quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Banca de Jornais e Revistas, Circa 1953, Centro, São Paulo, Brasil


 

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São Paulo - SP
Fotografia

A Polêmica Sobre o Resgate e Venda da Águia Nazista Recuperada do Naufrágio do Encouraçado Alemão Almirante Graf Spee no Uruguai - Artigo

 


Águia resgatada.


Águia resgatada.


A águia é resgatada no Uruguai.


Encouraçado Almirante Graf Spee.


Na imagem vê-se a águia na popa da embarcação (marcado com asterisco vermelho).


Encouraçado Almirante Graf Spee afunda ao largo da costa uruguaia em 17/12/1939.





A Polêmica Sobre o Resgate e Venda da Águia Nazista Recuperada do Naufrágio do Encouraçado Alemão Almirante Graf Spee no Uruguai - Artigo
Artigo


Texto 1:
O governo do Uruguai deve vender uma imensa águia nazista de bronze, resgatada de um navio de guerra da época da Segunda Guerra Mundial, decidiu um tribunal uruguaio nesta sexta-feira (22/06).
A águia de quase 350 quilos com uma suástica sob suas garras era parte da popa do encouraçado de batalha alemão Almirante Graf Spee, que foi afundado na costa do país sul-americano no começo da Segunda Guerra Mundial.
Por anos, o símbolo do Terceiro Reich tem sido objeto de controvérsia em torno de reivindicações alemãs de propriedade e objeções contra a peça ser exibida em público ou vendida.
A corte do Uruguai decidiu que a águia, que está armazenada em caixa de madeira num depósito naval, deve ser leiloada dentro de 90 dias, e os lucros, divididos entre os investidores do projeto que recuperaram a relíquia do fundo do Rio da Prata.
Segundo o jornal uruguaio El País, no passado, houve ofertas entre 9 milhões e 59 milhões de euros (39 milhões a 256 milhões de reais) pelo objeto histórico.
Anteriormente, a Alemanha já havia dito ser contra a comercialização de quaisquer símbolos do regime nazista, mas apoiaria a apresentação da águia dentro de um contexto histórico apropriado, como num museu.
Investidores privados com o apoio do governo do Uruguai realizaram trabalhos de resgate em 2004 para remover o pesado cruzador do Rio da Prata, já que o naufrágio representava um perigo para as rotas de navegação.
Em 2006, mergulhadores contratados pela família Etchegaray, que está por trás do projeto, descobriram a águia. Ela foi brevemente exposta em Montevidéu após ser restaurada. Posteriormente, foi levada ao depósito depois que a Alemanha protestou contra a exibição de "parafernália nazista".
O Graf Spee afundou vários navios mercantes aliados no Atlântico Sul antes que dois cruzadores britânicos e um da Nova Zelândia o interceptassem e danificassem durante a Batalha do Rio da Prata, que começou em 13 de dezembro de 1939.
Em seguida, o capitão Hans Langsdorff manobrou o navio para o porto de Montevidéu, onde foram lhe concedido três dias para remover marinheiros feridos e mortos. Ele então ordenou que o navio fosse afundado no estuário ao largo da costa, para impedir que os aliados tivessem acesso à sua tecnologia.
Os direitos sobre os destroços foram comprados em 1940 do governo alemão por espiões britânicos usando uma empresa de fachada uruguaia, para avaliar a tecnologia e o design de última geração do navio.
Em 1973, o Uruguai emitiu um decreto reivindicando a propriedade de todos os naufrágios em suas águas.
Texto 2:
O Uruguai enfrenta um delicado problema que evoca os tempos da Segunda Guerra Mundial: como vender uma águia de bronze que pertenceu a um encouraçado nazista?
A questão agora está sendo debatida, depois que a justiça uruguaia ordenou que o Estado se desfaça da peça — que tem uma suástica sob as garras do pássaro —, para pagar a quem a extraiu do fundo do Rio da Prata.
O emblema pertencia ao Admiral Graf Spee, um sofisticado navio de guerra do Terceiro Reich afundado na Baía de Montevidéu após uma batalha com navios britânicos em 1939.
