segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Maserati Ghibli, Itália - Jeremy Clarkson

 


Maserati Ghibli, Itália - Jeremy Clarkson
Fotografia


Eu só assisti ao brilhante filme francês Intocáveis porque, na cena de abertura, os personagens principais eram vistos – e, mais importante, ouvidos – rasgando Paris em um Maserati Quattroporte. Ao final, tive certeza de três coisas: que o espírito humano é fundamentalmente maravilhoso, que a bondade é a espinha dorsal de tudo que importa e que eu precisava ter um grande Maserati preto de quatro portas.
Eu sempre quis um Maserati. Por muitas razões. Porque o Maserati do famoso guitarrista Joe Walsh chegava a quase 300 km/h ou por causa do 3500 GT que eu via no meu bastante folheado Ladybird Book of Motor Cars. E por causa do Citroën SM.
Meu pai nunca quis um Maserati, mas ele sonhava em empregar um sueco que tinha um. Ele falava tanto nisso que, de acordo com as lendas da família Clarkson, eu aprendi a falar Maserati antes de dizer mamãe. Lá no fundo, eu queria um Maserati mais do que um Lamborghini ou uma Ferrari. Essas duas modernidades pretensiosas são meio novo-rico, um pouco premeditadas. São carros vermelhos para pessoas com bronzeado laranja. O Maserati, no entanto, já está entre nós há uma centena de anos.
O problema é que, desde que eu cheguei à idade em que podia tirar a carteira de motorista, a Maserati não fabricou um único carro bom. Claro, o Quattroporte que rasgou por Paris em Intocáveis era uma beleza, e seu motor V8 gemia como um lobisomem que tivesse prendido a pata em uma armadilha para ursos. Mas não importa que tipo de câmbio escolhesse, você podia tirar umas férias rápidas no tempo em que ele trocava de segunda para terceira. E a desvalorização era terrível. E tudo parecia ou passava a sensação de estar frouxo depois de mais ou menos um ano. Você podia querer muito, mas não ia comprar esse carro. A não ser que fosse um completo idiota.
É a mesma história com o 3200 GT, o Kyalami, o Quattroporte original, o Merak ou o Bora. E, como a Maserati gosta de batizar seus modelos com nome de ventos, ela deveria ter chamado o Biturbo de “Flatulência”.
Na verdade, você tem de voltar a 1967 para encontrar o último Maserati realmente bom, de classe mundial: o Ghibli. O que é conveniente, porque ela nos conduz ao carro que você vê nestas fotos: o novo Ghibli. Eu fiquei meses na expectativa de dirigi-lo, mas, quando a oportunidade chegou, não foi tão bom quanto eu esperava.
Antes de tudo, tenho de dar a ré para sair para a rua, o que significa selecionar Reverse e, oops, isso é Drive e, não, Jeremy, você empurrou a alavanca demais para a frente, e colocou o carro de novo em Park. Com cuidado… Não! Isso é Drive de novo! Suavemente… Neutro … droga!. Voltou para Park. Como é manhoso esse câmbio automático…
Mas logo estamos nos movendo para trás e os sensores de estacionamento estão apitando como loucos. Todos os quatro cantos desse automóvel estão convencidos de que eles estão prestes a bater em alguma coisa. E a cada centímetro eles ficam mais e mais insistentes. E é difícil desligá-los. Na verdade, é difícil desligar qualquer coisa, porque a Maserati escolheu um visual minimalista, clean, o que significa colocar a maioria dos botões na central multimídia. O que quer dizer que, para fazer qualquer coisa, você tem de navegar por 42 submenus.
Nesse ponto, eu nem saí da frente de casa e o Ghibli está sendo irritante. E também está me deixando com frio. O aquecimento é tão fraco que você tem de fazer de tudo para mudá-lo. Ajuste a temperatura para a mais alta, coloque a ventilação no máximo e abra todas as saídas de ar, e só então você não vai morrer de hipotermia no carro.
Bem, depois de tudo, vestindo luvas quentes, chapéu e um cachecol, eu enfim chego à estrada principal, pensando por que todos os componentes são mantidos juntos por um comitê que precisa se reunir até para decidir se o aumento de velocidade que você está exigindo é algo que o carro está preparado para entregar. A direção, o acelerador, o câmbio – tudo passa a sensação de vago.
Se você for realmente determinado, há uma potência considerável à disposição do motorista. Eu estou testando o modelo S, topo de linha, que vem com um motor V6 biturbo de 410 cv e uma velocidade máxima de 285 km/h. Não que você queira chegar a essa velocidade em um carro que é operado por um sindicalismo de engenheiros mecânicos.
E ele é bem grande. Por isso é que os sensores de estacionamento disparam a toda hora. Em um carro desse tamanho, sempre há algo por perto.
Há outras coisas que você pode achar irritantes. Existe uma única haste de comandos na coluna de direção, o que significa que, se você tentar ligar o limpador de para-brisa, acaba dando seta. Os controles do rádio estão na parte de trás do volante, onde você não pode vê-los, e à noite a tela de controle central fica brilhante demais ou desligada. Ah, e os freios são um pouco “tudo ou nada”.
Mas daí eu passo por uma daquelas lombadas bem altas e… quase não sinto nada! Em baixa velocidade, este carro anda como um antigo Jaguar XJ, o que significa que, em ruas esburacadas, ele é um sonho. Deixando de lado os bipes, obviamente. E, desconsiderando os bipes, ele é silencioso. Realmente silencioso.
Portanto, ele é confortável, prático e silencioso e, tenho de dizer, é também um lugar encantador para se sentar. Exceto pelos bipes. E, além de tudo, é um Maserati. O que quer dizer que você pode falar para sua esposa: “Vamos de Maserati hoje à noite?”, o que vai deixá-lo com uma tremenda sensação de aconchego. E isso é bom, porque você não terá calor quando estiver no carro – isso é certo.
E essa ia ser minha conclusão. Um grande emblema, mais uma vez colocado em um carro sem brilho. Mas daí eu vi o preço. Você pode comprar o modelo a diesel por menos de 50 000 libras (R$ 245 000). Meu S biturbo, com todas suas cantorias e acessórios, custa 63 760 libras (R$ 312 500). E isso é como oferecer uma caixa de bombons pelo preço de um chiclete.

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