sábado, 16 de novembro de 2019

Os Muito Sotaques na História da Vocação para os Negócios da Cidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, Artigo


Os Muito Sotaques na História da Vocação para os Negócios da Cidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, Artigo
Ribeirão Preto - SP
Artigo

O café colocou Ribeirão Preto na rota do desenvolvimento, logo no início da sua história. A primeira grande produção agrícola da cidade ganhou força na terra de qualidade, no clima apropriado e no engajamento de fazendeiros que vieram de outras regiões. A evolução foi tão rápida que a cidade, fundada em 1856, teve suas primeiras lavouras plantadas em 1870 e, 30 anos depois, o café produzido no município era conhecido por todos os lados, principalmente na Europa. A oferta de mão de obra impulsionou a vinda de imigrantes e também a chegada da Estação Companhia Mogiana de Estrada de Ferro, em 1883.
Segundo a historiadora e fotógrafa Tania Registro, a população do município, que, em 1874, era de 5.552 pessoas — 4.695 livres e 857 escravos —, em 1890 alcançou a marca de 12.033 habitantes, sendo que 1.182 deles eram imigrantes. Em 1902, a população já era de 52.910 habitantes, sendo 33.199 estrangeiros, dos quais 27.765 eram italianos.
No cenário da ascensão cafeeira, um dos nomes de maior destaque foi o do empreendedor prussiano Francisco Schmidt, que, a partir de 1890, escreveu um novo capítulo na história da fazenda Monte Alegre, marcado pela prosperidade econômica e pelo desenvolvimento estrutural. Foi durante a fase áurea do café que Ribeirão Preto começou a desenvolver as atividades de comércio, indústria e de prestação de serviços. Tania conta que, entre 1911 e 1930, as rendas urbanas, representadas pelos impostos — indústrias e profissões, predial, veículos e viação urbana —, foram responsáveis por 44% da arrecadação municipal.
Artífices, pedreiros, fotógrafos, entre outros profissionais liberais de descendência estrangeira, principalmente europeia e asiática — japonesa, no caso — introduziram costumes, olhares e sabores inovadores, contribuindo para formar um novo perfil cultural, econômico e social. “Era uma cidade rica e repleta de diversas identidades culturais, às quais também se fazem presentes brasileiros vindos de outras regiões, como Minas Gerais, Nordeste, além dos afrodescendentes. Entre alguns nomes, citamos os fotógrafos: os alemães João Passig e Ernesto Kühn; os italianos Aristides Muscari, Rainero Maggiori, João Baptista Lami e Romildo Cantarelli; entre os japoneses, a família Miyasaka”, destaca a historiadora.
Nesse período, Ribeirão Preto também começava a se industrializar. Em 1913, foi instalada na cidade a Cia. Cervejaria Paulista, por iniciativa de descendentes de imigrantes alemães. A primeira diretoria da empresa era composta pelo presidente João Alves Meira Junior, o gerente Alfio Messina e o diretor-técnico Hanz Scherholz. Em um ano, a nova fábrica da Cervejaria foi transferida para a Avenida Jerônimo Gonçalves, às margens do córrego Ribeirão Preto, próxima à Estação Companhia Mogiana de Estrada de Ferro. Na margem oposta do córrego, estava instalada outra fábrica de bebida, a Cia. Antárctica Paulista, fundada em 1911. O conjunto formava um dos principais cartões postais da cidade.
A Cia. Cervejaria Paulista se desenvolveu no contexto econômico do ciclo do café, dos coronéis, dos cassinos, da imigração europeia e do desenvolvimento urbano. Desde a inauguração até a década de 1970, a fábrica de bebidas foi, juntamente com a Cia. Antárctica Paulista, uma das responsáveis pelo desenvolvimento urbano de Ribeirão Preto. Juntas, elas geraram inúmeros empregos e contribuíram para a formação de mão de obra especializada, formada maioritariamente por imigrantes. A Cia. Paulista foi, ainda, precursora dos investimentos imobiliários que injetaram significativas cifras nas finanças locais em meio à crise econômica mundial, iniciada em 1929 e que encerrou a fase próspera do café na região.
Em 1930, a Cia. Paulista inaugurou um teatro de ópera (o Theatro Pedro II), um edifício comercial (o Meira Junior) e um hotel (o Palace) no chamado Quarteirão Paulista. Esses investimentos contribuíram para reafirmar e fortalecer o perfil da economia local, reconhecido até os dias atuais: uma cidade prestadora de serviços. Paralelo a isso, com a queda da agricultura do café, as terras foram, então, ocupadas com outras culturas, como o algodão e as frutas. Aos poucos, a cana-de-açúcar também começava a ser introduzida e um novo ciclo econômico surgiu.
