Ribeirão Preto - SP
N. 2
Fotografia - Cartão Postal
Ribeirão Preto perdeu um importante marco histórico em setembro de 1967 (a então estação ferroviária da Mogiana, onde hoje há a interligação das ruas General Osório com Martinico Prado, na Vila Tibério).
Por aquela estação passaram dezenas de milhares de imigrantes que deixaram a Europa para tentar a sorte no “Eldorado Paulista”, como a nascente cidade era chamada no período de apogeu do café.
Inaugurada em setembro de 1885, ainda na época do Império (a República foi proclamada em 1889), a estação foi, durante décadas, uma das mais importantes da Cia. Mogiana de Estradas de Ferro. A localização era estratégica – a entrada da estação ficava exatamente onde começava a rua General Osório, então a rua mais importante da cidade.
A estação funcionou para embarque e desembarque de passageiros (e cargas) até maio de 1965. Em 1º de junho daquele ano os trens de passageiros passaram a seguir para a nova estação, construída pela Mogiana nos limites entre a área urbana e a rural – na hoje avenida Mogiana, na Zona Norte.
Com a desativação o prédio da velha estação passou a abrigar o Grupo Escolar da Vila Tibério (atual Escola Estadual Hermínia Gugliano), e, ao mesmo tempo que tramitava um processo de tombamento da estação pelo seu inquestionável valor histórico, começou também uma intensa campanha pedindo a demolição do marco histórico.
Idealizada por políticos e comerciantes da região da "Baixada", onde fica o Mercado Municipal, a campanha foi abraçada pelo proprietário do Diário da Manhã, Antônio Machado Sant’Anna. Ao longo de meses, o jornal publicou dezenas de matérias referindo-se a estação como “monstrengo”, “pardieiro” e “antro de imundície e mau cheiro”. O pátio onde ficava a rotunda (oficina das locomotivas, atual Parque Ecológico Maurílio Biagi) era chamado de “triângulo da malária”. Naquele momento a Cia. Mogiana já não existia mais – prestes a falir, foi encampada pelo governo estadual (por meio da Ferrovia Paulista S/A, a Fepasa) em 1952.
Apesar de a campanha utilizar a questão do saneamento para justificar a demolição da estação, na verdade o interesse era comercial – os moradores da populosa Vila Tibério tinham grande dificuldade para chegar ao Centro, pois existia apenas uma ineficiente passagem de nível que permitia atravessar os trilhos da Mogiana (ficava no início da rua Duque de Caxias, no ponto em que o nome da via muda para rua Luiz da Cunha).
Era comum os automóveis terem de aguardar a abertura da “porteira” da Mogiana, que era fechada quando da passagem dos trens. A real intenção dos comerciantes que fomentaram a campanha, era facilitar o acesso dos moradores da Vila Tibério a seus estabelecimentos comerciais.
Numa época em que a preservação de nosso patrimônio histórico não era uma preocupação da comunidade (hoje ainda não é, apenas "fingem" que é), a campanha foi vitoriosa. Em 12 de agosto de 1967, um sábado, o então governador Abreu Sodré veio a Ribeirão Preto assinar um acordo com a Prefeitura. O então prefeito Welson Gasparini agradeceu ao governador, após Abreu Sodré ser fotografado com uma picareta, simbolizando o início da demolição.
O acordo previa a realização, pela Prefeitura, de um plano urbanístico que mudaria profundamente aquele trecho da região central e, pela Fepasa, a construção de uma estação rodoviária (a atual, inaugurada apenas em 1976). Assinado o acordo entre o prefeito Welson Gasparini e o governador Abreu Sodré, em setembro, começou a demolição, exatamente pelo prédio da estação, do qual restou apenas a plataforma. Em seguida, foram derrubados os antigos armazéns que serviam para depósito de cargas.
Em janeiro de 1968 aconteceu a transferência das instalações que ainda funcionavam na rotunda – a oficina das locomotivas a vapor foi para as estações de Uberaba e Franca; a oficina de vagões foi para Campinas e a das locomotivas diesel-elétrica para a nova estação de Ribeirão Preto, na avenida Mogiana. No mesmo mês de janeiro foi "erradicada" a plataforma, permitindo o objetivo maior da campanha – a união entre as ruas General Osório e Martinico Prado. Marco do passado áureo de Ribeirão Preto, então “Capital Mundial do Café”, a primeira e mais famosa estação ferroviária da cidade desapareceu por motivos comerciais e logísticos. Foi mais um, talvez o maior, na lista de crimes praticados contra o patrimônio histórico da cidade...
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