Para o governo uruguaio, a questão tornou-se mais pesada do que as três toneladas que a escultura de bronze e as asas estendidas marcam na balança.
Tanto a Alemanha quanto as organizações judaicas alertam que existe o risco de que o símbolo vá a leilão e contribua para exaltar o nazismo.
"Alemanha e Uruguai compartilham o interesse de que o objeto não seja leiloado e, portanto, não seja usado incorretamente para glorificar o regime nazista", disse uma fonte oficial do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha à BBC Mundo.
Mas, para entender como se chegou a essa situação, é preciso voltar no tempo.
A Batalha do Rio da Prata, que ocorreu no Graf Spee em 13 de dezembro de 1939, foi um dos primeiros duelos navais entre a Alemanha e o Reino Unido na Segunda Guerra Mundial.
Foi também a única batalha daquele conflito bélico em águas latino-americanas.
O veloz navio alemão, um "encouraçado de bolso" com seis canhões de 280 milímetros, cruzava o Atlântico Sul caçando navios aliados quando três cruzadores (navios de guerra) britânicos o avistaram e enfrentaram perto de Punta del Este, no litoral sul do Uruguai.
Após intensos combates que ceifaram mais de cem vidas, o Graf Spee foi afundado na baía de Montevidéu por ordem de seu próprio capitão, Hans Langsdorff, que temia que os britânicos se apoderassem de sua tecnologia.
Dias depois, Langsdorff suicidou-se em Buenos Aires.
O navio, com sua águia de bronze com mais de dois metros de altura ainda na popa, permaneceu no fundo do Rio da Prata por 67 anos, até que uma empresa privada recuperou a escultura em 2006.
A tarefa foi realizada com "visibilidade zero e risco muito alto devido ao ferro retorcido do navio, que se partiu em dois", diz Alfredo Etchegaray, um profissional de relações públicas uruguaio e organizador de eventos, que promoveu a missão com seu irmão após um acordo com o Estado de seu país.
Junto com a águia, porém, surgiram problemas inesperados.
Etchegaray queria leiloar a peça, mas as autoridades uruguaias na época congelaram os planos por suspeitas de que o certame poderia atrair simpatizantes do nazismo.
Após ficar um mês exposta em um hotel em Montevidéu, a águia foi mantida em um complexo militar sob custódia da Marinha uruguaia.
A disputa foi à Justiça e um tribunal de apelações do Uruguai confirmou em 24 de dezembro uma decisão de que o Estado deve vender a escultura e entregar metade do dinheiro obtido aos resgatistas privados, com base no contrato entre as partes.
O governo uruguaio ainda pode levar o assunto ao Supremo Tribunal de Justiça, e o Ministério da Defesa do país antecipa que "certamente se recorrerá" da sentença.
"Ainda há um longo caminho a percorrer", disse uma fonte da pasta à BBC Mundo. "A posição do governo é garantir por todos os meios que isso não leve de forma alguma a qualquer tipo de culto nazista."
Mas Carlos Rodríguez Arralde, advogado de Etchegaray, diz que "chama a atenção" que ninguém do Estado uruguaio tenha se comunicado com eles em busca de uma solução.
"Se [o Estado] não chegar a um acordo conosco, ele tem que vender as peças", diz.
Seu cliente diz que, em um leilão internacional com diferentes licitantes, ele acredita que poderiam ser obtidos cerca de US$ 50 milhões (R$ 270 milhões) pela águia.
Com a confirmação da decisão da Justiça uruguaia, nas últimas semanas ressurgiram as preocupações sobre o que acontecerá com o antigo emblema do Graf Spee.
Objetos desse tipo têm três destinos possíveis, diz Ariel Gelblung, diretor para a América Latina do Simon Wiesenthal Center, uma organização judaica global de direitos humanos que investiga o Holocausto e o ódio em contextos históricos e contemporâneos.
