segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Praça da Alfândega, Circa 1917-1932, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil


 

Praça da Alfândega, Circa 1917-1932, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil
Porto Alegre - RS
Fotografia


Praça histórica do final do século XVIII surgiu com o núcleo inicial da cidade, sempre ligada ao lago e às atividades trazidas por ele. O antigo porto fluvial da cidade produzia uma grande movimentação no pequeno povoado, que contava, então, com uma pequena capela dedicada a São Francisco, provavelmente situada também na praça, com sua fachada voltada para as águas. Com o desenvolvimento do burgo, a capela perde o seu lugar, a sede religiosa foi deslocada para a praça situada no alto da colina, onde foi construída a matriz que lhe deu o nome.
Em 2 de julho de 1783 os vereadores determinaram que se construísse um cais de pedra junto ao rio para facilitar o desembarque de passageiros e mercadorias. Em 1804 o Governador da Província, Paulo da Gama, ordenou que se ampliasse o ancoradouro através da construção de uma ponte sobre o rio, com cais e trapiche, obra notável por suas dimensões, com 24 pilares de cantaria adentrando o leito fluvial que possibilitava o desembarque de sumacas e iates de grande porte. Já nesta época havia uma praça defronte ao trapiche, chamada de Praça da Quitanda junto ao prédio da primeira Alfândega da cidade (na Rua da Praia, esquina Rua General Câmara) onde se aglomeravam comerciantes e quitandeiros.
Neste ano foi construído um prédio próprio para a alfândega no corpo da praça, no alinhamento da atual Rua Sete de Setembro. Os comerciantes foram transferidos para a Praça do Paraíso, hoje a Praça XV, mas, por resistência dos comerciantes, a Câmara acabou permitindo, de forma transitória, a utilização do lado oeste como local de mercado, passando a se chamar Praça da Alfândega – na época, muitos logradouros públicos recebiam o nome devido às atividades nelas desempenhadas.
Na mesma época Silvestre de Souza Telles, com base em uma concessão recebida, reivindicou a posse de parte da área que fazia fundos com a Alfândega, o que comprometia os planos de expansão do logradouro por parte das autoridades. O reclamante teve sua concessão cassada, e a administração pública providenciou que o acesso ao trapiche e à Alfândega fosse desembaraçado de ambulantes e construções temporárias. Contudo, os esforços oficiais foram insuficientes para manter o local asseado e desimpedido, tornando-se um depósito de detritos.
A situação melhorou entre 1856 e 1858 quando foi erguido um muro de pedra com uma escadaria junto ao rio, no alinhamento da atual Rua Sete de Setembro. Em 1866 a Cia Hidráulica Porto-alegrense instala um chafariz de ferro bronzeado e a arborização é iniciada, com o plantio de nove árvores por empreitada, mas logo a praça foi entregue aos moradores do entorno para que a adornassem e ajardinassem, seguindo a orientação da engenharia pública. Alguns anos após foram instalados bancos e um quiosque.
Em 14 de março de 1883 seu nome foi alterado pela Câmara Municipal para Praça Senador Florêncio, em homenagem ao político e senador do Império, falecido em 1881, Florêncio Carlos de Abreu e Silva.
O contínuo desenvolvimento comercial e as determinações da República se melhorarem os portos e de se sanearem as cidades, leva Porto Alegre a enfrentar de forma decisiva essa grande tarefa. A construção do porto passa a ser uma das grandes metas da “Política dos Transportes” do governo Borges de Medeiros, que previa a interligação de todo o estado por uma malha de vias de rodagem, férreas e fluviais. A construção de um porto modelo era uma prioridade dentro deste sistema. Os técnicos e políticos da época viam a localização de Porto Alegre a situação ideal para a construção de um entreposto comercial entre o interior do estado, dotado de importante rede fluvial, e o mar, através da Lagoa dos Patos.
A Praça da Alfândega, sendo um forte ponto de referência e representando todo um passado histórico, era o local natural para localização do ponto de desembarque de passageiros. Desta maneira, a construção do cais começa ali, no eixo da qual é colocado o portão central. Seguindo o paradigma urbanístico da época, aquele do urbanismo francês, o eixo que chegava a esse portão deveria ser reforçado para valorizar a entrada e embelezar a cidade através de uma larga avenida, com duas pistas, canteiro central ornado de palmeiras e margeados por imponentes prédios – a Avenida Sepúlveda – uma intervenção intrigante, limitada à extensão de três quadras.
