quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Embarque de Café no Navio Alemão "Prinz Sigismund", Docas, Santos, São Paulo, Brasil


Embarque de Café no Navio Alemão "Prinz Sigismund", Docas, Santos, São Paulo, Brasil
Santos - SP
Fotografia - Cartão Postal



As três principais companhias de navegação da Alemanha que se interessaram a servir a Rota de Ouro e Prata foram a Hamburg-Süd (HSDG), a NordDeutscher Lloyd (NDL) e a Hamburg-Americanische (Hapag), que iniciaram seus serviços respectivamente em 1872, em 1876 e em 1900.
A entrada da Hapag na linha sul-americana só foi possível depois da assinatura de um acordo com a HSDG, que repartia o volume de carga e tráfego entre as duas, do qual um terço ia para a primeira e dois terços para a segunda.
Para servir a nova rota, a Hapag, que já era então uma potência financeira, ordenou a construção de cinco navios, especialmente desenhados para emprego misto (carga e passageiros), a três estaleiros alemães - ordens passadas em dezembro de 1900.
O estaleiro de Reiherstieg, de Hamburgo, entregou o primeiro da série Prinz em 1902. Era o Prinz Eitel Friedrich que, após realizar sua viagem inaugural entre Bremen (Alemanha) e Jamaica, passou para a linha do Brasil e do Prata, para a qual havia sido construído.
O segundo da série também veio do mesmo estaleiro e foi chamado Prinz Waldemar. Realizaria a sua viagem inaugural para a América do Sul em setembro de 1902 e teria vida relativamente breve, pois foi destruído ao encalhar perto do porto de Kingston (Jamaica).
O Prinz Adalbert, terceiro da série, foi entregue em 1903 à Hapag, pelo estaleiro Bremer Vulkan, realizando a sua primeira viagem em janeiro daquele ano na Rota de Ouro e Prata, na qual permaneceria até o início da Primeira Grande Guerra. Em agosto de 1914, foi apresado pelos ingleses no porto de Falmouth e transformado em navio-auxiliar da Royal Navy (Marinha Real Inglesa), com o nome de Princetown. Em 1917, passou para propriedade francesa e, em setembro daquele ano, com o nome de Alesia, foi torpedeado e afundado pelo submarino alemão UC-50, a poucas milhas do farol de Ushant (Bretanha).
O quarto da série, o Prinz Oskar, teve vida mais prolongada, pois - lançado em 1902 - foi usado a partir de 1903 entre a Europa e a costa Leste da América do Sul e conseguiu sobreviver à guerra inicialmente como refugiado, no porto de Filadélfia (Estados Unidos) e, em seguida, como navio-transporte do governo norte-americano (com o nome de Orion), a partir de 1917. Encontrou seu fim nas mãos dos demolidores de navios, em 1929.
O Prinz Sigismund, quinto da série, foi o que teve uso mais duradouro, pois navegou até 1958, isto é, durante 55 anos! Veio ao mundo por obra do estaleiro Neptun, do porto de Rostock.
Com reputação de construir os navios mais sólidos da Alemanha, o estaleiro Neptun, fundado em 1850, cessou de existir em 1991. Nestes 141 anos de atividades, foram ali construídos cerca de 1.720 navios.
A respeito de solidez e longevidade, a Alemanha tem a fama de construir os melhores navios dentro dessas características. Sua capacidade de engenharia e a qualidade de seu aço são, em grande parte, responsáveis.
O navio realizou a sua primeira viagem entre Hamburgo e os portos brasileiros de Salvador, Rio de Janeiro e Santos em julho de 1903. Entre aquela viagem inaugural e agosto de 1914, o Prinz Sigismund esteve dezenas de vezes atracado no porto de Santos. A rotina era sempre a mesma: na vinda da Europa trazia centenas de emigrantes europeus; na volta, ia abarrotado de café e algodão.
Café, algodão - dois nomes mágicos na criação de riqueza no estado de São Paulo e de seu porto principal. Sobretudo o primeiro produto. A corrente migratória em direção a São Paulo, capital e interior, se fundamentou de tal modo com a cultura do café que o triângulo ligando imigração, café e porto de Santos é indissociável, num período de quase 100 anos da história paulista (1870-1970).
Entre 1870 e 1891, o porto de Santos exportou 33 milhões de sacas de café; de 1892 até 1901, outros 44 milhões de sacas. Até o ano de 1900, o número de sacas exportadas era inferior a 6 milhões por ano; porém, em 1901, o número passa para 9,5 milhões, num incremento superior a 50%.
Outros números dão uma ideia da expansão do cultivo do ouro negro: em 1880, existiam em todo o estado de São Paulo 70 milhões de pés de café; em 1900, este número já alcançava 220 milhões de pés, e, em 1910, havia sido alcançada a marca de 700 milhões de plantas.
No período de 1902 a 1914, época em que o Prinz Sigismund navegava na Rota de Ouro e Prata, o porto de Santos exportou nada menos que 103 milhões de sacas de 60 quilos, o que representa 6,2 milhões de toneladas.
O ano de 1909 marcou o ápice da exportação pelo cais santista, com a cifra impressionante de 13,5 milhões de sacas - ou seja, num só ano foi exportado um terço de todo o escoamento de um período de 20 anos (entre 1870 e 1891).
Os navios que atracavam em Santos eram a válvula-mor na criação da riqueza advinda do cultivo do café: de um lado traziam os imigrantes, mão-de-obra nas plantações do interior, sem os quais nada era possível em termos de crescimento produtivo; do outro lado, escoavam o produto advindo do trabalho desses mesmos imigrantes. O que teria sido do crescimento da cidade de São Paulo, se não existisse ali perto um porto natural, protegido e de fácil acesso? A história teria sido outra!
A história do Prinz Sigismund continua com seu internamento, forçado pela guerra, no porto de Colón (Panamá), em agosto de 1914. Aí permaneceu até 1917, quando, com a declaração de guerra entre a Alemanha e os Estados Unidos, foi apreendido pelas autoridades deste último país e transformado em transporte da Marinha americana, com o nome de General W.C.Gorgas.
Ao terminar a Primeira Guerra Mundial, foi revendido a interesses particulares, guardando sempre o mesmo nome. Seu uso, entre 1919 e 1939, é obscuro, mas no início do segundo conflito encontrava-se registrado como propriedade da Cia. Libby, McNeill, da cidade de São Francisco (Estados Unidos).
É interessante notar que, apesar de sua respeitável idade - quase 40 anos -, o ex-Prinz Sigismund era ainda considerado pelo Registro Lloyd's como pertencente à máxima classe de classificação, ou seja, 100A1, aparecendo com o número 74.817 no livro de registro do ano de 1940.
Em novembro de 1941, foi afretado, junto ao Otsego (ex-Prinz Eitel Friedrich) pelo Departamento de Guerra do governo americano para o transporte de tropas entre Seattle (Washington - costa do Pacífico) e o Alasca.
Doze meses mais tarde, foi reformado pelo estaleiro de Lake Washington, em Seattle, e, no ano seguinte, o General W.C.Gorgas foi vendido às autoridades soviéticas - que procuravam, desesperadamente, reforçar sua frota mercante, face à ameaça nazista que se desenhava no horizonte.
Seu nome foi modificado para Mikhail Lomonosov. Seu uso, rotas e emprego permaneceram, então, envoltos no mistério tradicional das coisas ligadas às atividades marítimas dos navios que viajavam com a bandeira vermelha, da foice e do martelo, tremulando na popa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário