Bentley Mulsanne L, Inglaterra - Jeremy Clarkson
Fotografia
Eu estava gravando a nova temporada do game show Who
Wants to Be a Millionaire? e, num dos programas, havia uma pastora alegre
e rechonchuda e alguém que parecia pertencer a um café de artistas da Paris de
1962.
Ambos eram seres humanos. Ambos moravam em uma mesma
pequena colina engraçada do Atlântico Norte. E ambos tinham interesses semelhantes:
ir a programas de perguntas e respostas.
Mas eles eram totalmente diferentes. E isso me leva aos
carros. De acordo com o dicionário, um carro é um veículo rodoviário,
tipicamente com quatro rodas, capaz de levar um pequeno número de pessoas.
Então o novo Suzuki Swift é um carro. E o novo Bentley
Mulsanne de entre-eixos estendido também. Mas isso não significa que eles sejam
iguais. Porque, realmente, eles não são.
Who Wants to Be a Millionaire? é filmado em
Manchester, o que é longe o suficiente de Londres para tornar uma viagem de
trem a escolha óbvia.
Sim, os banheiros têm difteria e frequentemente você pode
acabar sentado ao lado de um escocês construindo uma pirâmide de latas vazias
de cerveja.
Mas é confortável e tão rápido que, quando você começa a
pensar por que os britânicos precisam dessa linha, já chegou.
Já de carro você tem de pegar a rodovia M40, que está
interditada porque os policiais têm de pegar um espelho que caiu de um carro, a
M42, que está engarrafada por pessoas fugindo do horror de Birmingham.
Depois, a M6, que está interditada porque furou o pneu de
alguém e os policiais precisam tirar uma soneca enquanto aguardam a chegada de
um mecânico para trocar o pneu.
Por isso, usar um carro para ir de Londres a Manchester é
uma burrice. Se o carro for um Suzuki Swift. Mas, se o carro em questão for a
outra ponta da escala, como o já mencionado Bentley Mulsanne de entre-eixos
longo, é outra história.
Como é dirigir? Não é importante, porque outra pessoa
fará isso. Em um carro como esse você senta em um dos bancos de trás, onde há
tanto espaço para as pernas que não consegui tocar o assento dianteiro com meus
pés.
Nem quando baixei meu assento ridiculamente macio para
uma posição que a maioria das empresas aéreas chama de cama.
E como é a sensação? É como estar em uma daquelas suítes
que a Emirates tem na parte da frente do Airbus A380.
Entre os dois assentos traseiros deste Mulsanne,
carregado de acessórios, há um frigobar com uma porta de vidro jateado que
desliza para baixo ao toque de um botão, revelando duas garrafas de vinho rosé
e quatro taças.
Mais para a frente, há um compartimento contendo duas
mesas dobráveis, para o caso de você não querer usar a mesa que está a 4 metros
de você, na parte de trás do assento dianteiro.
E você também tem diversas entradas USB e em torno de um
milhão de botões. Alguns permitem escolher que tipo de massagem você deseja e
que canal de TV quer assistir.
Outros são usados para fechar as cortinas – algo que você
vai querer fazer se o motorista de uma van na outra faixa começar a olhar para
você. E os outros? Não sei. Eu não ousei apertá-los, já que algum deles poderia
ejetar meu motorista pelo teto solar.
Bom, engenhocas operadas eletricamente são ótimas, mas
luxo não pode ser medido por reostatos. Na verdade, ele não pode ser
propriamente medido. É uma sensação. E tem a ver com coisas intangíveis, tais
como espaço e iluminação. E, a bordo de um carro, conforto.
E nesse quesito o Bentley recebe nota máxima. Ele não
flutua. Você está sempre ciente de que está em um carro que está em uma
estrada, mas nunca realmente percebe que a estrada foi construída e então
remendada por pessoas que não podiam esperar a hora de ir para o bar.
Deixe-me colocar da seguinte forma: ele é tão confortável
quanto é possível para um automóvel.
Ele também passa uma sensação de robustez. Há aquele
sentimento de que o carro pode bater de frente com uma grande jamanta e, no
banco de trás, você só vai saber quando aparecer a notícia no seu celular.
Talvez sua solidez, seu senso de peso, seja uma razão
pela qual ele trafega tão bem: ele simplesmente “nivela” as irregularidades.
O motorista me contou que o tamanho do carro é um ligeiro
incômodo em estacionamentos de supermercados, mas eu não consigo imaginar que
isso alguma hora vá ser um problema para seu dono.
Bem como o consumo de combustível. E seu desempenho, que
tenho certeza de que é considerável, mas totalmente irrelevante.
O V8 de 6,75 litros do Mulsanne é, de fato, mais velho do
que eu. Ele é uma das unidades mais antigas ainda em produção no planeta,
mantendo-se basicamente inalterado desde 1959.
Eu adoraria dizer que isso é ruim, mas nunca ouvi ou
senti o motor, por isso não acho que seja, de forma alguma, importante. A
última vez que voltei de Manchester para Londres, usei um helicóptero.
Ele era barulhento e sem graça, e não sobrevoamos nada
interessante. Sim, ele era rápido, mas – e não estou brincando – eu preferiria
sair mais cedo no banco de trás de um Mulsanne.
E isso se aplica a quase todas as jornadas, em relação a
qualquer concorrência. Um jato privado para o sul da França?
Sim, mas você tem de ir até Farnborough e então sentar em
uma sala repleta de chatos, lendo revistas cheias de propagandas de relógios
até que chegue a hora do seu voo, no qual você beberá champanhe de uma garrafa
com tampa de rosca e comerá sanduíches de queijo enrolados.
Melhor sair um dia antes e ir de Mulsanne. É um lugar
adorável para se sentar, adorável para estar, uma forma adorável de viajar e
uma adorável peça de engenharia oculta sob um adorável verniz de mão de obra
artesanal.
Se um produtor de documentários alienígena encontrasse o
Mulsanne em uma missão exploratória à Terra, ele deduziria que os seres humanos
viajam com grande conforto e em silêncio quase total. Ah, se eles estivessem
certos…
Sim, ele não é muito bonito. Você pode chamá-lo até de
feioso. Mas considere isto: seu único concorrente real é o Rolls-Royce Phantom.
Que é ainda mais feio.
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