O inusitado aconteceu em 1973, quando a Cia Cervejaria Paulista se fundiu à grande rival: a Cia. Antárctica Paulista. Algumas fusões e aquisições depois, a Antarctica Niger foi vendida para a canadense Molson Coors Brewing Company, que, em 2003, desativou a fábrica de Ribeirão Preto. Poucos anos depois, a empresa encerrou sua participação no mercado brasileiro de cervejas. Hoje, o grupo é liderado pela mexicana Femsa, mas, definitivamente, as atividades foram encerradas na cidade, que mantém a tradição na fabricação da bebida, principalmente nas produções artesanais.
Também foram os imigrantes que instalaram na cidade, no início do século passado, uma das entidades de classe mais importantes da região: a Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (ACIRP). Desde sua criação, em 1904, o grupo se propôs a ser a voz do empresariado local, que, na época, chegava atraído pelas grandes fazendas de café da região. A primeira diretoria da entidade foi formada pelos empresários de origem estrangeira Albano José de Carvalho, André Martins de Andrade, Antonio Garcia de Souza, Dib Khattar, Jerônimo Hipólito, João Beschizza, José Antunes Tavares Teixeira e Pedro Marzola, além dos dois filhos de imigrantes Antonio Diederichsen e José Osório de Siqueira.
Antonio Diederichsen, o presidente da entidade, nasceu em São Paulo, mas passou boa parte de sua vida estudando na Alemanha. Foi lá que cursou Agronomia e, de volta ao Brasil, trabalhou na Fazenda Santa Adelaide, de propriedade de seu tio Arthur Diederichsen. Na ocasião, foi anunciada a falência do Banco Construtor e Auxiliar de Santos, que possuía, em Ribeirão Preto, uma oficina mecânica, uma fundição e uma serraria. Diederichsen firmou sociedade com João Hibbeln e assim nasceu a Diederichsen & Hibbeln. Em 1916, com o advento da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a sociedade foi desfeita e Diederichsen deu participação na empresa para seus auxiliares diretos: Manoel Pena, Germano Reinel da Silva e Guido Gambini.
O progresso e a cidade exigiram a expansão dos negócios, então, foi construído o edifício do Antigo Banco Construtor, que abrigou a maior casa de materiais de construção da região. Empreendedor nato, Diederichsen investiu em outros edifícios — entre eles, o o primeiro prédio multifuncional do interior do Brasil —, e também passou a representar a empresa Byington & Cia., concessionária Chevrolet. Em 1934, começou a vender os veículos da Ford e, 30 anos depois, passou a ser concessionária Volkswagen. Diederichsen faleceu em 1955 e Manoel Penna deu continuidade à empresa, que depois passou a ser comandada por seus herdeiros. Com a sequência dos negócios, surgiu, em 1965, o Grupo Santa Emília, nome escolhido em homenagem à mãe de Manoel.
Enquanto isso, a ACI continuava se desenvolvendo e ampliando seu leque de serviços aos empresários, seja do comércio, da prestação de serviços ou da indústria. Nesse período, também é importante destacar a atuação do presidente Amin Antônio Calil, que esteve à frente da entidade em duas oportunidades, promovendo o crescimento, a estruturação e a modernização da Entidade.
Amin foi um dos maiores símbolos do comércio e da indústria de Ribeirão Preto por ter habilidade em aliar interesses. Nascido em Altinópolis e formado em farmácia pela USP, trabalhou no ramo do comércio com seus irmãos e fundou, em 1942, o Sindicato do Comércio Varejista e o Sindicato do Turismo e Hospitalidade. Também foi um dos fundadores da Confederação Nacional do Comércio e da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e trouxe para Ribeirão Preto o Senai e o Sesc, além de ter sido um dos responsáveis pela criação da faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Junto com os irmãos, fundou a loja A Modelar, um marco no comércio local.
Outro nome de destaque na ACI é o de Geraldo Meira Silva, membro da Associação por 50 anos e presidente por seis vezes. Formado em Ciências Econômicas, foi o primeiro empresário do interior a ocupar a vice-presidência da Associação Comercial de São Paulo, durante 15 anos. Foi superintendente da Federação das Associações Comerciais e Industriais de São Paulo, vice-presidente do Banespa, da Vasp, além de dirigir a Coderp.
Entre os Diederichsen, ainda antes de Antonio, Artur fez história na cidade. Filho de um negociante alemão e de uma brasileira, bisneta de José Bonifácio, o Patriarca da Independência do Brasil, Artur estudou na Alemanha e, no fim do século XIX, já aparecia entre os grandes proprietários da região de Ribeirão Preto, quando a expansão cafeeira alcançava altos índices de produtividade. Era diretor-tesoureiro da Sociedade Paulista de Agricultura e Indústria, que respondia por grande parte da produção de café e de gado, e proprietário da fazenda Monte Alegre, adquirida em 1890 em sociedade com Francisco Schmidt. Ao longo da vida, tornou-se proprietário de mais de 30 fazendas nos estados de São Paulo e Mato Grosso, além outros diversos negócios.
