Mercedes Benz S 500, Alemanha - Jeremy Clarkson
Fotografia
Ao longo dos últimos 50 anos, quase todos os avanços realmente importantes do automóvel estrearam no Mercedes-Benz Classe S.
A Renault nos deu botões de ajuste de volume na coluna de direção. A Chrysler, um furgão com bancos no interior. A Austin, o volante de direção quadrado. E a Lancia, o motor V4.
Enquanto isso, a Classe S foi usada como plataforma de lançamento para os freios antitravamento que funcionavam de verdade, ao contrário do sistema ABS do Jensen FF, que era precário.
O modelo serviu também para conhecermos o pré-tensionador dos cintos de segurança, o controle de estabilidade, o controle de velocidade de cruzeiro inteligente, o vidro do para-brisa laminado, o sistema de telefonia ativado por voz e a desativação de cilindros. Este carro sempre foi um espelho pelo qual podemos ver o futuro.
Desse modo, gostei de sentar ao volante da nova versão porque assim eu poderia saber o que um homem mortal encontraria em seu Vauxhall ou Peugeot em um prazo cinco anos. Será que haveria um sistema de ar-condicionado que reduzisse o processo de envelhecimento do motorista? Ou um laboratório médico, talvez, no qual fraturas simples poderiam ser corrigidas enquanto se dirige de volta para casa?
Não. Em vez disso o que se tem é um monte de coisas inúteis. É como se o projetista fosse uma loja de quinquilharias e colocasse tudo no carro.
Vamos tomar como exemplo o projetor de dados no para-brisa. Vemo-los em vários carros hoje, de modo que para tornar o Mercedes diferente eles resolveram exibir tudo o que é tecnicamente possível.
Velocidade, rumo do percurso, mapa de navegação por satélite, onde os tanques inimigos estão localizados, mísseis prontos para disparo, e o maior distraidor de todos, um destacado indicador do limite de velocidade que começa a piscar se você andar 1 milha por hora mais rápido do que as autoridades de trânsito acreditam ser a apropriada. É como estar dirigindo em meio a uma chuva de raios laser.
Claro que é possível personalizar tudo para o seu gosto ou necessidades pessoais, ou simplesmente desligar o equipamento, mas não dá tempo porque é preciso também desativar o sistema de saída da faixa que atua no volante caso o carro chegue perto da linha branca, e a funcionalidade de desligar/ligar motor nas paradas, o que significa que o motor de partida deve ser feito de diamante e liga de ósmio para simplesmente poder aguentar a incessante demanda em sua vida útil.
É imperativo desligar toda essa parafernália antes de sair com o carro, pois você terá um trabalho do diabo para achar os botões certos quando estiver dirigindo. Teve um momento em que mexi no interruptor para desligar o projetor de para-brisa e vi que era do freio de estacionamento. Isso surpreendeu o motorista do carro de trás.
Nessa mesma linha temos a alavanca seletora do câmbio. Como tem sido normal nos Mercedes grandes durante 2.000 anos, ela é montada na coluna de direção. Mas no novo classe S a manopla não tem formato próprio de uma alavanca grande. Ah, não.
Para fazer os estetas felizes, ela é idêntica à alavanca no lado oposto da coluna de direção, a das luzes e limpador de para-brisa. Com isso, toda vez que eu pretendi dobrar à esquerda coloquei o câmbio em ponto morto. Isso também surpreendia os motoristas que estavam no meu rastro.
Após apenas um curto período de tempo desenvolvi raiva deste novo carro e nem mesmo cheguei ao ponto de explorar o sistema de controle que é mostrado numa tela no meio do painel que é do tamanho do telão da Câmara dos Deputados. Definitivamente é impossível operá-lo com o carro em movimento, pois se você tentar é certo que você terá um acidente.
Este é um carro que não apenas estaciona sozinho, como também acha vagas. Ele pode se autoconduzir na cidade ou na autoestrada, pode “ler” a via à frente e se comportar como deve. Pode jogar uma luz forte no rosto de pedestres que estejam a ponto de ficar na sua frente; e pode esconder suas maçanetas de porta.
E tudo isso — além de muito mais — pode ser controlado e ajustado às suas necessidades, o que significa menus e submenus e sistemas eletrônicos tão complexos que operá-los todos seu chofer tem que ser mais brilhante do que o amado filho bastardo de Montgomery Scott e Bill Gates.
Sinto dizer que as notícias só pioram, porque o Classe S, de alguma maneira, não parece certo. Numa desesperada tentativa para ficar no lado certo da rigorosa legislação ambiental, os engenheiros partiram para olhar carro com um microscópio e uma lâmina de barbear cortando um grama aqui e alguns décimos lá.
Os resultados são admiráveis, porque mesmo que o Classe S seja visivelmente mais comprido do que o modelo anterior, ele agora pesa pouco mais de duas toneladas. Todavia, atrás do volante pode-se sentir o menor peso. Ele não parece frágil de maneira alguma, mas não é como um classe S deveria ser: sólido.
Não duvido nem por um segundo que em caso de acidente ele não lhe proteja como sua mãe, e isso é ótimo, mas eu gostaria de um carro que parecesse que o faria. E o Classe S não o faz. Ele parece...falso.
Felizmente, apesar disso, seu rodar não é nem um pouco ruim. No modo conforto — que outro modo se desejaria num carro desse? — ele desliza sobre ondulações e buracos de uma maneira nunca vista desde que a Citroën usou a suspensão hidropneumática. Tenho um Bentley Flying Spur que, numa comparação, parece um skate. O Mercedes é também assustadoramente silencioso graças ao uso de espuma acústica, que é outra maneira de dizer “bruxaria”.
Motor? Pouco importa. Ele terá um independente do modelo que você escolha para comprar. E ele terá sido calibrado para suavidade e para garantir que ele não derreta muitas geleiras na Groenlândia. Você terá também tração nas quatro rodas, o que, de novo, não diz nada. Não em um carro como esse.
Esterçamento nas quatro rodas? Sim, um que estava nas prateleiras da fábrica, assim ele o tem também, apesar de ele fazer ocupantes do banco traseiro enjoarem. Todavia, felizmente não é oferecido nos carros vendidos no Reino Unido.
Eu adoraria lhe contar como é dirigi-lo com esse sistema, mas eu não estava me concentrando realmente. O maior responsável por isso foi estar absorto no painel que me mostrava uma bola em 3D que vinha em minha direção e ficava verde quando eu tirava o pé do acelerador e se afastava ficando vermelha quando acelerava. Eu não tenho a menor ideia por quê.
Cheguei a tentar saber o que significava perguntando ao computador de bordo usando minha voz, mas ele pareceu não entender uma única palavra que eu dizia.
Claro que se você tivesse um carro desse — ou o dirigisse enquanto o dono estivesse sentado atrás — você se acostumaria com tudo isso da mesma forma que você se acostuma com um telefone Google em vez de um Apple. Ou com uma dor de dente. Mas não quero passar minha vida me acostumando com as coisas.
E com certeza não venderia o carro depois de cinco anos sem descobrir metade de seus talentos. Eu ia dizer que nesse ponto seria descobrir após cinco anos de casamento do que sua esposa gosta…
Mas eu não farei isso.
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