Uma possibilidade é que alguém queira ter a peça trancada em casa, explica. Outra, que sirva para expor os danos causados ​​pelo regime nazista. Segundo o especialista, nenhuma dessas alternativas seria censurável.
"A terceira [opção é que comprem] para reivindicar o que aconteceu. Esse caso acreditamos estar no âmbito criminal e essa é a preocupação", diz Gelblung.
No entanto, um empresário argentino radicado no Uruguai expressou outra motivação para adquirir a águia nazista: destruí-la completamente e evitar que se tornasse objeto de culto.
"Assim que a tiver em meu poder, imediatamente a explodirei em mil pedaços", disse Daniel Sielecki ao jornal Correo de Punta del Este. "Cada peça resultante da explosão será pulverizada."
Etchegaray, por sua vez, traça um "plano B" diferente para a venda: destinar a águia a um memorial pela paz em Punta del Este, com uma tela no lugar da suástica, que exiba imagens dos tempos da guerra.
Mas ele defende que, além de um consenso entre as partes, isso exigiria uma indenização milionária para os indivíduos que recuperaram a escultura, incluindo parentes do falecido mergulhador Héctor Bado.
"Juntando um valor próximo a US$ 10 milhões [R$ 54 milhões], tudo pode ser resolvido", diz Etchegaray. "Tenho três filhos adotivos e dois filhos meus. Tenho a responsabilidade de deixar a eles pelo menos o suficiente para pagar seus estudos."
Texto 3:
Em 2006, o mergulhador uruguaio Héctor Bado encontrou, no fundo do Rio da Prata, os destroços do couraçado alemão Graf Spee, afundado no início da Segunda Guerra Mundial pelo seu próprio comandante, nos arredores do porto de Montevidéu.
Financiado por dois empresários locais, os irmãos Alfredo e Felipe Etchegaray, ele, então, sacou dos restos do naufrágio a parte mais emblemática daquele histórico navio, na época o mais poderoso da Marinha Alemã: uma grande águia feita de bronze, com as asas abertas e a suástica nazista presa em suas garras, perto de 400 quilos de peso, que decorava a proa do casco do couraçado.
Começava ali uma novela, que, até hoje, quase duas décadas depois, ainda não terminou — e que teve um novo capítulo na semana passada, quando o atual presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, anunciou um infeliz projeto, que ele mesmo havia concebido: derreter a águia e transformá-la na escultura de uma pomba, símbolo universal da paz.
O que, aos olhos do presidente uruguaio, pareceu ser uma boa solução para o incômodo objeto, que remete diretamente ao nazismo (e que, há nove anos, repousa dentro de uma caixa, em um depósito da Marinha Uruguaia, após o governo ter confiscado a peça dos seus descobridores, ao cabo de uma longa disputa judicial), caiu feito uma bomba entre historiadores, acadêmicos, museólogos e até membros da própria coalização política que dá apoio ao atual governo do Uruguai — sem falar no empresário Alfredo Etchegaray, que financiou o resgate da polêmica peça, mas que teve que entregá-la ao governo uruguaio, por determinação da justiça, e nunca recebeu um centavo por isso.
"Derreter aquela peça histórica para criar uma imagem artística é um completo absurdo", revoltou-se o empresário, ao saber da proposta do presidente — por quem, no entanto, ele diz ter "muita consideração". "É como retirar um bloco de pedra do Coliseum de Roma para fazer uma estátua de arte moderna".
A gritaria foi tamanha que, apenas dois dias após anunciar o seu plano — que já tinha até um artista plástico contatado para executar a obra —, o presidente do Uruguai voltou atrás.
"Uma esmagadora maioria não concorda com o projeto, e, se queremos a paz, a primeira coisa é buscar a unidade. Reafirmo que era uma boa ideia, mas um presidente precisa saber ouvir e representar o povo", disse Lacalle Pou, visivelmente constrangido com a situação.
