terça-feira, 18 de agosto de 2020

Pesto Genovês, Itália



Pesto Genovês, Itália
Artigo



Filho de uma italiana nascida perto de Gênova, que imigrou ainda criança para os Estados Unidos, o grande cantor norte-americano Frank Sinatra (1915-1998) aprendeu a gostar de pesto com a mãe. Ela fazia divinamente esse molho frio, verde, cremoso e aromático, típico da capital da Ligúria, atualmente conhecido no mundo inteiro. Era a “confort food” de Frank Sinatra, ou seja, sua comida de valor nostálgico ou sentimental.
O pesto vai em massas como trenette (semelhante ao linguine), spaghetti mais grosso, trofie (massa curta, fina e retorcida), gnocchi de batata, lasanha e minestrone genovês. Leva folhas de manjericão, alho, pinoli (sementinhas de Pinus pinea), queijo parmesão e pecorino, azeite extravirgem, pimenta preta e sal. É originalmente pestato (pisado, esmagado, reduzido a papa) no mortaio (almofariz) de mármore ou madeira. Daí o nome. Entretanto, isso pode ser feito no liquidificador, apesar de herético, simplificando a operação.
Frank Sinatra era tão apreciador de pesto que, em 1986, depois de conhecer o molho ainda hoje magnífico do restaurante Zeffirino, da Via XX Settembre, 20, em Gênova, passou a mandar buscá-lo de avião, da Itália. Os invejosos diziam que era para impressionar os convidados nas refeições de casa, oferecidas pelo cantor aos amigos hollywoodianos. Não se importava com a extravagância. Na verdade, era paixão com DNA. “O pesto se liga à identidade lígure como o arroz aos chineses”, afirma Sergio Rossi no livro “Pesto Tradizione e Futuro” (Sagep Editori, Gênova, 2015).
A receita varia um pouco, pois cada genovês esconde um segredo ao prepará-la. Além disso, “Grande Enciclopédia Illustrata della Gastronomia” (Selezione dal Reader’s Digest, Milão, 2000), registra cinco tipos do molho lígure. São o "pesto genovese secondo la formula antica", o “di ponente”, mais simples e forte; e o “di levante”, com menos alho, além do “alla siciliana”, que possui alguns componentes da fórmula genovesa.
O nome do molho lígure foi simplificado. No passado, conforme Sergio Rossi, dizia-se em dialeto regional “sâ pèsta”, para designar o sal fino (moído), ou “pèivie pèsto”, indicando a pimenta em pó. “Com o tempo, o molho acabou identificado com a palavra pesto, sem necessidade de especificação”, acrescentou ele. Hoje, também existe uma receita oficial, regulamentada em Gênova, difícil de ser preparada em outros lugares, sobretudo no exterior, pela dificuldade de encontrar a matéria-prima recomendada.
Sergio Rossi enumera os ingredientes indicados: basilico (manjericão, em italiano) da variedade genovesa DOP (selo europeu conferido aos produtos agroalimentares cujo ciclo produtivo se desenvolve integralmente em uma área geográfica delimitada), dotado de perfume e sabor que garantem a tipicidade do molho; pinoli de Pisa, suave e equilibrado; queijo parmigiano reggiano stravecchio (bastante maturado); queijo pecorino (de ovelha) sardo; alho de Vessalico (comuna da província de Imperia, na Ligúria), não agressivo; sal marinho branco e grosso; azeite de oliva extravirgem Riviera Ligure DOP, ideal para molhos frios, pelas notas de frutos verdes, picância e amargor suaves.
Só assim o molho ganha o direito, pelo regulamento, de ser chamado de legítimo pesto genovês. Se bem que existe uma versão curiosa. É o pesto avvantaggiato, servido com pedacinhos de batatas cozidas e fagiolíni (vagens). “Acho que sua criação tem a ver com prato único e simples de guerra”, observa o restaurateur paulistano Rogério Fasano. “Até por ser um pesto mais calórico e energético”.
Como fazer um sucedâneo no Brasil? Na falta de pinoli, muitos usam nozes ou avelãs; no lugar do pecorino sardo, optam por um queijo fresco de cabra. Já o queijo parmiggiano regiano, o sal marinho branco grosso e o azeite de oliva são mais fáceis de substituir. Entretanto, impossível encontrar um manjericão com perfume e sabor iguais ao de Gênova. Aliás, é a alma do molho, embora não seja originário da Itália.
