quinta-feira, 13 de julho de 2023

Petit Pavé em Curitiba, Paraná, Brasil




 

Petit Pavé em Curitiba, Paraná, Brasil
Curitiba - PR
Fotografia


Texto 1:
Sobre o petit-pavé, termo de origem francesa, significa pequeno pavimento. Em 1842, no Castelo de São Jorge, uma prisão de Lisboa, o comandante militar Eusébio Furtado ordenou aos presos que cobrissem o pátio com um zigue-zague de pedras. O resultado foi tão fantástico que atraiu a atenção não só dos portugueses. E, consta, foi objeto de uma das primeiras fotografias do mundo, feita por Louis Daguerre.
Batizado de mosaico português, o trabalho deu origem a uma profissão, a de calceteiro. Vai daí que, em Portugal, surgiria em 1986 uma escola para certificação desses profissionais.
Rio de Janeiro e Manaus, em 1905, foram brindados com a chegada do mosaico, graças aos portugueses que para lá imigraram.
A calçada com mosaicos passou a fazer parte da história de Curitiba na década de 1920. Temos como exemplo um trecho da Rua Conselheiro Laurindo, em frente ao Teatro Guaíra, e que remete a ondas do mar, lembrando calçadas de Copacabana. Não demorou e os pinheiros, pinhas e pinhões, estilizados pelo pintor e desenhista Lange de Morretes, ganharam seu devido espaço.
Na Praça Tiradentes, inclusive, encontramos temas indígenas. E, a alguns passos dali, imagens modernistas, com motivos geométricos criados pelo arquiteto Osvaldo Navaro.
Segundo o dicionário, calceteiro, substantivo masculino, é o operário que trabalha no calçamento de ruas ou de outras superfícies com pedras ou paralelepípedos. Trabalhador que faz o revestimento de calçadas com pedras portuguesas, pedras em forma de cubos que formam mosaicos.
O dicionário deveria acrescentar que é mais do que um trabalhador, é também um artista.
Texto 2:
Tanto quanto permitem saber minhas viagens terrenas e astrais, as calçadas e pavimentos executados com pequenas pedras remontam ao Império Romano. Na verdade, é uma prática muito óbvia para que ninguém a tenha pensado antes —mas, como pedigree para uma ideia, o Império Romano já está ótimo.
Embora esses calçamentos possam ser vistos em logradouros anteriores à cisão que deu origem ao Império Romano do Oriente — por exemplo, Óstia — e respectiva cultura bizantina, temos nesse momento um apogeu de formulações espaciais adjacentes: exemplo maior, o mosaico. 
Herdeiros da civilização romana, os portugueses — e não só eles — vão aplicar a estética do mosaico, devidamente adaptada, às suas calçadas. Há uma perda na capacidade de detalhar, que se compensa na estilização.
As calçadas portuguesas rodaram o mundo, onde se desejava um piso com trabalho mais refinado e elegante. No Brasil, são famosas as calçadas da Avenida Atlântica, com desenho lisboeta, mas o encontramos em muitas cidades com distritos históricos.
No caso de Curitiba, esse calçamento é particularmente importante: iniciou-se seu uso na cidade na década de vinte do século 20. Era um momento de preocupação, em vários estados brasileiros, com as identidades regionais. Na falta de figuras emblemáticas como o bandeirante, o gaúcho ou o cangaceiro, os paranaenses vão buscar na natureza — na então dominante floresta de araucárias — formas para alimentar o movimento que veio a se chamar “Paranismo”.
Esta crônica não é o momento para desenvolver a questão, já trabalhada dentro e fora da Academia. Diremos apenas que não durou o quanto merecia — ou deveria. E, entre as muito poucas marcas que deixou, os padrões decorativos no que chamamos de petit-pavé são os mais importantes. São uma presença marcante dentro das nossas paisagens urbanas mais tradicionais do centro da cidade.
Nem todos os desenhos das “calçadas portuguesas curitibanas” remetem ao Paranismo — mas, como bem demonstrou a arquiteta Lucia Vasconcelos, são diversas as origens que resultaram nas estilizações que conhecemos.
Mas — enfatizando — ainda que aviltados, maltratados e denegridos, são a última testemunha daqueles tempos que se aproximam do centenário. Ótimo momento para uma ação de resgate, valorização e até, retomada com novas propostas estéticas — mesmo porque, há muita calçada insípida, culturalmente inexpressiva, na cidade. Nem dá gosto de pisar…

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