Com isso, voltou à estaca zero o destino que será dado à controversa imagem, que, desde que foi retirada do navio afundado, virou uma dor de cabeça para o governo uruguaio, que, aparentemente, não sabe o que fazer com ela.
"Eu sei", diz Alfredo Etchegaray. "O lugar águia do Graf Spee é em um museu, já que é uma peça histórica. Sempre defendi isso, mas nunca fui ouvido pelos governantes do meu país. Temos que instruir, não destruir nossa História. Não podemos mudar o passado, mas podemos melhorar o futuro. As próximas gerações precisam saber o que foi o nazismo, e essa águia simboliza o que foram aqueles anos sombrios", diz o empresário, que garante ter gasto uma pequena fortuna para financiar o resgate da peça e, por isso, exige sua parte.
"O governo do Uruguai tem que honrar o contrato que assinou conosco na época do resgate. Ele previa que a águia seria enviada a um museu ou vendida para uma entidade cultural, e nós teríamos direito a metade do que ela vale", diz Etchegaray, tocando no ponto central da questão: a compensação financeira que ele sempre alegou ter direito de receber — e que o governo uruguaio desconversa, afirmando que o contrato não foi cumprido integralmente, porque apenas as partes do navio que interessavam ao empresário foram removidas, e não todos os escombros, que até hoje atrapalham a navegação nas imediações do porto da capital uruguaia.
E quanto vale a águia de bronze do Graf Spee?
"Difícil dizer, porque é um objeto histórico, com valor incalculável", exagera o empresário. "Mas estimo uns 60 milhões de dólares", diz Etchegaray, que sempre foi contestado pelo governo uruguaio, tanto no direito que alega ter sobre 50% do valor da peça, quanto no que diz que ela vale.
Nove anos atrás, Etchegaray conseguiu uma vitória parcial no caso, quando a justiça uruguaia determinou que a águia fosse leiloada, e parte do dinheiro arrecadado fosse destinado aos financiadores do seu resgate (o mergulhador Héctor Bado, que achou o objeto, morreu anos atrás, também sem nada receber por ele).
Mas, amparado na gritaria de entidade judaicas — e também do governo da Alemanha —, que temiam que a peça fosse arrematada por simpatizantes do regime nazista, o governo uruguaio recorreu da decisão, e a Suprema Corte do país decidiu que a polêmica peça passaria, então, a ficar sob a guarda do Estado, situação que permanece até hoje.
E sem nenhuma solução à vista, a não ser a destrambelhada proposta do presidente Lacalle Pou, de derreter a peça e transformá-la em uma "pomba da paz".
"Se querem fazer um símbolo de paz, que usem qualquer material, não o bronze da águia do Graf Spee, que é um objeto histórico", argumenta Etchegaray, que, enquanto esteve em poder da peça, chegou a colocá-la em exibição em um hotel de Montevidéu, de onde foi retirada, após a decisão da corte uruguaia.
Desde então, a polêmica imagem jaz em uma caixa de madeira, em um depósito, sob custódia da Marinha uruguaia, sem que ninguém do governo saiba o que fazer com ela.
Com sua proposta da semana passada, o presidente Lacalle Pou tentou livrar da batata quente que tem nas mãos, mandando, na prática, destruir o objeto.
Mas o plano fracassou.
Aguarda-se, agora, os próximos capítulos de uma novela que vem se arrastando desde que a imagem símbolo do couraçado Graf Spee foi resgatada do fundo do Rio da Prata, 67 anos após o teatral naufrágio do então principal navio de Hitler na Segunda Guerra Mundial pelo seu próprio comandante, o oficial Hans Langsdorff, que se matou em seguida, para que os segredos do navio não caíssem em mãos inimigas.
Nota do blog: Minha visão é que essa peça tem que ir para um museu, igual milhares de outras peças desse tema. Até porque destruí-la não vai mudar o que aconteceu, penso que deve ser conservada e ser objeto de estudo, para que as próximas gerações saibam o que aconteceu e não repitam os mesmos erros.

