terça-feira, 19 de novembro de 2019

Inauguração do Palacete Camilo de Mattos, Praça XV de Novembro, Rua Duque de Caxias com Tibiriça, 1922, Ribeirão Preto, Brasil




Inauguração do Palacete Camilo de Mattos, Praça XV de Novembro, Rua Duque de Caxias com Tibiriçá, 1922, Ribeirão Preto, Brasil
Ribeirão Preto - SP
Fotografia


Construído no começo da década de 1920 no centro da cidade de Ribeirão Preto, o Palacete Camilo de Mattos, de arquitetura eclética e fachada imponente, ainda relembra o ribeirão-pretano que por ali passa, da riqueza e da importância que a cidade possuía na época áurea do café, sendo um dos últimos exemplares de outrora que ainda resistem ao tempo e a especulação imobiliária na cidade. Segundo consta na ficha de identificação do bem para tombamento, o casarão possivelmente começou a ser edificado entre os anos de 1920 e 1921, em terreno localizado no número 625 da rua Duque de Caxias, esquina com a rua Tibiriçá, com a finalidade de servir como residência para o advogado Joaquim Camilo de Moraes de Mattos e sua família.
O encomendante da construção, figura de destaque à época, Camilo de Mattos, como ficou conhecido na cidade, nasceu em 1892, na cidade de Barbacena, MG, e mudou-se para Ribeirão Preto apenas em 1917, logo após concluir seus estudos em direito na faculdade do Largo do São Francisco, em São Paulo. Mattos, devido a seu destaque profissional, alcançou grande destaque no município, acumulou riquezas e teve participação ativa na vida política da cidade, sendo vereador por três mandatos e vice-prefeito, chegando a assumir o cargo de prefeito de Ribeirão Preto por um curto período, tendo em toda sua vida pública realizado benfeitorias em diversas áreas, como na saúde, conseguindo para a cidade sua primeira ambulância, na segurança pública, trazendo bem como em outras áreas, colaborando também com a fundação do Educandário Quito Junqueira e da Fundação Sinhá Junqueira, com trabalhos de orientação e benemerência. Era casado com Maria das Dores Gomes de Mattos, com quem teve três filhos. Viveu com a família no palacete até seu falecimento precoce, em agosto de 1945. A figura de Camilo de Mattos é lembrada até hoje na cidade, sendo o nome de uma rua de grande fluxo no bairro Jardim Paulista e tendo em 1975, sido erigido um busto de sua figura na praça XV de Novembro, em frente ao palacete, homenagem prestada pela Ordem dos Advogados do Brasil. É importante salientarmos que mesmo Camilo de Mattos não sendo um dos barões do café da época, ele tinha forte influência na sociedade e grande contato com vários desses barões, devido principal - mente a ser uma figura política de importância da cidade, sendo assim, é justificada a influência do café e da arquitetura singular do período em sua residência. Uma vez que a sociedade e a economia ribeirão-pretana, à época tinham forte influência da cultura cafeeira. Ainda sobre a edificação do palacete, pouco se sabe ao certo sobre o projeto e sua execução, uma vez que não há registros da construção no arquivo público da cidade, bem como também não consta as plantas e o projeto original junto aos registros municipais. Contudo, segundo alguns autores, como Valadão (1997), que são citados na ficha de identificação do bem, o autor do projeto seria o engenheiro-arquiteto Antônio Soares Romeo, que na época era engenheiro municipal em Ribeirão Preto, sendo a construção finalizada no ano de 1922. Contudo, há na mesma ficha de identificação do bem, em outro trecho, a informação sobre uma declaração dada por Luiz Augusto Gomes de Mattos, filho de Camilo de Mattos, que identifica como responsáveis pela construção o engenheiro Antônio Terreri e o construtor Paschoal de Vicenzo, sendo assim, acredita-se que o projeto possa ser de autoria de Antônio Soares Romeo, tendo Antônio Terreri e Pachoal de Vicenzo sido os construtores, contudo, não se pode afirmar com plena certeza isto.
