Honda Civic Type R, Japão - Jeremy Clarkson
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Imaginem a necessidade de mudar radicalmente a maneira antiga de construir casas com o objetivo de neutralizar a emissão de carbono. Acho que todos ficaríamos tristes, pois eu, pelo menos, adoro paredes de pedra e tetos inclinados de concreto.
E ficaríamos mal se tivéssemos, daqui para frente, de morar em cubos feitos de alumínio e palha colados com excrementos de animais. É como me sinto sobre o movimento para banir carros com motores de combustão interna. Sei que na recente crise da gasolina, que paralisou aquelas regiões do país onde se lê o Daily Mail, muitos pensaram em passar para a propulsão Musk. Só que não consigo ver como isso possa fazer sentido.
Políticos, que geralmente não são engenheiros, adotaram baterias recarregáveis como solução para todos os males, mas elas não são. Nem a longo prazo. Pois elas envolvem escravidão infantil, um enorme buraco negro na arrecadação de impostos, uma necessidade de energia elétrica que não temos, uma mudança completa na maneira como viajamos, uma enorme despesa extra para o consumidor e, mais importante, o abandono de uma tecnologia que funciona. Combustão interna.
Houve um tempo em que você comprava um Volvo quando queria segurança. Um BMW como a última palavra em dirigir. E um Volkswagen quando queria algo confiável. Mas não mais. Porque hoje quase todos os carros são duráveis, seguros e rápidos.
Em 1987 fui convidado por um fabricante chamado Daihatsu para ir ao Japão experimentar o novo hatchback rápido de nome Charade GTti. O motor dele era um 1 litro que produzia 100 cv, e me lembro de cair para trás, pois motor que desenvolvia naquela época 100 cv por litro era coisa do romancista Lewis Carroll. Fantástico.
Depois de voar metade do mundo para experimentar o pequeno carro, estava um pouco zonzo, e por isso, depois de dar meia volta na pista de provas da empresa, bati feio, praticamente partindo o carro em dois. Saí completamente ileso e quando me desculpei com meu anfitrião por acabar com o carro, ele disse: “Não tem importância. Fazemos um a cada 23 segundos".
Veja só. Eles eram como coelhos, produzindo um carro pequeno que custava bem pouco, pareciam espectadores aplaudindo por eu não ter me machucado mesmo numa batida de grandes proporções, e isso foi em 1987.
Hoje estamos bem melhores. Quando eu estava crescendo, aceitávamos que carros enguiçassem de vez em quando e que não pegariam numa manhã fria e úmida. Ele era feito de milhares de peças e inevitavelmente uma delas falhariam ocasionalmente.
Aceitávamos também que, se sofrêssemos um acidente, iríamos nos ferir. Muitas vezes papai chegava em casa com alguma gaze devido a alguma batida ao estacionar seu Ford Cortina. Aceitávamos furos de pneus e que aquecimento era item opcional. E que vidros embaçavam em dias chuvosos.
Mas agora, depois de 100 anos e trilhões de dólares gastos na incessante busca da perfeição, temos carros que limpam o ar enquanto dirigimos e nos quais é quase impossível morrermos. Carros em que pneus quase nunca furam, nunca enguiçam e podem viajar em velocidades respeitáveis.
E agora estamos condenados a jogar tudo isso no lixo porque um político, levado pelas mídias sociais e ensinamentos de uma adolescente sueca, decidiu que devemos seguir os passos de um mau Bond sul-africano com um filhote impronunciável e senhor das desilusões do universo. É de chorar.
Pensei nisso tudo enquanto dirigia o Honda Civic Type R semana passada. Tem bom preço, é prático e muito, muito rápido. Mas a despeito disso tudo, é o último capítulo. Não apenas o último carro a ser produzido na agora defunta fábrica de Swindon (Inglaterra), mas também o último da espécie.
O Civic Type R sempre foi um grande favorito da geração PlayStation de corrida e nos últimos anos a Honda explorou o fato, fazendo cada nova encarnação mais atraente e desejada. Mas no mais recente exemplar eles passaram completamente do ponto, colocando tomadas de ar falsas e três saídas de escapamento na traseira e um absurdo aerofólio traseiro e pneus que pareciam um isolamento de teto. Um carro sem sentido.
Por isso resolveram dar uma mexida e criaram o que chamam de Sport Line. Ótimo. Exceto que isso fez piorar o carro de alguma forma, porque, graças ao aerofólio traseiro mais discreto, nada se vê pelo espelho retrovisor. E as menores rodas de 19 polegadas estão perdidas nos arcos dos para-lamas. Parece um carro que algum jovem desenhou sem ter o orçamento adequado.
Todavia, se você não levar em conta os problemas estéticos — o que é difícil — é um carro sensacional. Na melhor tradição dos melhores hatches rápidos, ele tem um grande porta-malas, bancos traseiros escamoteáveis, muito espaço para uma família de cinco e velocidade máxima de 272 km/h. Num Honda Civic.
Ficou melhor por ser um desempenho usável. Muitos dos atuais carros velozes — e incluo Teslas e Porsches elétricos nessa lista — são tão rápidos que você não ousa acelerá-los para valer por qualquer período mais prolongado, especialmente com piso molhado.
Mas saí com o Type R numa tempestade. Folhas sendo arrancadas das árvores e espalhadas pela pista e o vento vinha em séries doidas de fortes lufadas. E mesmo assim eu conseguia usar toda a potência, mesmo em segunda, sem ficar nem remotamente assustado. É um carro bem nascido e tem realmente o melhor câmbio manual de toda a História do automóvel.
E mais, graças àquelas rodas pequenas com pneus de perfil mais alto e complacentes, ele é capaz de alisar as irregularidades da superfície da estrada, mesmo que você utilize o modo de condução ativo em “+R”.
Adorei guiar este carro. E adorei ainda mais a aceleração automática nas reduções de marchas. Você não pode fazer isso num carro elétrico porque ele não tem câmbio. Não no sentido que se conhece.
Gostei até de conduzi-lo. Sim, o comando e a tela de controle parecem ter sido desenhados por alguém de oito anos de idade, mas depois de apena duas horas peguei o jeito de usá-los. Gostei especialmente do sistema de carregar meu telefone sem precisar conectá-lo em lugar nenhum. Ainda não consigo entender com isso funciona. Será que fizeram a eletricidade pular, como um gafanhoto? Não é possível…
Tenho certeza, claro, de que os carros do futuro terão este sistema com todo tipo de coisas que ainda nem começamos a imaginar.
Mas os dias em que você entrava no carro e saía dirigindo sempre que desse vontade, e que podia reabastecer em questão de instantes e sofrer um acidente sabendo que o incêndio resultante não ficaria recomeçando durante meses ou anos depois?
Eles, receio, não existirão mais. Uma baita pena.
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