Mercedes Benz G 63, Alemanha - Jeremy Clarkson
Fotografia
Com dobradiças aparentes e chassi de carruagem, o
Mercedes G 63 mantém o espírito da Primeira Guerra, mas tem tudo para encantar
sua criança interior
A rodovia M1 é a espinha dorsal da Grã-Bretanha.
Todos os dias cerca de 140.000 veículos trafegam por ela. Por isso, é vital
para o bem da nação – e nossa sanidade – que seja mantida aberta e fluindo.
Qualquer um com um mínimo de bom senso deveria perceber
isso. Só que não. Porque um trecho de 21 km foi fechado por 12 noites.
Trabalhadores que convertiam o acostamento numa quarta
faixa precisariam remover algumas árvores, mas não pelos métodos tradicionais,
porque o barulho das árvores caindo poderia acordar uma família de ratinhos
silvestres que hibernava ali.
Então, os trabalhadores foram forçados, andando na ponta
dos pés, a estacionar os guindastes na pista, para que as árvores pudessem ser
arrancadas com cuidado e em silêncio, antes de serem carregadas em caminhões
que as aguardavam.
Como é que é? Isso não ia acordar os bichinhos?
O fato é que apenas 2% da Grã-Bretanha é pavimentada. E o
resto é verde. O que significa que os ratinhos têm um monte de lugares
para morar, e lamento, mas se uma dúzia deles tem de ser acordada para manter a
espinha dorsal da Grã-Bretanha funcionando, então que seja.
Mas vivemos em tempos estranhos, em que o motorista fica
abaixo da salamandra e do morcego na ordem de prioridades.
E certamente estamos muito abaixo dos pedestres. O
instituto Health Watchdog anunciou que, quando estradas são construídas, quem
está a pé deve ter prioridade em relação aos motoristas.
A vice-presidente disse até que deseja que as estradas
sejam tão atraentes que as pessoas se sintam incentivadas a largar o volante e
caminhar.
Sim, e talvez em vez de coletes salva-vidas, aviões
deveriam ter paraquedas, para que passageiros que estejam sobrevoando uma bela
paisagem do mundo possam saltar e fazer um passeio pelo lugar.
Nossos gloriosos líderes estão até pensando em instalar
rotatórias estilo holandês, para facilitar a vida da espécie no topo da
hierarquia social – o ciclista.
Há uma rotatória dupla onde eu moro, e em teoria ela não
é complicada. Mas ela confunde qualquer um que a encontre. As pessoas ficam
paradas ali por horas, catatônicas pelo espanto e confusão.
A rotatória holandesa tem um anel externo para ciclistas.
Você dá a preferência a eles e, quando não houver mais nenhum, um carro por vez
pode cruzar para o anel interior, que funciona como uma rotatória normal. Não
funciona. É muito confuso.
Mas é o que nossos líderes desejam: que nós fiquemos
confusos.
Eles querem que fiquemos presos em um engarrafamento de
80 km causado por ratinhos dormindo. Eu sempre disse que se o automóvel tivesse
sido inventado ontem, nenhum governo da Terra permitiria que a população em
geral o usasse.
Ele seria reservado para os militares e serviços de
emergência. A ideia de que você, um contador, pudesse usar um para visitar seus
avós no interior, seria risível.
Mas como tivemos essa liberdade por mais de 100 anos,
agora eles não podem simplesmente tirá-la. Então, estão incomodando tanto a
vida do viajante independente que terminamos desistindo e tomando um dos seus
ônibus.
E é por isso que você não pode evitar sorrir quando
descobre que a Mercedes acabou de lançar o seu G-Wagen, ou Mercedes-AMG G 63,
como ele é chamado agora.
O modelo antigo era, de fato, um caminhão
militar. Projetado nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, era
feito de carvão e latão e guarnecido com bordas afiadas e pontos onde você
podia montar uma metralhadora Spandau.
Mas, então, no final do século 20, alguém resolveu que,
se fosse equipado com um motor movido a gasolina em vez de vapor e revestissem
o interior com couro, ele poderia ser usado por civis.
Apesar do seu preço ridiculamente alto, deu certo.
Impulsionadas talvez pelo desejo de não ser mais um motorista de Range Rover,
as pessoas compraram G-Wagens e andaram por aí neles, achando que estavam passando
uma imagem descolada.
E estavam. Mas, Deus do Céu, eles eram terríveis de
dirigir. E apertados. E beberrões. E burros.
O novo modelo tenta lidar com esses pontos fracos. E
então, em vez de um sistema de direção feito de esperança, ele possui um conjunto
de cremalheira e pinhão eletromecânico.
E em vez de uma suspensão dianteira feita de pedaços de
um navio de guerra alemão, ele traz braços sobrepostos. Mas continua tendo um
chassi de longarinas. Como uma carruagem.
Isso significa que, embora continue irrequieto enquanto
você dirige, ele vai mesmo para onde você quer que vá. E como ele é maior do
que suas versões anteriores, você não se sente mais esmagado lá dentro.
Por fora ele é bem parecido com o modelo antigo: robusto,
forte e com estilo militar. Você ainda tem dobradiças aparentes e portas que
você tem de bater forte – bem forte – para que realmente fechem.
Mas por dentro ele é totalmente diferente. Você tem telas
com meio metro de largura e um sistema de iluminação que deixariam a boate
Pacha, em Ibiza, com vergonha.
Todo adolescente que viu e sentou no G-Wagen que eu
estava testando queria um imediatamente. E minha criança interior de nove anos
também.
Eu gostei especialmente do motor, um V8 biturbo que
desenvolve 585 cv e um torque de 86,7 mkgf, de romper os pulmões. Isso
significa que você pode chegar a 100 km/h em 4,5 segundos, e isso é hilário.
Mas não tão hilário quanto os escapamentos que saem pelas
laterais do carro, não na traseira. Por quê? Ora, por que não?
Você poderia imaginar que, como ele foi ajustado para a
vida nas cidades, parte de sua capacidade off-road se perdeu. Talvez sim.
Mas o carro continua tendo uma enorme distância livre em
relação ao solo e descobri que, mesmo com pneus de estrada, ele lidou melhor
com uma estradinha de terra até do que o Land Rover mais lameiro.
Eu ainda escolheria ter um Range Rover. Ele tem mais
dignidade. E não é tão caro.
Mas eu adorei o G-Wagen, sobretudo porque simplesmente
não há outro carro fabricado hoje em dia que enfrente tão firmemente a
tempestade anticarros sem sentido que vem de todos os outros lugares.
Este é um carro que genuinamente desafia ciclistas, ratos
silvestres e vigilantes do governo. E só por isso eu desejo o melhor para ele.
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