Lufthansa e o Nazismo - Artigo
Artigo
A Lufthansa colaborou com o regime nazista e fez amplo uso de trabalhadores forçados, afirma o historiador alemão Lutz Budrass.
Budrass lançou o livro Adler und Kranich. Die Lufthansa und ihre Geschichte 1926 – 1955 (A águia e o grou. A Lufthansa e a sua história de 1926 a 1955), no qual conta a história da primeira Lufthansa, que foi liquidada pelos Aliados depois da Segunda Guerra Mundial. O grou é a ave-símbolo da empresa.
A atual Lufthansa, apesar de não ser sucessora de direito da antiga empresa, assumiu vários símbolos da primeira, como o nome, as cores e o grou, e foi refundada por pessoas que tiveram uma participação decisiva na primeira Lufthansa.
Segundo Budrass, a primeira Lufthansa era parte do regime nazista e colaborou para erguê-lo. "Ela se uniu aos nazistas já nas primeiras horas, mais especificamente a Hermann Göring", afirmou.
O historiador afirma que a primeira Lufthansa, fundada em 1926, serviu de fachada para o rearmamento aéreo da Alemanha após a Primeira Guerra Mundial. Esse rearmamento aconteceu de forma sigilosa de 1933, quando os nazistas chegaram ao poder, até 1935. "Ela era uma força aérea disfarçada."
"O grande objetivo, traçado em 1925 e 1926, era em algum momento voltar a ter uma força aérea armada, que havia sido proibida depois da Primeira Guerra Mundial", disse Budrass.
No livro, o historiador aborda também o uso de trabalhadores forçados pela empresa área. Segundo ele, a Lufthansa arranjava, ela mesma, os seus trabalhadores forçados. "Com as oficinas de conserto no Leste, ela está em condições de capturar ela mesma trabalhadores forçados, que depois eram transportados para a Alemanha. E entre elas havia, em grande parte, crianças."
No final dos anos 1990, a Lufthansa lhe deu acesso aos arquivos da empresa e o contratou como historiador para um estudo sobre trabalhos forçados durante o regime nazista. Agora o senhor publicou o livro Adler und Kranich. Die Lufthansa und ihre Geschichte 1926 – 1955 (A águia e o grou. A Lufthansa e a sua história de 1926 a 1955). O que aconteceu?
Budrass: Eu escrevi, entre 2000 e 2001, um estudo sobre trabalhos forçados para a Lufthansa. Na época, ele não foi publicado. Desde então eu refleti sobre o porquê de a Lufthansa lidar dessa maneira com a sua história. O resultado é o livro Adler und Kranich, no qual eu conto a história de 1926 a 1955.
Se, para fins comparativos, você pegar o livro oficial da Lufthansa sobre a sua história, com o título Sob o signo do grou, verá que nele o todo se divide em duas partes: numa parte, uma história maravilhosa da primeira Lufthansa, com inúmeras fotos, e aí, bem atrás, dentro de uma pequena folha de plástico, o meu estudo – num papel que é provavelmente o mais fino disponível no mercado alemão.
Eu considero essa divisão errada. Não há uma história boa e uma história má. É necessário ver os dois lados para compreender uma empresa. Ao que parece, ainda hoje a Lufthansa não está disposta a isso.
Até hoje, a Lufthansa argumenta que não é a sucessora de direito da antiga empresa Deutsche Lufthansa e, por isso, não tem nada que ver com a história antes da refundação, em 1953. Como o senhor vê isso?
Há uma primeira e há uma segunda Lufthansa. Sobre isso não há o que discutir. A primeira Lufthansa foi fundada em 6 de janeiro de 1926, a segunda, em 6 de janeiro de 1953. Por um lado, a empresa quer se distanciar dos crimes de que participou, na época do nazismo. Mas, por outro lado, quer usar as fotos da aviação dos anos 1920: essas belas imagens do ressurgimento da Alemanha depois da Primeira Guerra Mundial, do entendimento entre os povos, de paz, de aventura.
Que tipo de empresa a Lufthansa era nos anos de 1920 e 1930?
