domingo, 6 de fevereiro de 2022

A Demolição da Igreja e do Convento do Carmo Para a Construção do Novo Palácio do Congresso Paulista, São Paulo, Brasil - Artigo

 


O Convento e a Igreja no final do século XIX.

O antigo Palácio, considerado inadequado para as necessidades dos congressistas.

Imagem de 1929 mostrando o Convento já demolido e parte da estrutura da Igreja destruída.

Imagem de 1930 mostrando o que restou da Igreja.

Ilustração do projeto vencedor do concurso (nunca realizado).

A área do Convento demolido (à direita) ficou sem uso por mais de 10 anos.

O Palácio Clóvis Ribeiro em obras.

Ilustração do projeto da nova Igreja do Carmo, apresentado em 1929.


A atual Paróquia Matriz Nossa Senhora do Carmo de São Paulo.





A Demolição da Igreja e do Convento do Carmo Para a Construção do Novo Palácio do Congresso Paulista, São Paulo, Brasil - Artigo
São Paulo - SP
Fotografia


Era a década de 1920 e São Paulo passava por profundas transformações urbanísticas, fruto do acelerado crescimento que a cidade apresentava, crescimento esse oriundo das riquezas proporcionadas pelo café e pela cada vez maior industrialização.
Essa transformação intensa não poupou os resquícios da São Paulo colonial ou mesmo imperial, onde tudo que parecia antigo vinha abaixo em nome de uma modernidade quase utópica que desproveu a cidade de inúmeros bens históricos. Construções de outros séculos vieram abaixo e junto delas igrejas históricas como a velha Sé.
Essa sanha demolidora por pouco não colocou abaixo por completo aquele que é um dos mais importantes templos católicos da capital paulista: a Igreja da Ordem Terceira do Carmo.
Em outro artigo do blog (História do Congresso Paulista) contei a história do antigo Palácio do Congresso de São Paulo, edificação que abrigou o Poder Legislativo paulista entre o fim do século XIX e o ano de 1937. Esse artigo é o início da história aqui contada (recomenda-se a leitura para um melhor entendimento do presente post).
Dito isso, corria o ano de 1926 e os congressistas de São Paulo reclamavam muito das condições do velho palácio legislativo da Praça Dr. João Mendes. De dimensões modestas o imóvel já não atendia as necessidades de deputados e senadores, que viam como urgente a necessidade de se construir um novo palácio.
Para isso precisavam de uma área ampla na região central que pudesse abrigar a nova estrutura já que mesmo demolindo o palácio antigo não haveria espaço suficiente para o que eles almejavam. Foi assim que em 1927 as atenções dos políticos paulistas se voltaram para o local onde estavam localizados a igreja e o convento da Ordem Carmelitana. A pressão junto ao então governador de São Paulo Júlio Prestes foi tamanha que em 1928 ele determinou a desapropriação da área.
Era o fim da linha para duas das mais antigas construções da cidade de São Paulo, já que o convento surgiu ainda no século XVI. A igreja, por sua vez, era mais recente, tendo sido construída entre 1747 e 1758, sendo reformulada entre 1772 e 1802 pelo famoso Tebas, arquiteto negro que foi responsável por várias obras na São Paulo daquele tempo.
Uma das justificativas para a demolição é que a ordem religiosa já possuía um amplo terreno na Rua Martiniano de Carvalho, bairro da Bela Vista, podendo lá erguer seu novo complexo.
E assim, em 1928, começava a demolição das edificações, inicialmente pelo convento, no que parecia ser o fim da linha da Ordem Terceira do Carmo naquela área do centro da cidade.
O concurso de projetos para a construção do novo palácio:
Para o novo palácio foram criadas grandes expectativas, afinal a ideia dominante entre deputados e senadores paulistas era que o novo edifício fosse grandioso e mostrasse em seus traços arquitetônicos a riqueza e importância de São Paulo.
Com o objetivo de, ao menos teoricamente, fazer da escolha do novo palácio algo democrático, foi decidido em 1928 que seria criado um concurso público onde engenheiros e arquitetos poderiam enviar seus projetos, sendo que um deles seria escolhido e premiado.
O concurso atraiu interessados não somente de São Paulo mas de todos os cantos do país, sendo apresentados vários projetos para o novo palácio. Os quinze melhores projetos foram selecionados para uma segunda fase, sendo expostos para a apreciação dos paulistanos.
"Os ante-projectos do Palácio do Congresso são cópias de estylos antigos".
A nota acima é do extinto jornal paulistano "A Gazeta" e exprime o sentimento de muitos que foram ver os projetos expostos para o público no Palácio da Indústrias. Tal qual no projeto do Theatro Municipal de São Paulo e tantas outras importantes construções, a crítica era a falta de ousadia e inovação dos projetos selecionados, que mais pareciam cópias de outros palácios mundo afora.
