, Escaramuça, Boa Vista, Cordão e Córrego Rico, todas no Mogi-Guaçu e oferecendo "embaraços vencíveis". O resultado encorajava a continuação do empreendimento, que era fundamental para a Companhia. Perdidas as saídas da ferrovia por Rio Claro e São Simão para Mato Grosso, chegar ao rio Grande pelo rio era outra solução, que poderia ser provisória ou definitiva, mas fundamental para a subsistência da Paulista como empresa.
Por outro lado, foi nesse ano que a Diretoria considerou que "como força poderosa para a consecução de tão patriotico fim (o rápido desenvolvimento da província) e acquisição de braços livres, tomou a resolução de conceder passagens gratuitas com suas respectivas bagagens, aos colonos e imigrantes". Esta histórica decisão permaneceu em vigor por longos anos, e mostrava a visão que os diretores da Paulista tinham do grande futuro de São Paulo.
Em 1883, a Companhia continuou avançando no empreendimento da navegação a vapor, mas não sem dificuldades políticas: o Presidente da Província, Conselheiro Soares Brandão, recusou-se a sancionar a lei proposta pela Assembléia Provincial para a aprovação dos projetos de navegação para os rios Mogi Guaçu e Pardo. Mesmo assim, no ano seguinte, o engenheiro Walter Hammond, inspetor geral da Companhia, foi designado para ir aos Estados Unidos, com o fim de examinar a navegação fluvial em rios, nas mesmas condições do Mogi. Foi, entre outras cidades, a Pittsburgh, onde se juntam os rios Monongahella e Allegheny para formar o rio Ohio. O primeiro destes rios apresentava as condições esperadas. Ele verificou, então, que o ideal seriam os vapores com rodas na popa, enquanto que nas corredeiras, usar-se-ia um sistema de cabos e tambores, que eram utilizados com sucesso nos rios europeus Ródano, Danúbio, Sena, Elba e Reno. Além disso, ele concluiu que seria possível a construção de vapores de calado muito pequeno com as rodas na popa, e que deveria ser colocada, no canal do rio, uma corrente de ferro para que o vapor subisse o rio, ajudado por um maquinismo especial. Finalmente, o proponente que venceu a licitação para a construção de vapores e lanchas foi a firma Yarrow & Co, de Londres. As obras começaram e era esperado que, até setembro de 1984, se pudesse navegar até a corredeira de Escaramuça. Com efeito, já no início de 1885, o vapor Conde D'Eu saía de Porto Ferreira com direção a Pontal, na confluência dos rios Mogi Guaçu e Pardo, percorrendo 205 km em 14 horas. No meio desse mesmo ano, já se atracava nos portos de Prainha, Amaral e Pulador, e as assim chamadas estações - que eram portos, na verdade - começavam a ser construídas. Projetava-se, mais adiante, novos portos: Porto Martins e Jataí. Adquiriu-se um novo navio, o Rio Bonito, cujo nome era Piratininga, quando pertencente ao antigo dono.
A navegação era uma grande fonte de renda, no que tocava às cargas; o número de passageiros, porém, era muito pequeno. Um relatório de 4 de abril de 1886 explica bem a situação: "O numero de passageiros é insignificante, e tão cedo não será muito grande, porque as margens do rio ainda não estão povoadas, e porque quando a distancia entre o rio e uma estrada de ferro é igual, naturalmente a ultima é escolhida. Mesmo que o numero fosse dez vezes o atual, a Cia tiraria bem pouco lucro desse ramo de tráfego. Sempre a condução de passageiros nos vapores será considerada uma concessão da Companhia com o público; assim, por muitos e muitos anos a Companhia não achará conveniência em fazer correr seus vapores em combinação com os trens na estrada de ferro". Para se comprovar isto, no segundo semestre de 1886, viajaram pelos vapores somente 91 passageiros. Em 1885, as estações de Prainha, Amaral e Pulador foram reconhecidas também como agências de correio, sendo o chefe de estação designado seu agente. Ligadas por fios de telégrafo, essas estações-portos ofereciam vantagens idênticas às das estações da ferrovia. E mais vapores vieram, no final do ano: o Conselheiro Antonio Prado já navegava, o Nicolau Queiroz estava quase pronto e o Elias Chaves estava ainda no projeto.
A navegação prosseguia, mas as obras para se avançar no leito com os vapores desenvolviam-se mais lentamente do que o esperado. Em 1886, fazia-se sentir na província uma forte crise na mão-de-obra; além disso, não era fácil recrutar-se operários que deveriam permanecer na água por longos períodos, sujeitos também às febres intermitentes e aos perigos do uso da dinamite para desobstrução do leito do rio. A essa altura, os portos de Jataí e Cedro já funcionavam, e quatro navios já navegavam, com o Elias Chaves prestes a se tornar o quinto. Nesse mesmo ano, o Imperador Dom Pedro II juntamente com sua esposa, D. Teresa Cristina, visitou as ferrovias da Cia. Paulista e foi até Porto Ferreira, onde navegou pelo rio num dos novos barcos. A visita foi providencial e deve ter agradado a Sua Majestade, pois, menos de um ano depois, um decreto imperial daria a privilégio, por dez anos, à Paulista para a navegação nos rios Mogi Guaçu e Pardo.