Nasceu nas regiões tropicais da Ásia e África e se espalhou há muito tempo pela bacia do Mediterrâneo. O mais reputado Ocimum basilicum (seu nome científico) é cultivado em Pra, na periferia de Gênova, sede do Parco del Basilico. O clima adequado e solo ideal, conferem-lhe aroma elegante e gosto persistente. Segundo os habitantes locais, o manjericão cultivado em outros lugares apresenta “aromas diferentes”, como, por exemplo, o de menta. A propósito: no Brasil, o manjericão também pode ser denominado basílico, basilicão, alfavaca e alfavaca-cheirosa.
Orgulhosos do seu manjericão, muitos genoveses o cultivam nas sacadas das casas, sem ligar para as maledicências. Os lígures, fundadores da cidade, já o dependuravam em vasos diante de suas residências. Era para afugentar bruxas e maus olhados. Por outro lado, as mulheres de virtudes discutíveis faziam o mesmo. Queriam ser confundidas com triviais cozinheiras.
Arremessando da janela um vaso de manjericão, Lisabetta acertou a cabeça do amante, assassino dos irmãos, em um dos contos licenciosos do “Decamerão”, do humanista renascentista Giovanni Bocaccio (1313-1375). No verão, os genoveses colhem o manjericão dezessete ou dezoito dias após a semeadura; no inverno, isso acontece um mês depois. A altura da planta vai de 20 e 40 centímetros, embora em alguns casos chegue a 60 ou 70 centímetros e apresente cerca de 30 centímetros de diâmetro.
A lenda diz que o manjericão nasceu no mesmo local da crucificação de Jesus, em Jerusalém. A imperatriz Helena, mãe do imperador romano Constantino (274-337), teria conhecido a planta ali e transportado para Roma. A italiana Catarina de Médici (1519-1589) levou-o para a França quando casou com Henrique II, futuro rei daquele país. Aparentemente, já se destinava ao preparo do pesto e teria dado origem ao pistou, molho típico da Provença, embora se debata essa possível ascendência.
São receitas aparentadas, porém diferenciadas. Ao contrário da italiana, a preparação francesa, essencial na soupe au pistou, não recomenda a incorporação de pinoli; e o queijo parmesão é facultativo. Na Idade Média, talvez por uma confusão semântica, o manjericão, que os italianos conhecem por basilico, era considerado antídoto do basilisco, lagarto fabuloso, saído do ovo de galinha quebrado por um sapo, e capaz de matar com a vista. Ao mesmo tempo, recebia indicações terapêuticas. Utilizado em infusão, combatia as tosses, indigestões e náuseas.
Inalado, minimizava problemas respiratórios e, supostamente, o cansaço mental. Massageado no corpo, seu óleo aliviava dores musculares. Recentemente, investigações realizadas no King’s College, da Universidade de Londres, fundado em 1829, do qual seis pesquisadores já receberam o Prêmio Nobel, constataram o efeito do manjericão no tratamento da asma, úlcera péptica e colite.
Receita de Pesto Genovês:
Rende 4 porções
Ingredientes:
2 xícaras (chá) de folhas frescas de manjericão
2 colheres (sopa) de pinoli (na falta use nozes ou avelãs)
1 dente de alho
1 colher (café) de sal branco grosso
1/2 xícara (chá) de pecorino ralado (na falta, use queijo fresco de cabra)
1/2 xícara (chá) de parmigiano reggiano ralado
1/2 xícara (chá) de azeite extravirgem de oliva
Preparo:
1. Em um pilão de mármore ou madeira, coloque as folhas de manjericão, os pinoli, o alho, o sal grosso e, aos poucos, vá misturando os queijos ralados.
2. Macere muito bem os ingredientes no pilão e vá derramando lentamente o azeite, macerando sempre, até o composto ficar cremoso. Se necessário, coloque mais azeite.
3. Sirva o pesto com massas, usando de preferência sobre trenette (semelhante ao linguine), trofie (massa curta, fina e retorcida), gnocchi de batata, lasanha, etc.
Texto de J. A. Dias Lopes.
Nota do blog: Para mim, o molho dos molhos, o aroma dos aromas, nenhum molho pode ser mais saboroso, belo e prazeroso de degustar.

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