Em 1912 a demolição do prédio da Alfândega e o aterro de 100 metros de largura sobre o rio foram decisivos para a conformação atual da praça, levando à reformulação geral e o ajardinamento deste novo espaço urbano. O projeto paisagístico, de inspiração francesa, é geométrico e seu eixo central possui uma forte marcação, delineada pela pavimentação e pela vegetação – palmeiras-da-Califórnia. Este eixo se desenvolve até o cais, cortando a pequena Praça Barão do Rio Branco, finalizando e focando o Portão do Cais, enquadrado pelos prédios do MARGS (antiga Delegacia Fiscal) e do Memorial do RS (antigo Correios e Telégrafos), através da Avenida Sepúlveda.
A vegetação utilizada para marcação do entorno da praça foi o jacarandá e, nas laterais da Avenida Sepúlveda o ligustro, espécies muito utilizadas nesta época na arborização urbana. O novo projeto possivelmente preservou boa parte da vegetação existente, o que justificaria a presença de árvores de grande porte como pinheiros, ciprestes e eucalipto.
Em 1920 foram retiradas varias paineiras que prejudicavam as plantações vizinhas e o ajardinamento do local. Em 1923 foi instalada a estátua eqüestre do General Osório, em bronze, de autoria do escultor Leão Veloso, no centro do logradouro, com espelho d"água, chafariz e bancos. Em 1935 a estátua “A Samaritana”, colocada na Praça Montevidéo em 1925, é transferida para a Praça da Alfândega cedendo lugar à Fonte de Talavera.
Nos anos seguintes, a Praça da Alfândega já se constituía num dos logradouros mais interessantes e bem localizados da cidade, sendo procurado por toda população. A presença dos bondes, primeiro puxados por burros, seguidos pelos elétricos, era responsável pela grande circulação de transeuntes. A construção de hotéis, clubes, cinemas, restaurantes, cafés, traziam para a praça uma animação permanente não só durante o dia, mas também à noite – O Grande Hotel, o Clube do Comércio, o Cinema Guarany, o Cinema Central...
Desde 1955, sempre na segunda quinzena do mês de outubro, acontece na praça a tradicional Feira do Livro, um dos maiores eventos culturais do Rio Grande do Sul, que iniciou com 14 barracas de venda de livros, projeto idealizado pelo diretor do diário de Notícias, Say Marques e executado pelo representante da editora José Olympio, Maurício Rosemblatt. Atualmente é organizada pela Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), atraindo milhares de visitantes que buscam os novos lançamentos nacionais e internacionais ou as muitas ofertas de livros usados a baixíssimo custo, assistem aos shows de música, dança e teatro que acontecem diariamente.
O início de sua decadência pode ser datado com a derrubada do antigo prédio da Caixa Econômica Federal e a construção do novo, na década de 70. Este fato coincide com a retirada dos bondes, dos veículos, dos cinemas, dos cafés tradicionais, dos moradores e com a substituição dos serviços, do comércio sofisticado pelo popular e o surgimento do comércio ambulante no seu entorno. As meretrizes, malandros e marginais que freqüentavam a praça acabam por tomar conta dela, criando um clima de insegurança na população em geral.
Em 1979, uma lei aprovada pela Câmara Municipal unificou as Praças Senador Florêncio e Praça Barão do Rio Branco, incorporado o leito da Rua Sete de Setembro, transformando esta área em um grande calçadão (intervenção característica da década de 70), e denominou de Praça da Alfândega a área compreendida entre a Rua dos Andradas, Capitão Montanha, Siqueira Campos e Cassiano do Nascimento. Uma fração a oeste é cedida para a construção do edifício da Caixa Econômica Federal.
No final da década de 80, a recuperação do Prédio da Delegacia Fiscal, transformado em Museu de Artes do Rio Grande do Sul, a implantação do primeiro McDonald’s da cidade e a transformação do Hotel Magestic na Casa de Cultura Mário Quintana começaram a trazer para o centro da cidade uma certa vitalidade que este havia perdido.
Em 2007 foram realizadas obras de prospecção arqueológica, a fim de descobrir o local exato do antigo ancoradouro de pedra e outros remanescentes da conformação antiga da Praça.

Nenhum comentário:

Postar um comentário