A história da família Diederichsen no Brasil está associada a Theodor Wille, que chegou ao porto de Santos como vice-cônsul da Prússia, em 1844, e criou a Theodor Wille & Cia, que se tornaria uma das principais exportadoras de café de São Paulo, parte de um conglomerado internacional com negócios em mais de 30 países. Os Diederichsen trabalhavam nos escritórios da matriz da Theodor Wille na Europa e cuidavam também dos interesses da empresa em São Paulo, respondendo pela intermediação junto ao governo e articulando a empresa ao grande capital cafeeiro paulista.
Após a proclamação da República, em 1889, Diederichsen se tornou líder do Partido Republicano Paulista (PRP) na região de Ribeirão Preto e, a partir de 1891, integrou a Guarda Nacional da cidade alcançando o posto de coronel. Assumiu seu primeiro cargo político ao ser eleito vereador e tomou posse no Conselho de Intendência de Ribeirão Preto. Foi escolhido presidente do Conselho, assumindo o cargo de intendente, com mandato executivo, e passando assim a responder pela administração municipal. Em 1897, foi eleito deputado federal por São Paulo.
Concluído o segundo mandato, Diederichsen voltou a se dedicar a seus negócios e a um grande novo empreendimento classificado como “epopeia colossal”: a abertura da frente pioneira de ocupação no extremo oeste do Estado de São Paulo, antecipando a chegada da ferrovia. Os negócios da empresa foram expandidos e diversificados: compra de gado no Mato Grosso e venda aos criadores do Estado de São Paulo, transporte pela Boiadeira, exploração da travessia em balsa pelo rio Paraná, e aluguel de pousos e pastos e colonização de terras. A companhia chegou a acumular 510 mil hectares de terras em São Paulo e em Mato Grosso.
Estimativas apontam que 80% das famílias que moravam em Ribeirão Preto, no início do século XX, eram italianas e que, provavelmente, esse número tenha crescido ainda mais ao longo do tempo. Um dos sobrenomes que se destacam na história da cidade, atuando ativamente até hoje, é dos Biagi. Nascido na região do Vêneto, Pedro veio para o Brasil, ainda criança, em 1888. Foi na região de Ribeirão Preto que ele deu início à história de prosperidade da família. Seus filhos, Maurilio, Baudílio e Gaudêncio imprimiram seus nomes em diversos negócios.
Maurilio foi um homem com visão para novos empreendimentos. Formado contador, desde jovem, trabalhou ao lado do pai e dos irmãos. Em 1936, comprou com outros sócios a Usina Santa Elisa, que, sob sua administração, foi transformada de um pequeno engenho em uma das mais bem equipadas usinas de açúcar e álcool da região. Pioneiro e expoente do agronegócio, investiu em recursos técnicos e humanos para a criação e o desenvolvimento de um diversificado conjunto de empresas divididas em três grandes grupos: Zanini, Refrescos Ipiranga e Usina Santa Elisa. Ainda com o sócio Luiz Vicente Lunardi, constituiu a Agropecuária Lagoa da Serra.
Antes dos Biagi, outros italianos, os Matarazzo, também marcado presença forte em Ribeirão Preto. O Conde Francisco Matarazzo, fundador e presidente da Sociedade Anônima F. Matarazzo, nasceu na Itália, em 1854, e chegou ao Brasil em 1881, em Sorocaba, onde se dedicou inicialmente ao comércio rural. Logo começou a fabricar banha de porco, fundando com seu irmão a indústria Matarazzo & Irmãos. Francisco se mudou para São Paulo, onde inaugurou um moinho de trigo, em 1900. Em 1917, em reconhecimento aos serviços e atribuições prestados à Itália durante a Primeira Guerra Mundial, recebeu do Rei Vitor Emanuel o título de Conde.
As Indústrias Reunidas F. Matarazzo, produtoras de tecidos, latas, óleos comestíveis, açúcar, sabão, presunto, pregos, velas, louças e azulejos, além de proprietárias de um banco, uma frota particular de navios, um terminal exclusivo no porto de Santos e duas locomotivas para transportar mercadorias no pátio da sede do complexo industrial, em São Paulo, ocuparam um papel de suma importância no processo de industrialização do Estado de São Paulo e do Brasil. A empresa de Francisco Matarazzo esteve presente em Ribeirão Preto desde 1936. Texto da Revide.

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