Sociedade do Açúcar - Artigo

 


Sociedade do Açúcar - Artigo
Artigo


Meu avô me levava sempre em suas visitas de corregedor às terras de seu engenho. Ia ver de perto os seus moradores, dar uma visita de senhor nos seus campos. O velho José Paulino gostava de percorrer a sua propriedade, de andá-la canto por canto, entrar pelas suas matas, olhar as suas nascentes, saber das precisões de seu povo, dar os seus gritos de chefe, ouvir queixas e implantar a ordem. Andávamos muito nessas suas visitas de patriarca.
As terras do Santa Rosa andavam léguas e léguas de norte a sul. O velho José Paulino tinha esse gosto: o de perder a vista nos seus domínios. Gostava de descansar os olhos em horizontes que fossem seus. Tudo o que tinha era para comprar terras e mais terras. Herdara o Santa Rosa pequeno, e fizera dele um reino, rompendo os seus limites pela compra de propriedades anexas. Acompanhava o Paraíba com as várzeas extensas e entrava de caatinga adentro. Ia encontrar as divisas de Pernambuco nos tabuleiros de Pedra de Fogo. Tinha mais de três léguas, de estrema a estrema. E não contente de seu engenho possuía mais oito, comprados com os lucros da cana e do algodão. Os grandes dias de sua vida, lhe davam as escrituras de compra, os bilhetes de sisa que pagava, os bens de raiz, que lhe caíam nas mãos. Tinha para mais de quatro mil almas debaixo de sua proteção. Senhor feudal ele foi, mas os seus parias não traziam a servidão como um ultraje. (José Lins do Rego, Menino de engenho, p. 65-66 e 103-104)
Começo pedindo licença aos leitores para iniciar este comentário com uma citação um tanto longa, mas que oferece a oportunidade de refletirmos sobre a sociedade açucareira colonial, e sobre o papel desse doce produto para a história mais antiga do Brasil. José Lins do Rego (1901-1957), em seu romance de caráter autobiográfico, Menino de engenho (1932), narrava as peripécias de um menino criado num engenho do Nordeste brasileiro no início do século XX. Impressiona, no vocabulário de sua descrição da fazenda e do avô, o predomínio de certo ‘tom colonial', no qual o "velho" José Paulino era uma personificação do antigo senhor de engenho (atualizado na figura de um coronel), dono de "domínios" que se estendiam por "léguas e léguas", e "tinha para mais de quatro mil almas debaixo de sua proteção". Essas descrições, do engenho, seus personagens e da vida cotidiana dão o tom e tecem a trama do romance, remetendo a um passado colonial ainda muito presente na virada do oitocentos para o novecentos, principalmente no interior e no Nordeste, no qual o açúcar ainda dá vida a uma parcela da sociedade que depende dele.
As atividades ligadas ao açúcar praticamente definiram a economia colonial e nortearam os estudos sobre a história desse período. A vida cotidiana girava em torno dos engenhos e do modo de viver que emanavam, e os vínculos sociais foram se definindo nesses espaços, nos quais público e privado se misturavam, e que agregavam colonizadores, colonos e colonizados em torno das relações de trabalho.
Os escritos historiográficos do século XIX, elaborados por cronistas, letrados e historiadores, por fim, e os escritos dos viajantes e exploradores, desde o XVIII, apontam para a formação de uma sociedade do açúcar nos primeiros séculos do período colonial, ou da história mais antiga do Brasil. Apesar de os historiadores apresentarem uma narrativa linear do tempo e uma periodização que privilegia os acontecimentos políticos, na história da colônia imperavam os engenhos como estruturas econômicas, e os senhores, regendo a vida nas vilas e cidades que surgem em torno das unidades açucareiras. É o açúcar que dá o primeiro grande impulso para a ocupação efetiva e colonização do Brasil, sendo o principal produto no comércio com a metrópole durante mais de um século, não perdendo, entretanto, sua importância no cenário econômico mesmo em épocas de prosperidade de outras culturas e atividades, como o período aurífero e do café, por exemplo.
É durante a primeira metade do século XX que os estudos sobre a colônia ganham fôlego e novos olhares. É a partir de trabalhos de historiadores como Capistrano de Abreu e Caio Prado Júnior que a história colonial começa a ser escrita em outro estilo de narrativa, menos linear e política, e mais temática e com ênfase na esfera socioeconômica.
Essa historiografia, representada aqui pelos trabalhos de Caio Prado, aplicou o conceito dos ciclos econômicos ao período colonial, no qual estes se sucederiam e imprimiriam o sentido da colonização e das relações comerciais entre colônia e metrópole. Prado ainda sistematizou os estudos sobre o sistema de agricultura colonial definido como plantation, ancorado nos grandes latifúndios monocultores explorados por mão de obra escrava, principalmente de origem africana, descrevendo um ‘modo de produção colonial'. Em contraponto, por volta de meados do novecentos, novos olhares sobre a sociedade açucareira colonial permitiram interpretações mais diversas, de cunho cultural e sociológico, que ficaram célebres entre os estudos brasileiros, como as encontradas na vasta obra de Gilberto Freyre. Esse autor se ocupou em descrever e analisar a vida dos habitantes do engenho, senhores e escravos, suas relações de poder e negociação, e com o meio, produzindo uma interpretação do cotidiano e da cultura surgida naqueles espaços. Essa corrente de pensamento acabou influenciando como muitos brasileiros passaram a se ver, interpretar sua cultura e expressá-la, de certa forma refletida no Menino de engenho, de José Lins do Rego, livro dedicado, entre outros, ao próprio Gilberto Freyre.
