sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Compromisso Constitucional, Rio de Janeiro, Brasil (Compromisso Constitucional) - Aurélio de Figueiredo


Compromisso Constitucional, Rio de Janeiro, Brasil (Compromisso Constitucional) - Aurélio de Figueiredo
Rio de Janeiro - RJ
Museu da República, Rio de Janeiro, Brasil
OST - 330x257 - 1896


A era republicana, que se inicia em 1889 com marechal Deodoro da Fonseca como presidente promulgado, se consolida quando ele é eleito indiretamente em 1891 pelos parlamentares da Assembleia Constituinte. Os legisladores também formulam a primeira Constituição do novo regime.
É a Constituição de 1891 que está acima do novo presidente e à qual ele precisa jurar obediência —sua interpretação não deve mudar conforme os anseios do momento.
A cena, a primeira do tipo, foi registrada em "Compromisso Constitucional", um icônico óleo sobre tela, de 3,30 m de altura por 2,57 m de largura, pintada pelo republicano e abolicionista Aurélio de Figueiredo (1856-1916). O artista também pintou “O Último Baile da Ilha Fiscal”, que retrata o evento luxuoso às vésperas da derrubada do Império.
“A obra tem um simbolismo muito forte. Está representado ali o início da República, é quando a República está sendo constituída no Brasil, quando o presidente jura a Constituição. Isso tem uma importância extraordinária”, explica Mário Chagas, diretor do Museu da República, no Rio de Janeiro, onde a pintura fica exposta.
A tela leva o mesmo nome da cerimônia que se repete a cada novo mandato presidencial desde então. “Compromisso Constitucional” foi pintado cinco anos depois da Proclamação para ornar a nova sede do governo e deixar registrado o momento para a posteridade.
O novo regime precisava de novos discursos, incluindo obras de arte.
Com o fim do Império, o governo passou para o Palácio de Nova Friburgo, chamado mais tarde Palácio do Catete e atual Museu da República, no Rio.
A cena de 1891, porém, assim como a Assembleia Constituinte, ocorreu no Palácio de São Cristóvão, atualmente Museu Nacional, destruído em incêndio em 2018.
Mais de um século depois de sua elaboração, a pintura do paraibano Aurélio de Figueiredo segue exercendo fascínio porque está repleta de símbolos a serem decifrados.
As percepções do artista foram colocadas sutilmente em detalhes que vão desde a figura do taquígrafo, que olha para fora da tela em direção a quem observa o desenho, passando pela posição das flores até a altura em que estão desenhadas as figuras históricas.
“É sintomático que o artista pinte as flores em frente ao Floriano Peixoto e não ao Deodoro da Fonseca. Eles disputaram o poder entre si. De modo delicado, este conflito está colocado na tela”, diz Chagas, que também é professor de museologia na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
Foram duas votações separadas, para presidente e vice. Tanto Deodoro da Fonseca como Floriano Peixoto disputaram a Presidência. Fonseca recebeu 129 votos e Peixoto, apenas 3. Porém, para vice, Peixoto foi escolhido com 153 votos, contra os 57 do almirante Eduardo Wandenkolk, o preferido de Fonseca.
As flores, segundo o pesquisador, são camélias e significam tanto o abolicionismo como o republicanismo. Elas também aparecem em frente ao taquígrafo Caetano da Silva. “Ele olha para fora do quadro, como quem olha para o futuro. O taquígrafo é quem registra a memória para o porvir”, explica o diretor.
 Os personagens históricos formam um círculo no quadro. É simbólico, entretanto, que a figura de mais destaque ali não seja Deodoro da Fonseca, mas Prudente de Moraes. Ele está posicionado acima dos demais.
Moraes era o presidente da Assembleia Constituinte, ou seja, conduziu os trabalhos de elaboração da Constituição republicana.
“Podemos observar um jogo de poder. Moraes presidiu a Assembleia, mas, mais do que isso, foi eleito o primeiro presidente civil do Brasil na eleição direta, de 1894. É para monumentalizar a cena na nova sede do seu governo que a pintura foi encomendada”, explica Chagas.
Desde a década de 1990 que o pesquisador investiga a pintura, dando sequência para um trabalho iniciado pela professora Gilda Lopes.
Em trabalho publicado em 2018, Chagas identificou o próprio pintor em um autorretrato —ele não estava presente na sessão—, suas filhas e esposa. As mulheres, vale lembrar, foram excluídas do direito ao voto pela Constituinte, mas estão presentes na pintura.
O irmão do artista e seu professor, Pedro Américo, um dos principais artistas do período imperial e deputado constituinte pela Paraíba, foi desenhado ao seu lado. A pintura tem um único negro, o abolicionista e deputado de São Paulo, Francisco Glicério de Cerqueira Leite.
O livro que Deodoro da Fonseca segura, com a capa verde escura, é a Constituição de 1891, cujo original é parte do acervo do Museu da República.
O pesquisador chama a atenção para o fato de que todos os votos que elegeram o presidente indiretamente cabiam em uma urna do tipo papeleira, que também está no museu. Hoje, compara, são milhões de votos processados em urna eletrônica.
Além disso, o Legislativo agora é mais diversificado do que o registrado na pintura. “Se fosse hoje, teria mais negros, mulheres, homossexuais. Esse círculo teria outra representação”, diz Chagas.

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