O número 625 da Rua Duque de Caxias, possuía localização privilegiada à época, em frente à praça XV de Novembro, próximo também ao quarteirão paulista, e a edifícios institucionais da administração municipal, sendo assim, o palacete era parte de um conjunto de casarões importantes da cidade, e foi pano de fundo para diversos acontecimentos históricos. Com características que remetem à arquitetura residencial eclética burguesa do começo do século XX, o palacete edificado em 1921, assim como a maioria dos edifícios construídos na cidade na década de 1920, seguiu o “código de posturas de Ribeirão Preto” também de 1921, que propunha uma “nova implantação” para as construções, as deixando isoladas no lote, com as quatro fachadas afastadas dos limites do terreno, algo que podemos notar na implantação do casarão, em um lote de esquina, com duas fachadas voltadas para a rua. É nesta época que surge também as edículas, pequenos cômodos separados da residência principal e que eram destinadas principalmente para as dependências dos empregados e serviços, sendo a do palacete locada nos fundos do lote, junto aos limites do terreno, tendo em seu térreo um espaço destinado a uma garagem para automóveis, e seu andar superior sendo destinado aos dormitórios dos empregados. Ainda sobre a implantação e o exterior da residência, podemos ressaltar o porão que a eleva do solo, também há a presença de um jardim planejado, algo que as residências da época na cidade começavam a apresentar, e também fachadas ornamentadas, com uso de vitrais com inspiração art-nouveau, assim como as grades e a porta principal de ferro ornamentadas.
Ainda sobre o exterior do palacete, a fachada conta com um torreão, um elemento curvo, semicircular que se destaca a um primeiro olhar, elemento que enobrece a fachada do edifício, que, no térreo funcionava como uma varanda, e no pavimento superior inicialmente tinha função semelhante, sendo uma sacada para um dos quartos, que posteriormente transformou-se em um banheiro, sendo fechado por janelas com vidros, há também uma segunda alteração no torreão, mais precisamente em sua cobertura, como podemos notar através de imagens antigas do palacete e pelas imagens atuais. No que a tange a edificação e seu sistema construtivo, segundo consta na ficha de identificação do bem, e como podemos notar em algumas imagens feitas durante uma visita a edificação, o palacete foi construído em alvenaria de tijolos de barro autoportantes com rejunte de barro e argamassa, seu telhado foi executado em estrutura de madeira com telhas cerâmicas francesas e, com exceção das portas externas das fachadas principais que eram de ferro e vidro, todas as outras esquadrias da residência eram de madeira e vidro.
Quanto ao seu interior, podemos destacar a planta compartimentada, com modelo tripartido comum à época e mais uma característica da arquitetura burguesa do início século XX. A residência era dividida em cômodos destinados ao que seria a “área social”, que ficava no térreo, próxima a entrada principal da residência e era composta pelos seguintes cômodos: um escritório destinado ao Sr. Camilo de Mattos, um hall, uma sala de jantar, uma sala de visitas, bem como um banheiro para uso social. Ainda no térreo podemos encontrar também a “área de serviço” do palacete, que era composta pela cozinha, uma despensa, uma copa e um quarto de costura, que ficavam mais distantes da entrada principal da residência. Em seu pavimento superior estava locada a “área íntima” da residência, onde ficavam os dormitórios, banheiros e um terraço.
Ainda podemos destacar, sobre o desenho da planta da edificação, a localização do cômodo que tinha a função de escritório, projetado a pedido do proprietário, onde este recebia clientes e prestava consultoria jurídica.
Ele está locado próximo à entrada da rua Duque de Caxias, entrada esta que era utilizada principalmente como entrada para o escritório, sendo as outras entradas laterais com acesso pela rua Tibiriçá as mais usadas pelos residentes e empregados que ali trabalhavam. Por dentro, o palacete também exibia todo o luxo e o status da família que ali residia, sendo as paredes, assim como os forros, dos cômodos ornamentados e pintados a fim de conferir ares de riqueza e requinte, cada área da residência também possuía um tipo de piso diferente, alternando entre ladrilhos de cerâmica com desenhos diferenciados e tacos de madeira.
O Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural do município de Ribeirão Preto (CONPPAC – RP), órgão responsável pelos tombamentos e pela proteção do patrimônio arquitetônico e cultural da cidade, em 16 de setembro de 2005, através da resolução número 04/05, tomba de forma provisória o imóvel conhecido como Palacete Camilo de Mattos. Com a justificativa de proteger o bem, que possui valor histórico e arquitetônico inestimável, sendo um dos últimos exemplares da arquitetura eclética da época do café restantes na cidade, e após levantamentos técnicos e históricos feitos pelo corpo técnico do CONPPAC-RP, o então prefeito Dr. Welson Gasparini, por meio do decreto número 221, de 11 de julho de 2008, tomba em definitivo o bem. Pertencente até o início do ano à família de Camilo de Mattos, o bem se encontrava sem uso e em processo de abandono.
