segunda-feira, 23 de março de 2020

Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o "Tiradentes" (Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o "Tiradentes") - José Wasth Rodrigues


Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o "Tiradentes" (Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o "Tiradentes") - José Wasth Rodrigues
Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, Brasil
OST - 156x98 - 1940


De início, mediante a leitura e interpretação desta imagem podemos inferir,
através de seus elementos icônicos (desenho da farda, brasão, espada, cabelo, falta de barba, etc), que a intenção é transmitir a noção de um discurso militar à figura de Tiradentes.
Nesse sentido, a pintura busca representá-lo em uma paisagem rústica em
que, a traços de pincel, é desenhado chão de terra, árvores, céu, uma pessoa
montada em um cavalo e ao lado, outro corcel sugerindo que este animal pertença ao Tiradentes idealizado por Wasth e, por fim, uma montanha. Todos estes elementos estão respectivamente em segundo, terceiro, quarto e quinto planos nesta obra. Dada a maneira como Tiradentes foi pintado, uma alternativa de leitura é que esta paisagem indica uma região que está em desenvolvimento sugerindo então, que precisa ser comandada ou inspecionada!
Situado em primeiro plano está desenhada a figura imagética de José
Joaquim da Silva Xavier delineado como um alferes disposto a lutar. A forma como foi pintado: a postura altiva desta personagem, a sua vestimenta (farda aguerrida nas cores em tom azul, vermelho, branco, amarelo e preto), incluindo a espada, o brasão, as botas e o chapéu, bem como o cabelo e a falta de barba, apresentam esta conotação militarista e de bravura. Dar a entender então, que esta personagem fora pintada como se estivesse num momento anterior a Inconfidência, portanto, está na condição de representante da Coroa Portuguesa. Neste contexto, esta pintura histórica:
[...] busca situar o inconfidente não como um representante popular, simples
alferes e pobre. Ao contrário, busca representá-lo como ‘homem elegante’,
‘bem trajado’, ‘membro da elite’, ‘membro de uma classe social privilegiada’,
‘um precursor do emblema da bandeira nacional, pela ‘ordem e progresso’
(VARTULI, 2006, p. 111).
Acrescenta-se a esta imagem adjetivos “que denotam o sentido de dirigente,
como líder, combatente, guerreiro” (VARTULI, 2006, p. 111). Assim sendo, a ideia perpassada é a de força, vigor e poder. Apesar desta pintura está representando um contexto anterior a Conjuração Mineira, estas qualidades citadas estão mais vinculadas ao contexto histórico e cultural da República e não ao período da vida de Tiradentes enquanto alferes.
Esta conjuntura republicana, “que, no Brasil só se constituiu em 1889, teve de
se dotar de novos símbolos políticos”. (JURT, 2012, p. 478). Neste período “os
Estados não mais se definiriam por meio de uma dinastia. Os novos Estados-nação, obrigados a criar um sentimento de pertencimento, serviram-se de toda uma série de instrumentos com esta finalidade.” (JURT, 2012, p. 471). Nesse sentido, “A recuperação da memória de Tiradentes avança com a difusão da ideia republicana” (NEVES, 1993, p. 69). Algo positivo para a arte, pois “as primeiras pinturas sobre o ‘patrono cívico da Nação brasileira’, foram realizadas apenas quatro anos depois da proclamação da República.” (NEVES, 1993, p. 77).
Carvalho (1990) afirma que a responsabilidade em retratá-lo desta maneira foi
passada a José Wasth Rodrigues, especialista em uniformes. Ele o pintou como alferes da 6ª Companhia do Regimento dos Dragões. O que se pode constatar com relação à habilidade artística de Wasth é que “Seus desenhos são tomados por uma obsessão em dissecar os detalhes do passado, minunciosamente, como numa lição de anatomia” (BRANDÃO, s.d. p. 2) e aliando isto ao fato dele ter sido “membro da
Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e [...] um dos primeiros a
estudar, sistematicamente, a história da indumentária, com publicações sobre trajes civis e militares” (BRANDÃO, s.d. p. 2), nos é permitido indicar que estes foram alguns dos aspectos que o levaram a constituir esta tela.
Desse modo, é observável que foi retratado aspectos da vida de Tiradentes
para compor esta obra, pois “Joaquim Xavier [...] Alistou-se em 1° de dezembro de 1775, diretamente no posto de Alferes, posição hierárquica intermediária entre o Tenente e o Cabo, hoje não mais existente e que equivaleria ao atual 2° Tenente” (NEVES, 1993, p. 37), sendo convocado para “O Regime de Cavalaria de Minas Gerais” (NEVES, 1993, p. 37). Deste modo, porquê esta personagem histórica fora pintada como Alferes da 6ª Companhia do Regimento dos Dragões e não como membro do Regime de Cavalaria de Minas Gerais?
Esta indagação pode ser respondida mediante um noticiário do exército. O
encarte de 25 de julho de 2008, em sua segunda página, passa a informação de que no ano de 1831 houve a fusão entre O 1° Regimento de Cavalaria de Guardas (RCG) e o 2° Regimento de Cavalaria de 1ª Linha, constituindo assim, o 1° Corpo de Cavalaria e explana que “O 2° Regimento de Cavalaria era o antigo Regimento de Cavalaria de Minas, que substituiu as Companhias de Dragões em suas tarefas nas montanhas mineiras.” e “O Alferes Joaquim José da Silva Xavier, pertenceu à 6ª Companhia do Regimento de Minas. A fusão dos dois regimentos mostra que a história do atual 1° RCG pode começar em 1775, data da criação do Regimento de Minas”, identificando desta maneira, o porquê Wasth desenhou a personagem Tiradentes como membro dos Dragões e não do Regimento da Cavalaria de Minas.
Diante do exposto, eis a finalidade desta pintura histórica: trata-se de uma
obra considerada canônica e que buscou representar Tiradentes como Alferes. Vale ressaltarmos uma outra visão a respeito dessa Pintura Histórica, a de Neves (1993), ele considera que “no ‘retrato’ de Wasth Rodrigues, o que temos não é ainda Tiradentes, talvez nem mesmo Joaquim José da Silva Xavier, mas apenas um jovem e um elegante alferes da tropa paga de Minas Gerais” (NEVES, 1993, p. 99).
Todavia, esta obra contribuiu no sentido de incorporar ao imaginário coletivo a ideologia republicana a favor do exército: “A figura de Tiradentes, recuperada pelos militares no final do século XIX, passou a se constituir em símbolo nacional, procurando-se com a rememoração do evento associar república e liberdade” (BITTENCOURT, 2002, p. 57). Nesse sentido, é possível conjecturar que a imagem de Tiradentes delineada na condição de alferes colaborou para difundir o discurso ideológico militarista.

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