O maior crítico dos projetos selecionados talvez tenha sido o arquiteto e escritor Flávio de Carvalho, um dos ícones da geração modernista brasileira. Em entrevista à mesma Gazeta, disse que quase todos os projetos eram oriundos de trabalhos de pura cópia ou de “preguiça de raciocinar“ (palavras do autor). Apesar do tom das críticas o concurso seguiu até o seu final.
De todos os projetos apresentados apenas dois eram considerados realmente contemporâneos e modernos, respectivamente chamados de Anhanguera e Efficacia. Os demais pareciam similares a outros lugares já existentes, um deles inclusive bastante criticado por parecer cópia do congresso da Argentina.
Dos quinze projetos selecionados seriam escolhidos três finalistas, que receberiam prêmios em dinheiro. Respectivamente, do primeiro ao terceiro colocado, as premiações seriam de 30, 15 e 10 contos de Réis.
O projeto vencedor do concurso público foi o denominado Cleon, de autoria de Plínio Botelho do Amaral, na época um jovem arquiteto de 24 anos de idade. Mais tarde ele viria a se tornar bastante conhecido por projetar o Edifício Altino Arantes (atual Farol Santander).
Com o projeto escolhido e a demolição quase completa, restando apenas a igreja da Ordem Terceira do Carmo, parecia que agora era questão de tempo para o novo palácio surgir. Mas não foi isso que aconteceu. Um fato histórico viria a causar a paralização dos trabalhos e o abandono da ideia de construção do novo palácio.
A Revolução de 1930 e a forçada mudança de planos:
Como tudo no Brasil tende a demorar ou a mergulhar em um mar de burocracia, as obras do futuro palácio também sofreram desse mal. E essa demora tanto para o início das obras quanto para a conclusão das demolições colocariam por terra a construção do novo palácio.
A Revolução de 1930 virou a política brasileira do avesso. Foi o fim da República do Café com Leite e o início da longa era Vargas (com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, o Congresso Nacional e os seus respectivos estaduais foram fechados, paralisando totalmente as obras do futuro palácio).
Assim a igreja do Carmo foi poupada e reformada, voltando a ser utilizada normalmente, sobrevivendo até os nossos dias atuais (e tomara que assim continue). 
Quando as atividades parlamentares retornaram em 1935, os trabalhos continuaram a ser realizados no antigo palácio da Praça Dr. João Mendes. Em 1939 o então governador de São Paulo, Adhemar de Barros, determinou que a assembleia paulista mudasse para o Palácio das Indústrias, agora renomeado Palácio 9 de Julho.
Com isso o velho palácio seria demolido em 1940 e o projeto do novo palácio enterrado de vez. 
A Assembleia Legislativa só teria um palácio novo, de fato, em 1968 com a inauguração de sua sede definitiva no Ibirapuera.
Apesar da igreja salva podemos concluir que a demolição do convento havia sido em vão. Mas essa história iria mudar em breve...
Surge um "gigante":
Adhemar de Barros não iria deixar aquele terreno vazio em área tão valorizada da cidade por muito mais tempo. O governo de São Paulo encomendou ao arquiteto Ferrucio Julio Pinotti um projeto de um novo edifício para o local. E assim, em 1941, iniciam-se as obras do Palácio Clóvis Ribeiro, mais conhecido como prédio da Secretaria da Fazenda.
Por fim o que foi construído no lugar do que foi planejado para ser o Congresso Paulista foi algo muito mais grandioso, afinal o Palácio Clóvis Ribeiro é uma estrutura colossal que levou duas décadas para ser concluída. O edifício que abriga a Secretaria da Fazenda e Planejamento do Governo do Estado de São Paulo possui 23 andares e 15 elevadores, numa área de 72 mil metros quadrados.
E a igreja nova?
Você deve estar se perguntando: E a nova igreja do Carmo que seria construída? Foi construída ou não?
Ela foi construída, sendo batizada de Basílica Nossa Senhora do Carmo.
Localizada no número 114 da Rua Martiniano de Carvalho, bairro da Bela Vista, o novo templo foi inaugurado na Páscoa de 1934. A Paróquia Matriz Nossa Senhora do Carmo de São Paulo foi projetada pelo arquiteto polonês Georg Przyrembel. Ele conciliou o projeto da nova igreja com o aproveitamento de materiais oriundos da demolição do antigo convento e de partes da antiga igreja do Carmo que sobreviveu, como os dois altares e os parapeitos das janelões.
Ao lado da igreja encontra-se o centro para crianças e adolescentes Nossa Senhora do Carmo e a Província Carmelitana de Santo Elias, convento que substituiu o antigo demolido em 1928. Texto de Douglas Nascimento adaptado para o blog por mim.

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