domingo, 16 de setembro de 2018

Vênus de Urbino (Venere di Urbino) - Ticiano


Vênus de Urbino (Venere di Urbino) - Ticiano
Galleria degli Uffizi Florença
OST - 119x165 - 1538


Guidobaldo della  Rovere, filho do duque de Urbino, encomendou a Ticiano um retrato seu e  o da “senhora despida”, ou seja, A Vênus de Urbino. Na época, ele tinha completado 25 anos e o pintor, que teria o dobro da idade do rapaz, era o artista mais apreciado do sul da Europa. Entre seus clientes encontravam-se conventos, igrejas, ricos comerciantes, príncipes e o imperador Carlos V.

O futuro duque de Urbino conheceu Ticiano, provavelmente através de seu pai, Francesco Maria I della Rovere, que era um apaixonado por quadros e ambientes cultos e intelectuais, tendo encomendado várias obras a Ticiano. De modo que, após a morte do pai, Guiobaldo tornou-se o Duque de Urbino, e continuou a encomendar obras ao pintor.

Algumas suposições existem acerca da personagem retratada em A Vênus de Urbino. Seria ela:

A-) a amante de Guiobaldo, futuro Duque de Urbino, à época
B-) a própria amante do pintor
C-) a mitológica Vênus (mas falta-lhe os atributos, como o Cupido)
D-) Eleonora Gonzaga, mãe de Guiobaldo, pois tanto na pintura em que foi retratada, como na jovem desnuda estava presente o mesmo cãozinho enrodilhado.

O fato é que nenhuma dessas hipóteses ficou provada. E mais longínqua ainda é a ideia de que fosse Eleonora Gonzaga, pois à mulher casada daquela época, vivendo em boas condições, cabia apenas dirigir a casa, assegurar a descendência, preservar a honra do marido e acompanhá-lo nas cerimônias oficiais. Ela jamais posaria nua, pois seu corpo pertencia apenas ao esposo, jamais exalaria luxúria como vista na pintura. Além disso, a Igreja, grande inimiga do corpo feminino, estava sempre a postos.

A possibilidade de que Ticiano tivesse representado Vênus, a deusa romana da beleza e do amor, também é improvável, embora se encontrem na composição dois atributos da deusa: as rosas e o vaso com murta. O que torna questionável tal representação é a presença das duas criadas. Somente a presença do filho Cupido tornaria a identificação inquestionável. Portanto, a maioria dos especialistas no assunto chegou à conclusão de que se trata de uma figura humana.

O corpo da jovem desnuda representa o ideal de beleza e gostos eróticos do Renascimento pleno. Ela se encontra totalmente nua, tendo no corpo apenas brincos, uma pulseira no braço direito e um anel no dedo mindinho da mão esquerda. Traz na mão direita um buquê de rosas vermelhas, que sempre foram tidas como um atributo a Vênus. As rosas também são o símbolo do prazer e da fidelidade no amor. Ela encara o observador com naturalidade, olhando diretamente para ele. Reina calma e ordem no ambiente.

O cabelo cacheado e dourado enfeita-lhe o rosto, cujos olhos dirigem-se para o observador, com certa indiferença. Seu cabelo suaviza suas feições, caindo abundantemente sobre seus ombros e travesseiros. Uma trança cinge-lhe o meio da cabeça. O seu ombro direito é mais acentuado (o ideal feminino da Renascença baseava-se num tipo mais corpulento). Os seios pequenos, redondos e rígidos também eram um ideal da beleza feminina, significando que eles ainda não haviam atingido a maturidade.

A beleza da pele da figura é um espetáculo à parte, deixando o observador totalmente extasiado. Para pintar a pele da Vênus de Urbino, Ticiano empregou o branco perolado nas áreas claras, banhadas pela luz, e o tom rosado nas áreas sombreadas, que aparecem em pouquíssimas partes do corpo.

A jovem não tem cintura fina, pois, tal característica não era aceita naquela época. Sua barriga, ligeiramente arredondada, permanece como o centro do corpo, como símbolo da fertilidade e da reprodução. Se comparada com o modelo de beleza das modelos atuais, todas as mulheres seriam estéreis com suas barrigas planas.

A mulher é retratada como costumava dormir. Sua nudez é destacada pela presença, em segundo plano, de duas criadas rigorosamente vestidas. Estariam elas pegando as roupas para vestir sua patroa? Alguns estudiosos sugerem que as criadas estão executando os preparativos para as núpcias de sua senhora e, portanto, o quadro seria uma alegoria ao amor marital.

A cortina verde-escuro, que desce sobre a divisória do quarto, destaca o rosto esplendoroso da modelo, equilibrando-se com os tons claros dos travesseiros e lençóis.  A cor vermelha vista no buquê de rosas, no vestido de uma das criadas e no colchão dá mais vivacidade à composição.

Ao fundo, uma criada, usando mangas bufantes, mexe num baú de roupas. O quarto e o mobiliário são característicos da época. O pintor dá destaque à cama e às arcas, pois eram os móveis mais importantes do quarto, muitas vezes os únicos. O cãozinho sobre a cama simboliza o amor carnal, mas também a fidelidade. E no peitoril da janela, um vaso com murta indica a constância no casamento.

A ornamentação vista na parede, por detrás da criada de pé, tanto pode ser uma tapeçaria como um ornamento de couro. Embora as janelas à época fossem pequenas, Ticiano apresenta um grande vão em sua pintura, o que nos leva a supor que se tratava de uma residência de verão.

Existem muitos detalhes no quadro que são bem fiéis à realidade, embora outros não o sejam. Exemplo disso é a sombra, apenas esboçada, de um galho na superfície escura da divisória. E esta superfície, além de destacar o corpo alvo da moça, traz equilíbrio às duas partes do quadro. Sua borda direita, corta a pintura ao meio, e acaba abaixo da mão esquerda da jovem, destacando seu monte de Vênus, que ela esconde delicadamente.

Ticiano foi assistente, no início de sua carreira, do mestre Giorgione. A sua Vênus de Urbino tem muita semelhança com a Vênus Adormecida de seu antigo mestre. Mas, excetuando a modelo nu, crê-se hoje em dia, que Ticiano trabalhou e acabou grande parte daquele quadro. O quadro de Ticiano apresenta muito mais do que apenas os atributos de Vênus.

A composição de Ticiano, Vênus de Urbino, a mais célebre de suas pinturas, é tida como um dos mais esplêndidos exemplos do nu, encontrados na pintura universal, onde serenidade e sensualidade convivem harmoniosamente. Atualmente, a pintura é vista pela maioria dos críticos de arte  como uma alegoria ao amor conjugal e à fidelidade, tomando por base o cãozinho dormindo na cama e as duas criadas ao fundo, sendo que as duas arcas podem ser uma alusão ao enxoval da noiva.

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