Veneza - Itália
Monumento
O Leão de Veneza é
uma estátua de bronze na forma de um leão instalada no topo de uma coluna na
Piazzetta, um espaço adjacente à Praça de São Marcos em Veneza. É o mais conhecido símbolo da cidade.
O leão está de pé, tem asas e um livro sob
suas patas dianteiras. Suas origens são desconhecidas. Seu primeiro registro
está em um documento de 1293 do Grande Conselho, ordenando que fosse restaurado
ou "adaptado" (a palavra usada, aptari, tem tradução dúbia), mas a obra não é descrita. Parece
que era dourado nesta época. A coluna onde se assenta é de granito, produzida
no Egito, e segundo a tradição foi levada a Veneza em 1172, quando foi
acrescentado um capitel ornamental. Presume-se que o leão tenha sido instalado
pouco depois. O atual Leão
de Veneza é o produto de diversos restauros e modificações ao longo
dos séculos. Pelo menos quatro intervenções foram detectadas como tendo
ocorrido até o fim do século XVIII. Só permanecem originais a cabeça, o peito,
os flancos e partes das pernas.
As pesquisas para determinar sua origem e
datação foram inconclusivas, mas parece certo que não se trata de obra
veneziana medieval, e sim bem mais antiga. Foram propostos vários locais de
procedência — China, Índia, Etrúria, Assíria, Báctria ou Império Sassânida —
mas em geral se pensa que tenha uma origem similar aos Cavalos de São Marcos,
produzidos em algum lugar do mundo greco-helenístico e
saqueados de Constantinopla em 1204. O leão
pode ter sido parte do mesmo saque. O estilo do corpo trai a influência
grega, mas a cabeça é distante dos padrões naturalistas cultivados na Grécia
pós-clássica, e devem muito à influência estilizante oriental, o que não chega
a ser uma contradição, havendo nesta época grande entrecruzamento de tendências
diversificadas entre a região grega propriamente dita e áreas do Oriente Médio. Bianca Maria Scarfì, editora de uma
coleção de estudos recentes sobre a peça, alegando haver muitas evidências,
propôs que tenha sido criada em torno de 300 a.C. e instalada em um monumento
em Tarso, Cilícia, dedicado ao deus Sandon, patrono da cidade, que tradicionalmente era
representado sobre um leão alado e chifrudo. Defeitos na cabeça do Leão de Veneza foram
interpretados como o local de onde teriam saído os ditos chifres, mais tarde
supostamente removidos para adaptá-lo ao novo uso. As conclusões de Scarfì
foram apoiadas por instâncias oficiais venezianas, mas não se tornaram um
consenso e sua origem continua controversa. Outra hipótese que foi
longamente debatida era a possibilidade de que primitivamente não tivesse asas,
que teriam sido acrescentadas pelos venezianos, mas ela foi descartada a partir
da identificação de vestígios da base de asas na parte do corpo que é original.
Desde a independência de Veneza São Marcos foi eleito patrono da cidade, substituindo o
antigo, São Teodoro, que pertencia
ao período do domínio bizantino. O leão foi associado a Marcos na
tradição bíblica e aparece em uma lenda veneziana, narrando que o santo havia
naufragado ao largo da costa e teria encontrado abrigo nas praias da laguna. Um
anjo em forma de leão alado teria aparecido para confortá-lo, dizendo as
palavras Pax tibi Marce,
evangelista meus. Hic requiescet corpus tuum (A paz esteja contigo,
Marcos, meu evangelista. Aqui teu corpo repousa). A lenda sobre o santo reza
que ele foi martirizado no Egito, e a tradição veneziana foi reforçada quando
despojos de um santo que se acreditava ser São Marcos foram roubados no Egito em
828 e levados para Veneza por alguns mercadores. Em sua homenagem a
grande Basílica de São Marcos foi
erguida, e desde então santo e leão alado ficaram indissoluvelmente vinculados
a Veneza. A primeira frase do anjo tradicionalmente se repete nas
representações marcianas e foi inscrita no livro que o leão da Piazzetta tem
debaixo de suas patas. Imagens desse leão se multiplicaram nas cidades sob
o domínio veneziano desde meados do século XIII, em moedas, estandartes,
estátuas, pinturas e relevos, tornando-se o símbolo por excelência da República.
Quando Napoleão derrotou a República de Veneza em
1797, o leão foi baixado da coluna e levado a Paris junto com outros espólios
de guerra, mas sofreu sérios danos durante o transporte. Foi exposto
no Museu do Louvre e
depois de restaurado foi instalado no topo de uma fonte diante do Palácio dos Inválidos. A
peça foi reclamada pelos venezianos em 1815, mas nenhum operário francês se
dispôs a removê-la, não desejando privar a França de tão precioso tesouro.
Foram então contratados operários austríacos, e no meio do trabalho de
desmontagem o leão foi derrubado, não se sabe se por acidente ou por intenção,
e despedaçou-se. Sendo obra carregada de associações políticas, o desastre
suscitou gritos de júbilo na multidão que assistia.
Devolvido enfim a Veneza em pedaços, algumas
partes se perderam no caminho, inclusive as asas, a cauda, o livro, partes das
pernas e um fragmento do topo da cabeça. Um restauro foi encomendado ao
escultor Bartolomeo Ferrari, que o recompôs e reintegrou as partes ausentes sem
muita habilidade. A cauda foi sensivelmente modificada, sendo estendida
para trás. Antes se enrolava debaixo das pernas traseiras. As asas também
sofreram mudanças importantes em seu formato e detalhamento, e o livro foi
reconstruído em chumbo. Depois voltou ao topo da coluna. Em 1892 foi
submetido a uma restauração completa por Giacomo Boni, que fez um trabalho
primoroso.
No início da II Guerra Mundial foi removido e escondido por razões de
segurança, e antes de sua reinstalação em 1945 passou por novo restauro. Outro
iniciou em 1985, e levou anos para ser concluído. Em 1990 foi levado para ser
exposto em Amsterdã e Londres, coincidindo com a visita do presidente italiano. Na
ocasião foi organizado em Londres um seminário onde se debateu mais uma vez sua
origem e datação, sem que se chegasse a um consenso. Voltou a Veneza em
1991, sendo recolocado na coluna em meio a grandes festejos.
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