Em 1890, o percurso estava completo, com 200 km de extensão de navegação desde Porto Ferreira até o porto de Pontal, na junção com o rio Pardo. Mas, em 1900, a Diretoria começou os estudos para o prolongamento da linha férrea, que já atingia Jaboticabal, até Bebedouro, acompanhando a margem esquerda do rio Mogi, enquanto a sua margem direita seria atendida com a construção de um ramal saindo de Rincão. Nunca é demais lembrar que a Paulista havia adquirido as linhas da antiga Rioclarense, em 1892, e tomado posse das ferrovias além de Rio Claro, fato que, quando se começou a navegação, era absolutamente impensado. "É obvio que sem nenhum prejuízo, quer para o público, quer para a Companhia, se poderá então suspender o serviço de navegação fluvial de Porto Amaral para baixo, na estensão de 170 quilômetros, mantendo-o apenas no trecho de 30 quilômetros entre Porto Amaral e Porto Ferreira".
A movimentação da linha fluvial foi crescente até esse ano, quando atingiu seu pico de faturamento (Rs. 379:770$940). Daí para a frente, 1901 (Rs 331:288$700) e 1902 (Rs 209:625$080) até terminar em 1903, ano em que se percorria somente a extensão de 66 km, com o faturamento somente de Rs 8:545$260. Curiosamente, em 1891, apenas um ano após chegar à estação-porto mais longínqua, a Companhia desativou o primeiro desses portos. Nos relatórios imediatamente posteriores a 1903, escreve-se: "(...) A 25/03/1885, inaugurou-se Prainha, Amaral e Pulador; em maio de 1886, Cunha Bueno, Jatahy e Cedro; em 22/09/1886, Guatapará e Martinho Prado; em 10/01/87, Barrinha, Pitangueiras e Pontal. Em março de 1891, suprimiu-se Pulador; em fevereiro de 1895, Cunha Bueno e Cedro; em dezembro de 1900, Jatahy; em dezembro de 1901, Guatapará e Marinho Prado; em 25/03/1903, Barrinha, Pitangueiras e Pontal; em 30/04/1903, Prainha e Amaral, e extinguiu-se a viação fluvial". Muitos desses portos tiveram seus nomes conservados nas novas estações ferroviárias que começavam a ser instaladas nas novas linhas. A navegação acabou sendo extinta não só por causa do problemas causado pelas baixas do rio, que ocorriam exatamente nos períodos de colheita do café, mas principalmente porque a Paulista, já em 1901, chegava com a sua linha férrea do outro lado do rio Mogi na região de Guatapará, cruzando-o e acompanhando-o pela sua margem oriental até Passagem, onde os trilhos chegaram em 1903. Neste mesmo ano a navegação cessou: "Com a inauguração do trafego do ramal ferreo que parte da estação de Rincão e se desenvolve pela margem esquerda do rio Mogy-Guassú, tornou-se dispensável o serviço de navegação alli mantido, que, a partir do dia 1º de fevereiro ultimo, foi suspenso de Porto Amaral para baixo, e, depois de 1o de maio, tambem no trecho de Porto Ferreira e Amaral, desde que se verificou ter ficado nesta parte o trafego reduzido ao transporte de mui diminuta tonelagem de cargas e poderem estas transitar via Descalvado ou pela estação de Tombadouro, do ramal de Santa Rita, com sensível economia nos fretes, segundo o plano de reducção de tarifas que breve entrará em vigor".
Em fins de 1902, existiam ainda 11 vapores, 40 lanchas e 5 balsas. No ano seguinte, os vapores Elias Fausto, Eduardo Prates e José de Queiroz foram vendidos ao Governo para a navegação do rio Ribeira de Iguape. Os outros, ou sejam: Conde D'Eu, Nicolau Queiroz, Elias Chaves, Antônio Prado, Barão de Jaguara, Fidencio Prates, Antônio Paes e Antônio Lacerda ainda permaneceram mais algum tempo em mãos da Companhia até serem vendidos.
Com efeito, o relatório da Companhia de 30/06/1904 citava o obituário da navegação fluvial: "A partir de primeiro de Maio foi completamente supprimido o trafego da navegação e fechada a officina de Porto Ferreira, que até então trabalhava para a reparação do material fluvial e do material rodante da bitola de 0m60. D'esta data em deante a reparação das locomotivas, carros e vagões das linhas de Santa Rita e Descalvadense passou a ser feita nas officinas de Jundiahy".
