sábado, 25 de janeiro de 2020

O Escândalo da Água Contaminada no Rio de Janeiro - Marcos Nogueira


O Escândalo da Água Contaminada no Rio de Janeiro - Marcos Nogueira
Artigo


Achei ridículo quando minha irmã sugeriu que trouxéssemos água mineral de São Paulo para o Rio. Viemos de carro para buscar as tralhas que deixei no apartamento do Ivan Finotti –colega de Folha que aprecia se bronzear, em sunga pink de fita isolante, no Piscinão de Ramos.
Deveria tê-la escutado. O desabastecimento de água potável é um problema real no Rio de Janeiro.
A água que sai das torneiras é turva e tem cheiro de bunda –como descreveu, também na Folha, o colunista carioca Anderson França. A hipótese que o próprio governo defende para o ocorrido é o alto teor de toxinas produzidas por cianobactérias.
Tais bactérias proliferam quando há esgoto na água (que é posteriormente tratada). Já aconteceu na Guarapiranga, em São Paulo, mas nada que se assemelhasse ao barro que sai dos canos cariocas.
Apesar de o governo negar riscos à saúde da população, há relatos de gente que adoeceu. O próprio Ivan passou a semana com piriri. Agora ele só bebe Gatorade, Coca-Cola e coisas do gênero. Porque falta água mineral no mercado.
Os cariocas lotam carrinhos de supermercado com fardos de água mineral. As garrafas logo somem, sobrando nas gôndolas apenas a água importada da Noruega, vendida a R$ 44.
A pestilência tornou impraticável a “água da casa”, água filtrada que deve ser servida gratuitamente aos clientes de restaurantes, por determinação de uma lei municipal. Como a obrigação legal persiste, os estabelecimentos ainda oferecem jarros de líquido turvo, com aparência de água de coco.
Pior: a praga afeta todo o gelo feito com água vinda da estação de tratamento do Guandu, que abastece o município do Rio. Esta é uma cidade dependente do gelo. Na caipirinha, no suco, na testa e na nuca para aliviar o calor implacável. Os sacos de gelo circulam por toda parte em camionetas e bicicletas.
Ainda que o indivíduo consiga se hidratar exclusivamente com água mineral, é insano imaginar que alguém vá cozinhar arroz e feijão “à la Minalba”. O meu prato-feito predileto em Ipanema –não vou dizer qual é, pois os caras não têm culpa alguma– está com gosto de lodo.
É o lodo do rio Guandu. Um rio que, segundo reportagem do jornal O Globo, recebe diariamente 22 piscinas olímpicas repletas de esgoto bruto.
Já havia percebido o lodo num macarrão que eu mesmo cozinhei. Na hora, pensei que um dos temperos secos talvez estivesse velho demais. Depois vim a sentir a mesma inhaca ao escovar os dentes. E no banho.
O único jeito de escapar da comida lamacenta no Rio é optar por pratos que não usem água na preparação. Esqueça pão, pizza, cozido, feijoada, risoto, purê, sopa, qualquer coisa com molho.
Invista no bife com fritas. No frango assado com farofa. No camarão ao alho e óleo. Depois da sobremesa –chocolate industrial–, lembre-se de passar o cafezinho com água norueguesa.

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