Range Rover Velar, Inglaterra - Jeremy Clarkson
Fotografia
A indústria
passou 100 anos aperfeiçoando a arte de fabricar carros e, no início deste
século, ficou muito boa em fazer isso.
Mas daí todo mundo decidiu de repente que os carros precisavam
mudar. Precisavam ser mais altos, mais verdes, mais econômicos e,
possivelmente, operar totalmente por conta própria, sem um motorista.
Como resultado, os fabricantes de veículos do mundo estão agora
se equilibrando com um pé em um patim e outro em uma casca de banana. Eles vão
cair. É só uma questão de tempo.
A Aston Martin reduziu suas metas de lucro. O preço das ações
da Tesla caiu, como resultado de prejuízos cada vez maiores.
A Nissan está cortando 12.500 empregos em todo o mundo. A
Vauxhall já deu indícios de que fechará suas operações no Reino Unido. E por aí
vai.
O problema é que um país atrás do outro
está anunciando que logo vai banir a venda de carros a gasolina ou diesel. Isso
está forçando os fabricantes a investir em veículos elétricos.
E isso, juntamente com a tarefa difícil de
fazer um carro que rode por conta própria, torna as coisas tão caras que Ford e VW – duas das maiores montadoras – foram forçadas a
trabalhar em conjunto. A Fiat Chrysler e a Peugeot-Citroën também se uniram.
E, enquanto bilhões estão sendo investidos
no problema, quase ninguém está comprando esses produtos. As baterias ainda não
são boas o bastante, são caras demais e não duram o suficiente. É um pesadelo.
Pode imaginar administrar uma empresa cujo negócio é moldado
pela obsessão de uma menina sueca pelos gases liberados na atmosfera? Na
Grã-Bretanha, a venda de híbridos e elétricos diminuiu quase 12% em junho.
E a de elétricos plug-in caiu pela metade em relação a 2018. É
como eu disse: os fabricantes de carros estão sendo forçados a desenvolver uma
tecnologia que todo mundo diz que quer, mas não compra.
O que eles querem são SUVs. A venda na Europa dessas caixas
para famílias com posição de dirigir alta aumentou 18% no ano passado.
Isso poderia fazer você achar que é uma boa notícia para a
Jaguar Land Rover. E parece que é quando ando pela vizinhança. E todas as ruas.
Todos os estacionamentos de bares. Todos os estacionamentos de eventos, tudo
lotado de Range Rovers.
Deixou de ser um carro. É um uniforme. E não são baratos.
O topo de linha custa mais de 100.000 libras (R$ 503.000).
Por isso seria de se pensar que os lucros são enormes. Mas a
JLR está perdendo tanto dinheiro quanto crianças perdem suas luvas
em um fim de semana de esqui. No primeiro trimestre deste ano, ela perdeu 3.200
libras (R$ 16.100) por minuto.
Dizem que é devido a uma desaceleração da economia chinesa e
porque apostaram pesadamente em motores a diesel, que agora são malvistos.
Além disso, a empresa gastou bilhões em um Jaguar elétrico
brilhante, que só é apreciado pelo meu colega James May. Que, em vez do I-Pace,
está comprando um Tesla.
Apesar de tudo isso, estou aqui avaliando um carro da JLR. É
uma nova versão do Range Rover Velar, a SVAutobiography Dynamic Edition. E
gostei dela. Bem, nem tudo.
Não sei quem projeta os bancos dos Land Rover, mas suspeito que
a ideia deles de um lugar relaxante para se sentar é um banquinho de ordenhar
vaca.
O banco traseiro de um Discovery é ridiculamente
desconfortável. Esse é o carro que você deve comprar se não gostar dos
seus filhos.
As coisas não são tão ruins no Velar, mas os assentos continuam
duros demais. E o cinto de segurança não tem ajuste de altura. Além disso, num
carro desse tamanho, era de se esperar um pouco mais de espaço para pernas.
E daí há o painel. Ele é de vidro, como na cabine de comando de
uma aeronave moderna, e tem um visual adorável.
Mas cada vez que você tenta ajustar, digamos, a temperatura, o
nó de um de seus dedos esbarra em outra parte da tela e, subitamente, você está
no modo Eco ou o GPS decidiu que você precisa ir a outra cidade.
Para piorar, o carro usa rodas aro 21, que transmite muito as
irregularidades do piso. E isso só aumenta suas chances de tocar no botão
errado. E também tem o preço: o modelo básico, sem opcionais, custa 86.685
libras (R$ 437.300).
Só que tem uma coisinha. Há algo sobre o Velar que tira de
funcionamento a parcela racional do seu cérebro. Em parte por causa do
visual. É como se fosse a atriz Daryl Hannah quando jovem.
Você sabia que ela só comia sementes e lama e que tinha
opiniões estranhas sobre o mundo, mas mesmo assim você subiria em um ninho de
escorpiões para ter a chance de um momento com ela.
Eu não preciso de um Velar. Mas quero um. E se fosse comprar
um, esse é o modelo que escolheria, porque tem um V8 de 5 litros
sobrealimentado que produz 550 cv e 69,3 mkgf.
Isso faz com que você possa ir de 0 a 100 km/h em 4,5 segundos
e chegar, com uma tempestade de ruído do escapamento, a 274 km/h. Em um Range
Rover, veja só.
Melhor ainda é sua dirigibilidade. A contrapartida pela
suspensão dura e todos os toques nos botões errados é que, em uma estrada
sinuosa, você pode aprontar todas, pois os quatro cães de guerra tracionando
mantêm você na pista. É muito divertido de guiar. E também freia bem.
Sim, eu o levei para um off-road, mas após uma distância bem
curta voltei ao asfalto. Porque os sensores de estacionamento ficavam apitando
feito loucos por causa de cada folha de grama.
E qualquer tentativa de tocar no botão que os desligaria fazia
outra coisa acontecer. De alguma forma, o Velar não parecia em seu ambiente
natural no mato.
Ele parecia estar dizendo, com uma voz preocupada: “Aqui é meio
longe do shopping”. E também pensei que o para-lama dianteiro poderia cair se
eu batesse em um morrinho.
Resumindo, parece ser um carro muito em sintonia com os tempos
atuais. É um SUV urbano, que é o que as pessoas querem. Ele é a gasolina, que é
o que as pessoas dizem que não querem, mas é o que querem.
E o melhor: é fabricado em Coventry. Por isso, mesmo que o
Reino Unido deixe a UE sem um acordo, os britânicos poderão comprar um sem
imposto de importação. E deveriam.
Pois se a Europa aplicar um imposto de
200% sobre carros britânicos, eu não duvido que o Reino Unido faça o mesmo com
os carros fabricados na UE.
Daí todos os rivais do Velar vão
subitamente custar uma fortuna.
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