Em primeira linha, uma empresa estatal. O grande objetivo, traçado em 1925 e 1926 no Ministério da Aviação do Reich e na Reichwehr (Forças Armadas), era em algum momento voltar a ter uma força aérea, que havia sido proibida depois da Primeira Guerra Mundial. A Lufthansa era um veículo importante para se alcançar isso. Ela deveria ser um cliente seguro dos produtos da indústria da aviação civil alemã. Esse é o real começo da Lufthansa, envernizado com a ideia da aviação como símbolo do ressurgimento da Alemanha depois da Primeira Guerra Mundial, uma nação com reconhecimento internacional.
"Reconhecimento internacional" – isso era algo que sobretudo os nazistas queriam. Em que medida a Lufthansa se tornou parte do regime entre 1933 e 1945?
A Lufthansa se tornou, com certeza, parte do regime. Ela até mesmo colaborou para erguer esse regime. Ela se uniu aos nazistas já nas primeiras horas, mais especificamente a Hermann Göring. Em fins de janeiro de 1933, Göring nomeou o chefe da Lufthansa, Erhard Milch, vice no Comissariado da Aviação, mais tarde Ministério da Aviação. A partir desse momento, a Lufthansa passou a servir de fachada para o rearmamento aéreo, que aconteceu de forma sigilosa até 1935. Ela era uma força aérea disfarçada.
Em que medida a Lufthansa se torna culpada por crimes de guerra?
Durante a guerra, a Lufthansa não tinha de fato uma função, já que a Força Aérea havia assumido as tarefas dela. Ela precisava achar uma função substituta e a encontrou no conserto de aviões. Como todas as outras empresas, a partir de um determinado momento ela passa a depender de trabalhadores forçados. Havia cerca de 7 milhões deles na Alemanha. O que diferenciava a Lufthansa de outras empresas é que ela regularmente explorava os trabalhadores forçados para acumular meios para, depois da Guerra, poder retornar à aviação civil. A Lufthansa lucrou com seus trabalhadores forçados.
O senhor escreve no seu livro que, desde o começo, judeus foram forçados a trabalhar em Tempelhof e, mais tarde, transportados para campos de concentração sem que a Lufthansa fizesse algo para impedir isso. E que a empresa recrutava trabalhadores forçados no front, nas chamadas oficinas de conserto.
O aspecto interessante aqui é que a Lufthansa, ao contrário de outras empresas, arranjava ela mesma os seus trabalhadores forçados. Com as oficinas de conserto no Leste, ela está em condições de capturar ela mesma trabalhadores forçados, que depois eram transportados para a Alemanha. E entre eles havia, em grande parte, crianças.
Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, a Lufthansa foi chamada a prestar contas pelos crimes que cometeu?
Não, como a maioria das empresas, a Lufthansa não foi chamada a prestar contas. Mas, ao contrário de outras empresas, ela teve um destino bem amargo: foi declarada parte da Luftwaffe (Força Aérea) e teve que ser dissolvida. A liquidação foi executada em 1951. Até então, um ressurgimento da aviação civil na Alemanha era impensável, já que os Aliados, depois da experiência da Primeira Guerra Mundial, queriam proibir os alemães de qualquer participação na aviação para sempre. Essa proibição durou até 1955.
Aqui alguém poderia dizer: mas a Lufthansa tem razão, houve uma ruptura depois de 1945. Em 1953, a empresa foi refundada. Por que o senhor afirma que isso não é verdade?
Em parte, a Lufthansa foi refundada em 1953 pelas mesmas pessoas que a haviam fundado em 1926. Elas são Kurt Weigelt, que, na condição de vice-presidente do conselho de administração, teve um papel dominante na primeira Lufthansa, e Kurt Knipfer, que, como antigo funcionário prussiano, participou da liderança da Lufthansa até 1945. Ele virou um dos principais fundadores da segunda Lufthansa, como autoridade no Ministério dos Transportes. Há uma grande continuidade de pessoal.
Nos últimos anos, outras empresas alemãs – mesmo as famílias Quandt e Dr. Oetker – permitiram que o passado nazista de suas famílias e empresas fosse elucidado. Por que justamente a Lufthansa não desenvolveu até hoje essa consciência?
Acredito que ainda há muitos setores da economia alemã que lucram com determinadas imagens históricas, na medida em que fazem publicidade com elas. Justamente a aviação civil nunca colocou isso em questão – apesar de essas imagens serem dos anos 1920 (os tempos da primeira aviação) e do nazismo. Como a Lufthansa quer continuar usando essas imagens para o seu marketing, ela não está disposta a colocar em questão toda a época.
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