segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Selo "Bicentenário da Independência - Presença dos Correios", 2022, Brasil

 


Selo "Bicentenário da Independência - Presença dos Correios", 2022, Brasil
Selo



Sobre o Selo:
Esta emissão do conjunto do Bicentenário da Independência destaca a presença dos serviços de correios na entrega de correspondências, contendo notícias e informações acerca todo o cenário que se desenrolava. Na esquerda do selo está o desenho de um personagem com vestes coloniais entregando um malote com envelopes, e na porção direita, dois indígenas - seguindo o relato histórico que percorriam o caminho em duplas - se embrenhando pela mata. Logo acima do personagem que contrata o serviço de entrega está um desenho de uma construção com o nome Correios, aqui retratado de forma simbólica. A técnica usada foi ilustração manual com lápis de cor.
Correios e a Independência:
Em 1798, uma reforma de Correios iniciada pela Coroa portuguesa iria modificar o funcionamento da comunicação à distância, feita então por cartas, de maneira substancial. A partir de então, o direito de organizar o serviço de transporte de correspondência e de auferir lucros advindos desta atividade pertenceriam diretamente à alçada real. Antes, os Correios eram monopólio de uma família, que explorava a atividade de forma privativa, tanto em Portugal quando no ultramar, desde o século XVII. A partir deste momento, os representantes régios na América portuguesa se incumbiram por montar toda uma estrutura administrativa (até então inexistente) responsável por enviar, receber e distribuir cartas. Este sistema postal, embora não organizado de forma centralizada e pouco coeso, se expandiu e se manteve até os primeiros anos do Brasil independente.
Os Correios instituído às vésperas da ruptura com Portugal, contudo, não eram a única forma de se enviar correspondência e encomendas. Isso porque, desde antes de 1798, existiam outros sistemas que faziam a informação à distância circular: desde navios de comércio que levavam e traziam cartas por mar, até viajantes de caminhos e tropeiros que levavam por terra notícias escritas e encomendas. Toda esta estrutura não deixou de existir no período das reformas, e os Correios então instituídos passaram a representar apenas uma dentre várias possibilidades da população alfabetizada de enviar papéis escritos. E essa variedade de meios comunicativos desempenhou um papel importante na Independência, quando então discussões políticas e múltiplos projetos de organização social circulavam em periódicos, livros e manuscritos, que poderiam passar pelo Correio, mas também por fora dele.
A própria entrega da carta que culminou no 7 de setembro é um exemplo desta multiplicidade. Paulo Emílio Bregaro foi um personagem que marcou bastante a memória projetada posteriormente da participação dos Correios na Independência. Ele foi ressaltado em outras comemorações da mesma data, a exemplo do sesquicentenário em 1972. Oficial militar, Bregaro foi aquele que levou a correspondência da Corte do Rio de Janeiro para São Paulo para notificar D. Pedro I das atualizações da situação com Portugal. Contudo, embora Bregaro fosse “correio” (ou seja, um oficial que entregava cartas, não necessariamente ligado à Administração postal), ele não fazia parte do Correio Geral Rio de Janeiro, não sendo, portanto, um empregado da instituição. Neste e em outros momentos, era comum que as forças armadas transportassem a comunicação à distância, em paralelo aos serviços do Correio Geral. A construção da memória em torno de Bregaro, já nas comemorações do século XX, demonstram o esforço de inserir os Correios na história oficial de Estado sobre a Independência, voltada para o núcleo de elite que articulou este movimento político. Pouco nos revela, portanto, sobre a estrutura de correios da época atuante de fato, como ela estava instituída, e qual seu papel neste momento.
Neste ano do bicentenário da Independência, o mote de algumas emissões postais sobre este motivo se voltaram para um entendimento mais amplo do movimento emancipatório, procurando, sempre que possível, trazer à luz artes imaginadas a partir de informações acerca de outras participações do contexto político da época, para além da elite. Tendo isso em vista, o selo a respeito da participação dos Correios na Independência ressalta a estrutura da entrega das cartas na primeira metade do século XIX, a partir da perspectiva de como a instituição Correios, formada apenas alguns anos antes, em 1798, funcionava com o trabalho de pessoas de ambientes diversos, que então integravam a sociedade da época. Esta arte, que traz elementos como a Administração postal, seu oficial responsável e os indígenas transportadores de carta, busca cumprir este papel. Cabe lembrar, contudo, que a arte feita a partir de informações históricas, nunca é (e nem pretende ser) uma releitura exata do passado, e sim uma representação acerca do significado dos eventos históricos para o momento presente. Referências historiográficas, bem como a visão e a criatividade da artista se juntam para construir uma nova memória a respeito da participação dos Correios na Independência.
Os indígenas são personagens importantes quando pensamos a América portuguesa. A história das diversas etnias que aqui viviam antes da chegada dos europeus foi marcada, após o contato, por diversos tipos de resistência e estratégias de sobrevivência. A luta pela permanência nas terras e a expulsão violenta feita pelos portugueses foi tônica comum durante todo o período colonial, e também depois dele. Outro tipo de estratégia foi também a integração de indígenas na estrutura colonial, sendo que alguns passaram a atuar na organização administrativa que a Coroa portuguesa construiu em território americano. Esse foi o caso das comunicações, especificamente entrega de cartas e encomendas, haja vista que os indígenas sempre foram grandes conhecedores dos deste vasto território. No contexto específico dos anos posteriores a Independência, fontes relativas aos Correios apontam a atuação de indígenas contratados para levar, semanalmente ou a cada 15 dias, cartas em vilas e cidades de capitanias como Ceará ou Pernambuco. Estes empregados faziam parte da estrutura postal oficial da época e eram transportadores da comunicação escrita, papel muito similar ao desempenhado por Paulo Bregaro no contexto que levou ao 7 de setembro. Entretanto, os “índios correios” não participaram somente de uma entrega eventual de uma carta considerada importante. Eles eram os responsáveis por manter a comunicação à distância cotidianamente. Por meio dos documentos escritos da época, também podemos notar que eles peticionavam a favor de melhores salários e condições de trabalho, indicando a tensão entre este grupo social e os aparatos administrativos da América portuguesa. Devido ao fato dessa documentação ter sido escrita pela instituição postal, pouco se sabe a respeito desses indígenas, pois especificidades como a etnia de que faziam parte eram sempre deixadas de fora das anotações.
Assim, no Bicentenário da Independência, os Correios buscaram ressaltar outros indivíduos participantes da história postal, que nem sempre são lembrados em selos, mas que ganham cada vez mais espaço nos estudos históricos sobre o tema e agora ganham destaque também na área filatélica.

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