O Tigre da Índia / O Tigre de Bengala 1959 - Der Tiger von Eschnapur
Alemanha / França / Itália - 101 minutos
Poster do filme
O arquiteto alemão Harald Berger (Paul Hubschmid) é chamado por Chandra (Walter Reyer / Marajá de Eschnapur) à Índia para construir escolas e hospitais. Harold logo que chega em Eschnapur se apaixona pela bela dançarina Seetha (Debra Paget) e é correspondido por ela. No entanto, ela já está prometida ao Marajá. Essa traição deixa irado o vingativo Chandra. Ao mesmo tempo o Príncipe Ramigani (René Deltgen / irmão de Chandra), movido pela inveja e apoiado por monges e nobres descontentes com o governo de Chandra, conspira tomar o Palácio de Eschanapur…
*Der Tiger von Eschnapur e a sequência Das Indishe Grabmal, juntos, formam um remake do original de 1921 (mudo). O filme original Das Indishe Grabmal teve roteiro escrito por Fritz e Thea von Harbour (sua esposa na época). Se basearam no romance de mesmo nome escrito por Thea. Lang foi definido para dirigir a versão silenciosa de 1921, mas o trabalho lhe foi tirado e dado a Joe May, porém mesmo não tendo controle do filme é um de seus filmes mais reverenciados.
*Os 2 filmes de 1959 foram editados e unidos em único filme de 95 min. na produção feita pela American International Pictures e lançado nos Estados Unidos com o nome Journey to the Lost City. As cenas das danças da personagem Seetha foram fortemente cortadas nesta versão.
*Esta aventura na Índia teve várias locações em lugares proibidos para filmagens devido a amizade pessoal de Fritz Lang com o Marajá de Udaipur. Exemplo o Palácio do Lago que só será visto novamente, muito mais tarde no filme 007-Octopussy em1983.
*Os negativos dos originais por muito tempo foram dados como perdidos. Felizmente recentemente foram descobertos, restaurados e liberados pela Image Entertainment em 2001.
A carreira de Fritz Lang se estendeu de 1919 a 1960, e contou com produções na Alemanha, seu país natal; na França e nos Estados Unidos, onde o cineasta passou vinte anos em exílio político, após fugir da Europa temendo ser perseguido pelo Partido Nazista. O último filme do diretor na terra do Tio Sam foi Suplício de Uma Alma (1956), depois do qual Lang se estabeleceu novamente em seu país de origem e realizou mais quatro filmes. O Tigre da Índia (ou O Tigre de Bengala e O Tigre de Eschnapur) foi o primeiro deles.
Tendo como base um projeto pessoal de levar às telas um livro de sua ex-esposa, Thea von Harbou, Fritz Lang lançou seu olhar para a Índia, fez um bom número de visitas ao país e dividiu a aventura em duas partes, sendo a primeira esta que hora escrevemos sobre, e a segunda, O Sepulcro Indiano, lançado cerca de dois meses depois.
A princípio, o diretor queria fazer um filme sobre o Taj Mahal. Encantava-lhe a história por trás do monumento e ele acreditava que tendo uma produção europeia, o filme ficaria exatamente como uma obra cinematográfica sobre o Taj Mahal deveria ser. Mas as dificuldades de levar adiante o ambicioso projeto fez com que o cineasta aceitasse a proposta menos ambiciosa de Artur Brauner (produtor polonês com mais de 300 filmes no currículo, atuante no período de 1946 a 2011!), que lhe oferecia um bojudo orçamento e liberdade criativa para filmar a história novelizada por Von Harbou, cuja origem foi um roteiro que o próprio Lang havia escrito com ela por volta de 1920.
A história de O Tigre da Índia guarda uma forte semelhança com os contos das Mil e Uma Noites, onde um estrangeiro chega a um local, encanta-se com o exotismo daquela terra e por uma bela mulher, cultiva a ira de um poderoso, é perseguido com afinco e tem um destino perigoso traçado, ponto em que a história é interrompida para ter continuação num outro capítulo, em outro dia – exatamente a dinâmica usada nesse roteiro, inclusive com o cliffhanger, um intrigante ponto de interrogação deixado para ser resolvido em O Sepulcro Indiano.
Harald Berger é um arquiteto europeu convidado pelo Marajá Chandra para projetar o que seria a nova face de Eschnapur, a cidade real. Sua chegada à Índia não é vista, mas o início de sua estadia sim, e antes mesmo de seu encontro com o príncipe, temos a primeira quebra dramática do roteiro, que consiste no encontro do protagonista com Seetha, a dançarina de Shiva por quem ele e o espectador se apaixonam. O que se segue é uma versão típica das “aventuras românticas orientais”, sejam elas do médio ou extremo Oriente: um golpe de Estado se estrutura nos bastidores, as aparências são mantidas mas o espectador sabe que há algo de podre no reino, e o amor que nasce entre os pombinhos protagonistas já traz consigo uma semente de tragédia.
Há um quê de banal na história, mas Fritz Lang filma a trama de modo tão preciso e tão elegante, que é impossível se chatear durante a sessão. A montagem também ajuda bastante, com um ritmo equilibrado durante todo o tempo, mesmo quando o roteiro apresente o seu plot de perigo, algo que geralmente faz com que o andamento mude completamente e sem aviso.
Todavia, o que realmente se destaca em O Tigre da Índia é o seu apuro estético, encabeçado por todo o desenho de produção e pela incrível fotografia. Há um rigor tremendo no uso de cores, tons e adereços dos figurinos (excelentes, por sinal), nas paredes, chão e decoração dos jardins, salões e outros ambientes internos visitados pela câmera. O interior do palácio do Marajá impressiona não só pela construção distinta de cada cômodo, mas por locais como a gruta dos leprosos e o labirinto de passagens secretas que ligam o templo a outros lugares do prédio. A predominância do branco e do amarelo tanto no cenário quanto nos figurinos nos dá uma impressão ainda mais exótica e contrastante com a realidade que se desenvolve na tela, uma ótima sacada do diretor e sua equipe técnica.
O Tigre da Índia é uma aventura romântica muito divertida e realidade com grande apuro visual. Eu já citei a aparência banal da história narrada, mas o modo como a vemos faz com que se mantenha em alta conta, mesmo se considerarmos uma incômoda linha de pensamento que destaca a superioridade dos europeus frente aos hindus. De qualquer forma, o filme marca com graça a fase final da carreira de Fritz Lang e, embora não traga os elementos críticos tão presentes em suas obras anteriores, nos brinda com uma concepção visual deslumbrante, fazendo-nos voltar no tempo, para os cenários grandiosos utilizados pelo diretor do díptico dos Nibelungos ou em Metropolis. O mesmo homem, a mesma mão poderosa na direção e concepção de um filme, um outro tempo. Impossível não querer ver um fruto dessa fase.
Nenhum comentário:
Postar um comentário