Mais recentemente, dois historiadores que deram significativas contribuições para uma história do açúcar no Brasil foram Evaldo Cabral de Mello e Stuart Schwartz, tratando respectivamente de Pernambuco e Bahia. No primeiro caso, Mello analisa a época da dominação holandesa no Nordeste e avalia o impacto da invasão e dos tempos de guerra sobre a "açucarocracia" de Pernambuco.
As guerras holandesas foram inegavelmente guerras do açúcar, não apenas no sentido, que é o geralmente posto em relevo, de guerras pelo açúcar, isto é, pelo controle das suas fontes brasileiras de produção, mas também no sentido de guerras sustentadas pelo açúcar, ou antes, pelo sistema socioeconômico que se desenvolveu no Nordeste com o fim de produzi-lo e exportá-lo para o mercado europeu.
O trabalho pioneiro de Schwartz dá, ao mesmo tempo, um panorama bastante completo do engenho como estrutura produtiva e das diversas etapas que envolviam a fabricação do açúcar, desde o plantio da cana até o comércio, e uma análise do dia a dia e da dinâmica interna das propriedades açucareiras, na perspectiva dos senhores, mas também dos trabalhadores livres e escravos, tratando de temas como escravidão e família. E para além, identifica as raízes das relações de dominação, dependência e violência na sociedade brasileira desde os primórdios da ocupação do território, entre senhores, escravos e homens livres pobres. Schwartz recupera um longo debate na historiografia brasileira, entre marxistas e culturalistas, acerca da natureza das relações econômicas no mundo dos engenhos, se mais marcada por uma orientação capitalista ou mais arcaica, remetendo às estruturas feudais. Embora não rompa abertamente com os grandes modelos explicativos na sua definição da sociedade do açúcar, avança ao evidenciar que as relações entre os diversos mundos - do governo, do trabalho e da desordem - no interior das terras dos engenhos eram muito mais complexas do que o conceito de modo de produção podia dar conta de explicar. E por meio de extensa pesquisa e debate com a historiografia brasileira e estrangeira sobre o açúcar, Schwartz reforça a ideia de que a ordem senhorial vigente ao longo do oitocentos tem sua gestação nessa sociedade que se cria e toma forma em torno das grandes fazendas de cana-de-açúcar e dos engenhos. É no seio da sociedade do açúcar que as hierarquias se definem, que as dependências se afirmam, que o poder dos senhores se consolida, sobre escravos, agregados e sobre a família. E é a partir também desta esfera de poder que os lavradores alçam voos mais altos e começam a integrar os quadros da administração e política coloniais, advogando em causa própria, reforçando e perpetuando o poder e a influência das famílias mais tradicionais da terra.
Em torno desses senhores de engenho, mais tarde senhores de terras e escravos, gravitam a família, os trabalhadores livres pobres assalariados, os pequenos produtores, os agregados, os escravos e até mesmo os párocos, enfim o mundo da casa, do trabalho e também da desordem. É o embrião da classe senhorial que consolidará o Estado e o Império brasileiros em meados do século XIX, processo estudado por Ilmar Mattos no Tempo saquarema. E como Schwartz bem define: "O engenho era um espelho e uma metáfora da sociedade brasileira".

Volkswagen TL / Teste da Revista Quatro Rodas, Novembro de 1970, Brasil










Volkswagen TL / Teste da Revista Quatro Rodas, Novembro de 1970, Brasil
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Nota do blog: Publicado na edição N. 124 de Novembro de 1970.

Cartaz de Propaganda Política "The Oldest of Gods", União Soviética / Atual Rússia


 



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Cartaz de Propaganda Política "Don't Let Greedy Priests and Kulaks Into Our Kolhoz!", União Soviética / Atual Rússia


 

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Cartaz de Propaganda Política "Separatist - Kulak Puppet", 1925, União Soviética / Atual Rússia


 

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Cartaz de Propaganda Política "Comrades-Miners!", 1933, União Soviética / Atual Rússia


 

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Cartaz de Propaganda Política "For the Bolshevik's Mechanised Donbass", 1930, União Soviética / Atual Rússia


 

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Cartaz de Propaganda Política "Donbass Is Reborn!", Rússia


 

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