A cidade de Porto Ferreira sofreu um grande baque com a desativação: em 1904, a mudança de 200 famílias para fora da cidade causou um estrago que nem a epidemia de febre amarela de 1891-92 conseguira fazer. A cidade havia crescido e se tronado um dos pontos estratégicos para a Paulista. Esta havia feito o arruamento da nova cidade e financiado e construção da igreja matriz. Em 1892, a cidade separou-se como distrito de Descalvado e era anexada a Pirassununga, então uma cidade bem maior. E quatro anos depois, separou-se como município autônomo. Afinal, era dali que partiam todos os vapores rio acima até o rio Pardo, colhendo boa parte da safra de café da região a leste e a oeste do rio Mogi e também do alto rio Pardo. Iniciava-se ali um período de vacas magras para a cidade que, ajudado a pelo problema da malária, causado pela própria Paulista quando construiu um dique na foz do rio Santa Rosa, necessário às obras para permitir a navegação fluvial, faria a cidade estagnar pelos trinta anos seguintes. Texto de Ralph Mennucci Giesbrecht.
Texto 3:
A Companhia Paulista de Vias Férreas e Fluviais encontrou muitas dificuldades para implantar a navegação no rio Mogi Guaçu, que tinha como objetivo atingir a região cafeeira.
Não conseguindo autorização do Governo Provincial, recorreu ao Governo Imperial. A exclusividade, mais uma vez foi negada. A navegação comercial pelo rio Mogi Guaçu, foi deixada a livre iniciativa.
A Paulista, que há muito já tinha em mãos minucioso estudo sobre as condições de navegabilidade do rio Mogi Guaçu e os tipos de embarcações que mais se adaptassem ao tráfego fluvial, resolveu por em prática o projeto com a maior urgência.
Ao lado da ponte de madeira fez construir seu porto principal: um cais de pedra com ancoradouros para baldeação de mercadorias.
Edificou um grande armazém a que chegavam os trilhos de seus trens e, para garantir o volume de água indispensável ao calado dos barcos de carga, principalmente durante as secas, desviou parte do ribeirão Santa Rosa, fazendo-o penetrar no ancoradouro por uma abertura deixada na estrutura final das docas de pedra, depois de passar sob uma pequena ponte na estrada de rodagem.
O primeiro trecho da navegação foi festivamente inaugurado em 2 de dezembro de 1884. Partia daqui e alcançava os portos denominados Prainha, Amaral, Pulador, Cunha Bueno, Jataí, Cedro, Martinho Prado, Pinheiro, Jaboticabal e Pitangueiras.
A linha completa foi inaugurada quase dois anos depois, no dia 10 de janeiro de 1887, atingindo Pontal na confluência com o rio Pardo, vencendo assim os 205 quilômetros planejados.
A navegação terminou oficialmente no dia 1º de maio de 1903, em conseqüência da nova ligação ferroviária da Paulista, atravessando o rio Mogi entre Rincão e Pontal, via Guatapará, para a região cafeeira.
Nessa ocasião, seu material flutuante era composto de duas balsas de aço, 36 lanchas e sete vapores: Conde D'Eu, Nicolau Queiroz, Elias Chaves, Antônio Prado, Barão de Jaguara, Antonio Lacerda e Antonio Paes. O acervo foi adquirido pela família Monteiro de Barros, proprietários da Usina Vassununga. Funcionou mais cinco anos fazendo o trajeto Porto Ferreira-Vassununga. O "Conde D'Eu" foi rebatizado "Dona Herminia", nome da mãe de Marcos Antônio de Barros.
Grossa corrente e uma âncora usadas na navegação encontram-se em exposição em nosso Museu Histórico. A corrente, com 120 metros de comprimento, foi encontrada por Sebastião Lacerda, durante uma pescaria. Foi retirada das águas pelos funcionários de nossa prefeitura.
A âncora, quatro pescadores a encontraram a um quilômetro acima da Ilha dos Patos, em 22 de novembro de 1979, por volta das 23h30. De fabricação inglesa, tem a data de 1882, permaneceu cerca de 80 anos sob as águas do rio Mogi Guaçu, conservando-se intacta.
Insensíveis ao seu valor histórico, os descobridores recusaram-se a doá-la, exigindo determinada quantia em dinheiro para entregá-la ao Museu. Nosso historiador Flávio da Silva Oliveira, através da Rádio Primavera, "Jornal do Porto" e "O Ferreirense", com apoio do Clube do Chorão, encetou campanha popular para arrecadação da quantia exigida.
Para maior participação, a contribuição de cada um não poderia exceder duzentos cruzeiros, o que resultou em vinte e seis mil e setecentos cruzeiros, quantia aceita pelos pescadores.
No dia 1º de abril de 1980, Flávio levou a âncora para o Museu. Estava radiante de felicidade. Texto do Porto Portal.
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