Qual a Origem da Expressão Italiana “Non Fare il Portoghese”? - Artigo
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A história tem muitas particularidades irresistíveis. Muitos acontecimentos motivaram a criação de curiosas expressões nos mais variados povos. Muitas dessas expressões revelam o contacto com outros povos, mas não são sempre simpáticas.
Aliás, existem expressões que até revelam maus valores ou preconceitos por parte de determinados povos. Por exemplo, em Itália, há uma expressão que nos rebaixa (portugueses), enquanto povo, a expressão é “non fare il portoghese”.
Esta expressão de origem italiana “Non Fare il Portoghese” tem uma história interessante, mas não muito justa. A expressão tem como significado “não seja português”. A expressão deve-se a um acontecimento que ocorreu em Roma e que remonta ao século XVI.
A expressão rapidamente foi muito usada, sendo aplicada no sentido de se querer beneficiar de um serviço sem pagar. Sendo praticamente desconhecida para os portugueses em Portugal, podemos dizer que o significado da expressão está próximo do significado de caloteiro.
Por isso, a expressão italiana “Non Fare il Portoghese” acaba por dar a imagem de que todos os portugueses são caloteiros. Tem claramente uma conotação pejorativa, sendo ainda associada a uma ideia de chico-espertismo e de mau pagador, sendo também usada no sentido de “paga o que deves”.
D. Manuel I foi um dos reis da 2ª Dinastia, aquela que ficou posteriormente conhecida por Dinastia de Avis ou Joanina. D. Manuel I nasceu em Alcochete, mais precisamente no dia 31 de maio de 1469, sendo filho de D. Fernando e de D. Beatriz.
Enquanto rei, D. Manuel recebeu o cognome de “O Venturoso”. Teve uma vida plena, repleta de conquistas, territoriais e amorosas, pois teve várias uniões ao longo da vida, destacando-se a união com D. Isabel.
Seguiu-se a união com D. Maria de Castela e, mais tarde, ainda houve a união com D. Leonor. No dia 13 de dezembro de 1521, D. Manuel veio a falecer em Belém.
O seu reinado ocorreu entre 1495 e 1521. Foi sucedido pelo seu filho, D. João III, “O Piedoso”, filho de D. Maria de Castela. O Rei D. Manuel I está na origem da expressão… mas tem o Papa como cúmplice!
D. Manuel I reinou Portugal num contexto particularmente favorável, com diversas descobertas importantes realizadas fora da Europa, que deram muito poder ao país.
D. Manuel I enviou ao Papa Leão X uma faustosa embaixada, com o objetivo de conquistar favores políticos. A embaixada portuguesa foi bem-sucedida na operação, reiterou a obediência ao papa Leão X e apresentou-lhe propostas aliciantes, destacando-se que a orientação política de D. Manuel I promoveria o fortalecimento doutrinário e institucional da Igreja Católica.
D. Manuel I pretendia afirmar o poder político de Portugal no quadro europeu, enquanto se desenhava a expansão do império português. Pelas ruas de Roma, desfilaram os portugueses a pedido do Rei, a 12 de março de 1514. Nesse dia, ocorreu o desfile que ficou para a história pela sumptuosidade dos trajes, sendo oferecidos presentes que indiciavam uma riqueza incomum, pois eram repletos de exotismo.
Portanto, a embaixada enviada por D. Manuel I ao Papa passeou pelas ruas há mais de 500 anos causando um forte impacto. O desfile foi memorável!
A embaixada portuguesa tinha diversos elementos. Mais de uma centena de pessoas. No entanto, só foi recebida pela corte papal dias mais tarde, mais precisamente no dia 20 de março de 1514, no Castelo Saint´Angelo.
O Papa Leão X só recebeu a embaixada de D. Manuel I dias depois da embaixada portuguesa ter encantado as pessoas presentes nas ruas de Roma. Tristão da Cunha foi o elemento que chefiava a embaixada, tendo Diogo de Pacheco e João de Faria como seus assessores. Garcia de Resende foi outro elemento da embaixada, sendo o secretário.
Foram inúmeros os presentes concedidos pela embaixada portuguesa, nomeadamente peças de joalharia, tecidos de elevada qualidade, dois leopardos, um jaguar, um cavalo árabe, entre outros presentes.
Contudo, o grande destaque foi para o elefante branco ou albino. Hanno (c. 1510 – 8 de junho de 1516) foi um presente que ficou para a história, tendo ficado conhecido como Annone, em italiano. O elefante oferecido por D. Manuel I tornou-se numa espécie de mascote do papa Leão X, causando grande sensação.
Contudo, apenas dois anos depois de chegar a Roma, Hanno adoeceu subitamente. O elefante acabou por morrer em 1516, mais precisamente no dia 8 de junho. Nesse dia, tinha o papa ao seu lado, tendo posteriormente sido sepultado no Cortile del Belvedere. A relação de Hanno com o Papa inspirou diversas histórias.
A embaixada impressionou tanto o Papa que ele decretou uma lei que isentava os portugueses do pagamento em diversos serviços, nomeadamente hospedarias, restaurantes, teatros, entre outras prerrogativas que seriam doravante gratuitas.
O português não seria um “mau pagador”, mas um “não pagador”, sendo um direito concedido por decreto papal. Este privilégio seria apenas concedido aos portugueses. Os portugueses gostam sempre de aproveitar uma boa borla, mas não são os únicos…
Ao se saber desta prerrogativa concedida aos portugueses não tardou a que essa informação inspirasse centenas de pessoas a querer aproveitar a borla. Por isso, mesmo não sendo portuguesas, fingiram sê-lo, de forma a não terem de pagar os ingressos nos eventos.
Os italianos começaram a fazer-se passar por portugueses (fare il portoghese) de forma a obterem regalias que não eram deles por direito. Foi daí que nasceu uma expressão que lesa a nossa reputação, Non fare il Portoghese (não faças de português). Uma expressão que visava repreender quem não pagava as suas contas.
O que começou por ser um privilégio concedido por decreto papal, tornou-se em algo pejorativo, lesando a imagem de um povo ao longo de séculos.
A imagem atribuída aos portugueses pelos italianos é profundamente injusta e cruel, tendo em conta que os portugueses até entraram em Roma a pagar e bem! A prerrogativa foi concedida como mera recompensa dada pelo Papa, por decreto papal, como forma de agradecimento pelos inúmeros presentes dados pela embaixada.
Mas a história da expressão diz mais sobre muitos italianos (não de todos, pois uma generalização tende a ser injusta) da época do que sobre os portugueses… O povo português é bastante trabalhador e humilde.
A Era dos Descobrimentos deu muito trabalho, custando muitas vidas. No entanto, o povo português deveria ter sido mais sensato na forma de investir o dinheiro, quando o seu trabalho deu o devido retorno… Está visto que a visita a Roma não terá tido os benefícios desejados…
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