Contudo, em meados deste ano, 2017, houve a venda do casarão para um grupo de empresários da cidade de Ribeirão Preto, grupo este que, juntamente com um arquiteto e urbanista responsável, iniciou as obras de restauro do palacete há poucos meses. O processo de tombamento do palacete Camilo de Mattos, segundo alegam os antigos proprietários, foi efetuado de maneira controversa, sendo dado a eles, por parte do poder público, poucos esclarecimentos sobre o processo e suas consequências, sendo enviadas apenas notificações sobre o tombamento. Esta falta de informação por parte dos antigos proprietários fez com que o casarão permanecesse fechado e sem uso por diversos anos, uma vez que não havia o conhecimento do que poderia ou não ser feito na edificação, quais usos e modificações poderiam ser efetuadas, o que contribuiu para o desinteresse destes antigos proprietários no restauro e na manutenção do bem. Com poucas explicações do poder público sobre o tombamento e sobre o que pode ser feito com a edificação, alinhado à forte especulação imobiliária da região, houve o pedido, no ano de 2017, de destombamento do bem pelos então proprietários, que alegavam não haver valor histórico e arquitetônico para justificar a preservação. Com o parecer negativo da administração municipal e do apelo da população e de ONG’s da cidade, o tombamento foi mantido. Após a negativa da administração municipal, haviam especulações sobre uma possível proposta de permuta entre a prefeitura e os, até então, proprietários, oferecendo a troca do bem por terrenos de valor similar em outros pontos da cidade, permuta que já havia sido proposta em outras oportunidades, mas que nunca chegou a ser efetivada. Contudo, houve em meados de 2017 a negociação e a posterior venda do edifício, de forma particular, a um grupo de empresários já citado, que segundo reportagens veiculadas na mídia local e conversas informais com o arquiteto e urbanista contratado, pretendem manter o bem com sua máxima originalidade, preservando sua memória e história, porém dando um novo uso, que ainda será definido. No processo de pesquisa sobre o tombamento e nas conversas com os antigos donos, ficou claro de início uma certa dificuldade de comunicação entre, principalmente, os antigos proprietários e os responsáveis pelo CONPPAC e a administração pública municipal, que gerou uma sensação de descaso com os bens tombados da cidade. Contudo após novas conversas e pesquisas pode-se perceber os instrumentos que a prefeitura faz uso para estimular a conservação desses bens, como o desconto no IPTU. Porém, ainda é pouco, não havendo um suporte prático às obras de restauro e manutenção e nem alguma forma de cobrança efetiva para que os proprietários dos diversos imóveis tombados os mantenham em razoável estado de conservação. Ainda há muito que se pensar enquanto as políticas públicas de preservação na cidade, cabendo a prefeitura dar ao CONPPAC mais recursos para intervir e conscientizar a população e os proprietários destas edificações sobre seu valor e importância para a memória ribeirão-pretana.
Atualmente o palacete encontra-se sem uso, e estava em situação de abandono até meados de 2017, desta forma, seu estado de conservação estava comprometido, com muita sujidade e avarias em sua fachada e interior, sendo seus espaços externos usados por moradores em situação de rua para passarem as noites, e já tendo sido ocupado de forma irregular em outras ocasiões. As fachadas do palacete possuem muitos pontos com sujidade e avarias, contudo, de maneira geral estão em estado regular de conservação, com quase todos seus elementos e ornamentações originais ainda presentes. Quanto a pintura e reboco das fachadas, há além de muita sujidade e desgaste, áreas bem danificadas, onde os tijolos da construção já se encontram aparentes, sendo presentes também pichações nas paredes das fachadas com frente para as ruas Tibiriçá e Duque de Caxias, e no muro externo que cerca parte do terreno ocupado pelo palacete. Podemos perceber também que várias das aberturas, principalmente as do térreo, que estão voltadas para as fachadas com acesso direto das ruas estão em sua maioria lacradas com tijolos e tapumes, com exceção da porta principal da fachada voltada para a rua Duque de Caxias, a porta de ferro e vidro desta fachada encontra-se apenas trancada, sendo o único acesso atual ao interior da edificação. O fechamento das janelas e portas foi executado pelos proprietários e ocorreu após várias ocupações irregulares e que teve como objetivo impedir com que elas voltassem a ocorrer, uma vez que não há previsões para projetos de restauro e uso do palacete. Ainda na parte externa do palacete, podemos notar principalmente a falta de limpeza da área, assim como a falta de cuidado com a vegetação existente no lote, algo que já começa a interferir na construção, sendo a árvore locada na esquina do lote a causa das rachaduras no calçamento e na mureta que cerca o casarão, sendo provável que, se não retirada, as raízes da árvore possam vir a danificar também as fundações do palacete. Notamos também o estado de preservação do gradil que cerca o bem, estando apenas com pontos de ferrugem, assim como as grades das janelas, que foram inseridas em algum momento após a construção, não sendo originais dela, estando os portões que acompanham o gradil em pior estado, com muita ferrugem e totalmente danificados em alguns pontos. Quanto ao interior da edificação, há muita sujeira, como já esperado para uma construção em estado de abandono, contudo, há áreas mais danificadas, que sofreram maiores danos devido a infiltrações e ações de terceiros que, ocuparam de forma irregular o casarão, e áreas com melhor estado de conservação, algo que fica evidente nas pinturas das paredes internas, que na sala de jantar, por exemplo, está bem conservada, mas no corredor do pavimento superior foi danificada a ponto de não só a pintura se perder, como o próprio reboco ter se soltado, devido a um incêndio que acometeu apenas a área próxima ao corredor e a escada, e um dos quartos, no segundo pavimento, que acabou por comprometer as portas alocadas na região e o forro de madeira do corredor. Apesar deste incêndio recente, a escada de madeira está, de forma geral, em bom estado, sem indícios de infestação por cupins ou peças que precisem ser substituídas, do mesmo modo, todo o piso do palacete é original, estando de maneira geral em bom estado e apenas sujo na maioria dos cômodos, principalmente onde há ladrilhos hidráulicos. Porém, onde há piso de tábuas de madeira há algumas avarias como manchas e tábuas comprometidas, porém são danos pontuais. Já quanto ao forro, há no térreo algumas manchas geradas por conta de infiltrações e desgastes na pintura, estando ainda íntegro, no segundo pavimento foi possível notar a presença de dois forros, o original de madeira mais alto, e outro forro mais baixo, de material plástico, que foi instalado a fim de diminuir a altura do pé direito dos quartos, estando este em pior estado, com pedaços danificados, principalmente no cômodo cujo o incêndio supracitado ocorreu, contudo o forro de madeira superior continua, em quase toda a área, bem conservado, exceto pelo corredor deste pavimento, onde o fogo o consumiu, deixando a estrutura do telhado aparente. Não se sabe se as portas do interior foram tiradas pelos proprietários ou se perderam-se com o tempo, devido às invasões constantes que o palacete sofreu em determinadas épocas, contudo, apenas as portas de folhas duplas locadas na área de serviço do casarão ainda se encontram presentes, situação diferente das janelas, que ainda estão todas presentes, e em sua maioria em bom estado, apenas com vidros quebrados, porém todas fechadas e algumas no térreo lacradas com tijolos a meia altura e tapumes.
Já quanto a cobertura, podemos notar telhas quebradas nos beirais, bem como calhas danificadas, provavelmente pela vegetação presente no terreno, contudo, como não há infiltrações e manchas no forro superior, acredita-se que a cobertura de telhas do tipo Marselha encontra-se em sua maioria íntegra e com poucos danos, contudo, há a presença de muita sujeira entre o madeiramento que estrutura o telhado, bem como indícios de uma possível infestação por cupins. No terraço podemos notar a presença de uma cobertura metálica, posterior ao projeto original, que possui pontos de ferrugem e pequenos danos, e deve ser retirada, uma vez que descaracteriza o bem e interfere de forma negativa em sua fachada. Quanto ao espaço destinado ao quintal e a edícula localizada no fundo do lote, devido a muros que fazem o fechamento de parte do terreno e as portas estarem lacradas ou fechadas, não houve como realizar os levantamentos, porém, também estão em estado ruim.
Os fatos acima mencionados são referentes a uma visita feita no mês de junho de 2017 ao local, onde foram constatados os danos supramencionados. Contudo, como houve a venda do palacete entre os meses de Julho e Agosto de 2017 e posteriormente o início das obras de restauro, em nova visita no mês de setembro, guiada pelo arquiteto Cláudio Bausso, responsável pelo projeto de restauro em andamento. Nesta nova visita foi possível notar que alguns dos danos já haviam sido reparados, como os referentes a cobertura e seu madeiramento, a grande quantidade de sujeira que havia no local havia sido retirada, bem como as vedações de portas e janelas, assim como outros pontos já estavam em processo de restauro. Aguardamos ansiosamente pelo final do processo de restauração para que o palacete Camilo de Mattos continue a ocupar seu merecido lugar na história de Ribeirão Preto.

Um comentário:

  1. Boa noite! Acabei de ler esse texto, descrição minuciosa e perfeita! Gostaria de entrar em contato com você sobre este monumento! (16) 99790-0777 favor entrar em contato quando puder! Te agradeço!

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